Por felipe.martins

Rio - Circula nos meios universitários, já há alguns anos, a crença de que o ensino do Português em nível básico deve restringir-se a duas competências: ler e escrever. Em tese, o que se espera de um bom estudante de Língua Portuguesa é exatamente isto: domínio da leitura, de tal sorte que tenha acesso às fontes de informação escrita, e boa produção textual, no sentido de conseguir expressar suas ideias com clareza e eficiência.

Esta tese, entretanto, não convence os que atribuem à disciplina o objetivo de também conferir ao educando um saber científico sobre a língua, ou seja, seu funcionamento, seus mecanismos de articulação frasal, seu sistema de sons, sua variação no corpo da sociedade. Esse é, com efeito, um dos propósitos da aula de Português, uma dose a mais que se oferece ao aluno em sua formação humanística.

Mas, admitindo-se que o principal objetivo seja o ensino da leitura e da redação, cabe uma observação a mais. Vige, já há algum tempo, uma verdade fabricada e profundamente prejudicial à formação linguística dos jovens educandos: a de que a leitura deve prosperar apenas em textos atuais de registro coloquial, em detrimentos dos textos formais e antigos. Cuida-se de uma visão reducionista do papel do professor, que só expõe a seus alunos uma face dos usos linguísticos, a dos textos de vocabulário comum, construções usuais e organização frasal simplificada. Convém advertir que um bom curso de Português é o que confere ao educando todas as modalidades de uso da língua que ainda não lhe são familiares. Somente assim poder-se-á assegurar-lhe um ensino democrático, no sentido de que não lhe sejam sonegadas quaisquer vertentes dos registros linguísticos.

A seleção de textos, portanto, no ensino básico, não pode passar pela censura pessoal do professor, seja a que rejeita o liberalismo exagerado da propaganda e das páginas da internet, seja a que renega o formalismo dos textos científicos e das obras clássicas. Não há democracia mais deliciosa do que a do livre acesso às fontes do saber.

Ricardo Cavaliere é professor do Liceu Liter. Português e da UFF

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