Por bferreira

Rio - Estou na Itália. Serão quatro shows em dez dias e, claro, alguns vinhos pra dar corpo à primavera dessa época. Na primeira vez que visitei esse país, isso em 1987, o recepcionista do hotel, preenchendo a ficha, adiantou: “Nada mudou nos últimos 500 anos”.

Hoje, entre cumprimentos de bem­vindo, o alívio da mesma observação: “Pode ir na sua adega preferida. Está no mesmo lugar!”. Pois é.

Quando eu soube que o Restaurante 28, na Rua Barão de São Feliz, fechou, quase abotoei o paletó. Eu havia prometido a amigos paulistas um cabrito com coradas, assado na panela, molhos com tomates e pimentão, carro-chefe de um cardápio lusitano aos pés da Gamboa, e o lugar cerra as portas? Mal recuperado com a extinção do Penafiel, na Senhor dos Passos, recebo essa notícia com ares de óbito familiar.

Trato alguns bares como pessoas:

— Soube do Carlitos? Do Centro?

— Sim?

— Morreu... Tangará, seu vizinho famoso, também bateu as botas.

Às vezes, o que se extirpa são os órgãos feito vesícula. “Vim de longe só pra me fartar da cabidela!”. “É, mas o cozinheiro é outro e blá, blá, blá...”

Em alguns casos, o milagre da ressurreição. A informação da reabertura do Bar Lagoa alegrou até aqueles que só conhecem o chope de vista, correndo na margem em frente. A Casa Cavé também se ergue pós-Bilac com seus pães de ló adoçando uma esquina da Uruguaiana.

Conheço casos de mortos­vivos. O sujeito acorda com delírios de Chicô Gouvêa, acerta duas marretadas na parede e dá início à nova reforma no estabelecimento. Se o jornal fosse meu, escreveria assim, entre parênteses, (vide pág. ao lado), e diagramava uma foto atual do Bar A Paulistinha. Não restou pedra sobre pedra. Como diriam os antigos diante do balcão lotado: “Sacanagem”.

Volto a Pavia, uma comuna italiana. Aqui chamamos de município, onde alguns políticos de “comunas” não têm nada. A adega está lá me esperando. A igreja no caminho é de 1300. Acredito que a rua, feita à base de pedras do Rio Ticino, seja irmã em idade da casa de Deus. O “bouquet” do vinho se mantém.
Volto ao carpaccio que pedi em Ipanema. Sem jeito, cara de espanto, aponto:

— Estranho...

— Mudou o fornecedor. Agora é um chinês, assim e coisa e tal...

E-mail: moaluz@ig.com.br

Você pode gostar