Por thiago.antunes
Rio - A vitória eleitoral de Macri, novo presidente da Argentina, é mais um passo da América Latina rumo ao neoconservadorismo. O processo de desmonte das políticas neoliberais, tão em voga nas décadas de 1980 e 1990, teve início com a eleição de Chávez na Venezuela, em 1998.
Em seguida, foram eleitos vários presidentes progressistas: Lula no Brasil, Lugo no Paraguai, Zelaya em Honduras, Funes em El Salvador, Bachelet no Chile, Morales na Bolívia e Mujica no Uruguai. Cuba e Nicarágua foram pioneiras no processo.
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No conjunto da América Latina, as condições sociais melhoraram significativamente, com a redução da miséria absoluta. Em dois países a direita enveredou pelo atalho do golpismo e interrompeu a possibilidade de reformas pela via democrática: Honduras (2009) e Paraguai (2012). Nos demais, a direita tem sido beneficiada por erros dos governos progressistas.
Com exceção de Cuba e da Bolívia, todos eles acreditaram poder segurar o violino com a esquerda e tocar com a direita... O que se vê é um concerto desafinado.
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Ainda que políticas sociais tenham sido implementadas com êxito e livrado milhões de pessoas da miséria, as reformas estruturais, quando feitas (infelizmente não é o caso do Brasil), não foram suficientes para criar um modelo alternativo ao neodesenvolvimentismo consumista.
A economia permaneceu com todas as suas características neocoloniais, de exportação de produtos primários, agora denominados commodities. Não se criou um mercado interno sustentável, nem se reduziu a desigualdade social, ainda que tenha havido aumento do poder aquisitivo dos pobres.
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O erro principal, porém, foi não complementar a inclusão econômica com a inclusão política. Os benefícios aos mais pobres vieram como iniciativa do Estado e não como conquista do povo. Não se conscientizou o oprimido. A Argentina pode ser a primeira peça do dominó a tombar. Brasil e Venezuela se destacam no alvo dos neoliberais.
Em um mundo que, ameaçado pelo terrorismo, troca a liberdade pela segurança, e cujo poder financeiro (especulação) se sobrepõe ao industrial (produção), os governos progressistas se omitiram quanto à única via capaz de garantir-lhes sustentabilidade: formação e organização política de suas bases eleitorais.
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Muitos partidos se deixaram contaminar pela corrupção e não cuidaram da “alfabetização política”. Eis que o sonho ameaça virar pesadelo. A menos que a esquerda perca a vergonha de ser de esquerda.
Frei Betto é autor do romance policial ‘Hotel Brasil’ (Rocco)