Por bferreira
Rio - Sem esperar saber onde vai dar a estrada, vivemos onde cada louco amola sua faca, seja ela qual for, concreta ou abstrata, em nome do que acredita. Os terroristas do Estado Islâmico agem em nome de um Deus que lhes promete mil virgens e um paraíso, depois de dilacerados. É uma espécie de fé cega, e salve-se quem puder. Será que se não tivesse esse premio eles fariam o que fazem? Muita gente buscando a virgindade tola. Estes são óbvios, porque violentos, expõem de forma direta seu poderio.
Mas queria falar do outro lado da moeda: este pai que com o filhinho no colo diz “vocês mataram o amor da minha vida, a mãe do meu filho, mas eu e minha criança somos mais fortes que mil exércitos”. Estamos defronte da loucura sã, a dor dilacerante que das vísceras arranca a paz, para saber que este tipo de fé cega não nos representa. E ele diz que não vai viver amedrontado com seu semelhante, que confia no humanismo.
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Pois é, da terra destruída, a semente onde nada brotaria. Qual a tua fé cega, para a qual você a vida inteira tem passado sua faca no esmeril? Por ela lutamos, e não à toa, a justiça também é cega: para que cor de pele, religião, deus, sexualidade, idade, nada disto interfira em nosso amor maior, esta generosidade, esta piedade que sentimos pelo mundo sofredor.
Isto posto, estive sábado na neblina de Teresópolis, no evento de arte e poesia PoêTerê. Depois de tantos malfeitos dos prefeitos, a cultura, a educação, a saúde, estão dizimadas, sem um tostão nos próximos anos. Nadica de dinheiro, nem para os salários dos servidores. Isto os paralisa? Abracei a interina da pasta cultural, e apiedado, nos olhos dela disse: Deus te proteja!
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O evento bombado é mantido com o caixa de um Baronato. Adorei isto tudo, e um velho de 94 anos, no meio da exposição dos quadros de arte naif do grande Rocha Maia, veio no meu ouvido e confidenciou: “éramos seis da Maçonaria quando fundamos em 1954 este centro cultural. Acreditamos nestes centros para a elevação do espírito”. Só ouço. Se ele, aos 94, continua amolando sua faca, participando do encontro com muitas, mas muitas bandas de rock/garagem, cheias de meninos, quem sou eu para desistir?
Com Lucélia Santos, Tonico Pereira, a divina cantora local Veronica, formávamos um bando de fé cega, conversando com a plateia lotada. Num evento que vive da bondade dos estranhos (só no sentido dos “de fora”), que socorrem e mantêm de pé o balaco interessantíssimo, a cultura sobrevive, calcinada. Vinho e lasanha de cordeiro na beleza do Viva Itália! para pegar leve, e fingir que nem tudo está perdido. Deixem seu amor crescer e ser muito tranquilo, irmãos de fé, facas amoladas.
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