Por felipe.martins

Rio - Se ela, a Rede Globo, tem 50, e eu 53, dá pra imaginar o quão íntimos somos, porque fomos criança juntos. E vendemos sonhos, fazemos cenas e acreditamos no amor eterno. Na minha rua escura, talvez 1966 ou 7, a luz mágica vinha da casa do vizinho, que emanava brilho da sala onde eles se reuniam. Casas de pobre, uma ao lado da outra, com janelas e portas abrindo para as calçadas, fazendo com que a vida pública invadisse a privada.

Quem colocou as tiras de celofane azul, rosa, amarela, sobre a tela em preto, branco e cinza? Não consigo lembrar, mas ficou uma desgraça horrorosa, porque recortava em tiras os atores. Eu não gostava e criticava: o rosto está duma cor, e a mão de outra, não tem unidade. Pode? Até que meu pai chegou um dia com nossa caixa de madeira enorme. Eu adorava o chuvisco, eram vermes embaixo da terra lutando para sair; e também amava os comerciais, curtos e com pessoas produzidíssimas. O que era a loura de platinum plus, a lâmina de barbear? Ela aparecia por trás do homem de toalha enrolada se barbeando e dizia: “Experimente minha suavidade e deixe-me se for capaz”. As senhoras da liga católica pela moral e bons costumes sussuravam: sirigaita. A Ponte dos Suspiros suspirava por quem, pra quê? Jamais entendi. A Deusa vencida da outra emissora? Mas quem venceu esta mulher pelo amor da Santa? O Homem que deve morrer era também uma incógnita, pessoas não devem morrer, devem brilhar.

Mas nada era tão bacana quanto o ‘Sítio do Picapau Amarelo, porque nele trabalhava o tesão do Julio Cesar fazendo o Pedrinho, ao lado da divina Rosana Garcia. Mas imbatíveis eram Dirce Migliaccio, Zilka Salaberry e Andre Valli. A Cuca era simplesmente podre, eu odiava aquela jacaroa de voz fina. E Rosemary no ‘Globo de Ouro’ era tudo. Hipnotizante, avassaladora num vestido longo embalada a vácuo de tão atochada, como conseguia cantar? “Quero, quero ser tua, tua de qualquer jeito, mesmo sem ter direito”. Aí entrava Jane e Herondy e todos cortavam os pulsos. Aliás, o negão pegava a loura, era? Gente, que moderno. Renato Aragão imitando Ney Matogrosso, domingo à tarde. Ney de bunda de fora. Era a glória ponto com ponto br. Ney defende a tese de que hoje é muito careta, que não há mais espaço para isso. Depois eu cresci e entrei nos estúdios, possibilidade mais que remota para o Júnior papa chibé da floresta. Mas não é exatamente disto que trata a TV? O sonho é possível e as oportunidades vão chegando em colobar, cada um que escolha o seu.

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