Por bferreira
Rio - A bela garota nos pergunta onde vemos beleza, porque ela a vê em muitas coisas. Fazer questão de olhar o mundo por esta ótica, de lentes esperançosas e garimpadoras das pequenas pepitas do belo, na grande terra devastada. Num universo atroz e cruel, o pipocar do “eu vejo beleza”. Sou desta enfermaria, do “a vida é bela!”: no maior perrengue, é nesta hora que não capitularei, que dançarei meu particular carimbó de flores e fitas coloridas. Porque esta pergunta-afirmação, rápido me joga na selva de minha infância, e foi lá que instintivamente vi beleza no tufão de vento que fazia nossos rostos mais bonitos, beijados pela delicada carícia invisível. Fechava os olhos e partia para a terra onde nascem os sonhos.
E a aparição do galo da campina, de um coral tão intenso quanto o sol, a se equilibrar nos galhos, pequeno pássaro emplumado, emoldurado pelos mais variados tons de verde que a hileia amazônica podia criar. Sempre quis ser o galo no silêncio da mata. Sem plateia, lindo, posando para lentes imaginárias. Para mim, o coral é a cor do “eu vejo beleza”. Cegueira, intensidade que calcina, turbilhão de raios a incendiar o marasmo. Mas esta cor me trás para o agora, para o tupiniquim tsunami dos ricos irresponsáveis que doam milhões para que os políticos e fiscalizadores considerem natural o mais artificial dos desastres. Nós víamos beleza no que ficou por baixo da lama, eles viam os campos de enriquecimento da tal “elite” que eles se dizem. Com certeza elite do “eu não vejo beleza, a não ser no dinheiro no meu bolso”. E outros que arregaçam as mangas e se lançam a planejar os próximos 50 anos de revitalização do Rio Doce. Pior seria não começar agora, porque o fundo do poço chegou, e ele era alaranjado e traiçoeiro. Eu vejo beleza nos bilhões que a elite tóxica tem que ser obrigada a pagar. Melhor uso que deixa-los gastar, como estão acostumados. Eu acho belo cobrar-lhes dez vezes mais, porque nem isso suficiente será para a geração que lá não poderá nadar.
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E você, vê beleza? Onde? Só na Bundchen, ou escapou da cilada do mercado, da sociedade das imagens que te impõe o padrão e te crucifica para dele não escapar? A que casou com o gordo, a que cuidou anos do entrevado, a que lê para ouvidos sofridos, o carteiro mangueirense que pede para não lincharem o pobre coitado, o filho ator que grava a conversa dos que querem encalacrar mais ainda seu encalacrado pai, os que tentam desentortar a emblemática arvore de natal de um torto período natalino, quando a ética muito machucada, tenta um fiapo de respiração. Olha para a colcha de retalhos e pinça tuas comoventes belezas. Usa-as de exemplo numa conversa, eu verei beleza no teu ato: ao enumerar nossas jóias, relembramos a eles que há muita força escondida onde menos se espera..
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