Por felipe.martins

Rio - A notícia não tinha muitas novidades: “Saiu da unidade coronariana e foi para o quarto”. Pensei no que dizer, mas saiu quase sem querer: “Espero que ela fique logo pronta pra outra”. Consternada, dei um gole na bebida, pensando no que disse. Que expressão boa é essa: “pronta pra outra”. Pronta pra outra significa recuperada, zerada, curada, cicatrizada.

É muito bom sentir-se pronto para o próximo passo. Saber que, mesmo que algo muito ruim nos surpreenda, sobreviveremos. Levantar dos escombros. Sair com vida. Comemorar ter se dado muito bem, mesmo depois do terremoto. Não encarar o estrago feito, enxergar só que está ali de pé, batendo a poeira que ficou no corpo, tirando o cabelo do rosto e, de preferência, tendo uma água por perto pra jogar na cara.

Fico pensando no que me devastaria a ponto de nunca ficar pronta pra outra. Tenho um palpite, mas não gosto nem de pensar. Já sobrevivi a tantas e me apeguei ao fato de ser forte. O que vem primeiro: a nossa força ou a nossa crença nela? Talvez uma alimente a outra e nos faça seguir adiante sem muito peso.

Um amigo postou que a mãe se foi, na mesma semana. Li o que escreveram, escrevi também. Sofre-se com a dor do outro com toda a verdade. Sentimos muito. Sempre dizemos “que ela esteja melhor agora, vá em paz”... Mesmo os ateus se traem e acabam dizendo isso: “Fique bem! Ela vai estar bem!”. Mesmo a gente não podendo provar que e se acontece algo depois. Podemos acreditar, mas não provar aqui e agora. A pessoa querida não passou por essa. Infelizmente, não ficou “pronta pra outra”. Simplesmente partiu, a vida nos deu e nos tirou. Dessa história, cabe à personagem que ficou se curar da tragédia e se recompor.

Quase nunca é fácil. Mas depois a leveza acaba se manifestando nas pequenas coisas que nos dão prazer, nas nossas esperanças, nas outras pessoas que amamos e nas lembranças das boas histórias que vivemos. Uma luz de sol contra os olhos, o sorriso de uma criança, atração forte por alguém, amor. O lado bom da vida sempre dá um jeito de se fazer presente e quando a gente percebe — que bom!— cá estamos novinhos em folha.

Vem, tempo.

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