Por bferreira

Rio - Moro na Glória, sempre morei na cidade. Perto de mim, o Largo do Machado, do bloco que não ‘larga o copo’, da Adega Portugália comandada por Seu Raimundo, e das vans que fazem o trajeto único pro Corcovado. Vez por outra, entre jilós e polvos, os dois à vinagrete, observo a fila que ali se forma em busca da oitava maravilha do mundo. Pode ser uma quarta-feira solta numa semana sem feriado, há sempre turistas aguardando assento no comboio pro monumento. O Rio é uma cidade pra ser visitada, assim como Roma e Paris, mas ela é diferente, e não é por falta de Neros, muito menos, Napoleões e seus Bonapartes.

Há ruas no velho continente, vias normais, de cotidiano, cavadas nas cruzadas, e hoje cedidas ao urbano turístico que preferm um bar a paisagens da natureza. Andam sedentos, delirando sobre espetos de picanha e pastéis do Belmonte. Não reparam nas araras, no beiço dos caiapós, tampouco na Serra do Mendanha. Voam atrás das empadas de caranguejo, dos bolinhos da Kátia, no Aconchego, do galeto do Sat’s, na Barata Ribeiro. Puxando a brasa pra minha sardinha comprada no Mercado São Pedro, formigam no Samba do Trabalhador.

É uma luta pessoal. Todo bar é uma atração cultural, um bem tombado, de bebuns e importância cívica. Compro o jornal da manhã pra saber das novidades. A Vigilância Sanitária fez a limpa nas bandas do Catete, multou bares no mercadinho de Laranjeiras, fez um estrago na Gago Coutinho. Nada contra, mas existem leis inventadas para ser descumpridas. Às vezes percebo uma tristeza transpirando no salão da birosca: “Acabei de ser autuado por conta das mesas na calçada! Ainda levaram o mobiliário”.

Lembrei de uma via (podiam ser oitenta) nos arredores de Bastille, Cidade Luz, onde os bares, nas duas calçadas, estendem seus tradicionais toldos em cores vibrantes, sobre a fachada, e, da sombra, enormes távoras redondas, cadeiras de palhinha ou lona, feito um diretor de cinema. O ‘tour’ que circula por ali, já pintado por gênios como Renoir e Toulouse-Lautrec, é incentivado até pelo poder público. Imagino deva isentar de impostos os chefes que estendem seus pratos a olhos vistos.

Outro dia, Luiza, dona do ‘Da Gema’, na Tijuca, jururu tal qual uma andorinha sem verão, me conta: “Um calor danado, bar vazio, sentei com o sócio na calçada, uma cerveja, dois copos e a brisa da Barão de Mesquita, veio um fiscal e... Passou o talão. Multa!”

Sinceramente, menos, rapaziada. Menos.

E-mail: moaluz@ig.com.br

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