Rio - A descrença com a CPI dos Ônibus, que nesta quinta-feira realizou a sua segunda audiência pública e, pela primeira vez, só com vereadores ligados ao Governo, refletiu nas galerias da Câmara Municipal. Se na primeira reunião, 180 pessoas acompanharam os trabalhos dentro do plenário, ontem, nenhuma das 15 pessoas que apareceram na Casa ficou até o final. Logo no primeiro depoimento, do procurador-geral do município, Fernando Dionísio, um manifestante atirou moedas em direção às mesas dos vereadores e foi expulso por seguranças. Em represália, o restante dos ativistas abandonou o local.
O grupo decorou a galeria com cartazes com os dizeres ‘Esta CPI é uma farsa’ e ‘Político, Barata custa caro!’, e pendurou baratas de papel nas grades, em alusão ao empresário do setor Jacob Barata. O baixo número de manifestantes foi ironizado pelo presidente da comissão, Chiquinho Brazão (PMDB). “Minguados manifestantes, se contenham para ouvir os depoimentos”. Em resposta, os ativistas gritaram e vaiaram.
LICITAÇÃO
Em uma hora de oitiva, o procurador-geral do município deu uma informação contrária aos demais depoentes: Lélis Teixeira, presidente da Rio Ônibus e Maximiliano Neto, representante do consórcio Santa Cruz. Dionísio disse que na licitação dos consórcios em 2010, as empresas participaram individualmente, enquanto os empresários afirmaram já terem entrado na concorrência como consórcios:
“Quando as empresas participam do processo licitatório, ainda não há consórcio formado. A licitação permite que as empresas participem sem a formação deles e sim com uma declaração de que se sagradas vencedoras, irão formar o consórcio”, explicou.
Em documento entregue pela RioÔnibus, a proposta comercial do consórcio Santa Cruz já aparece assinada pelo líder do grupo, Orlando Pedroso, da empresa Expresso Pégaso. Nos depoimentos, a justificativa da participação em conjunto na concorrência foi por conta da demanda do edital. “Entre as exigências para participar da licitação, precisava ter de 1.800 a 2.600 carros e individualmente não há como participar”, entregou Maximiliano.
TCM não é convocado
Além da participação apenas de vereadores que não assinaram o requerimento para criar a CPI, outro motivo de falta de credibilidade da comissão foi a não inclusão do dono do maior número de linhas de ônibus, Jacob Barata e de membros do Tribunal de Contas do Município na lista dos depoentes. O TCM foi responsável por apresentar relatórios com supostas irregularidades nos contratos dos quatro consórcios.
Conforme o DIA revelou, o conselheiro Antonio Carlos de Moraes questionou, em 2012, contrato da prefeitura, que repassou R$ 50 milhões para a RioÔnibus, com recursos da Educação, para compensar a gratuidade dos alunos. Em outro parecer, o TCM criticou a Secretaria de Transportes que fez a revisão tarifária, apontando o fato de terem sido incorporados no cálculo custos com frotas novas, já previstos na concessão.
Defesa para Jacob Barata
O presidente da RioÔnibus aproveitou a audiência da CPI para defender o empresário Jacob Barata. “Ele (Jacob) é uma figura tradicional que está sendo hostilizada. Sua participação não controla o sistema”, justificou Lélis Teixeira.
Um gráfico apresentado por Lélis à CPI apontou Barata como o maior empresário individual e familiar nos consórcios. Sua frota é de 4,60%, enquanto o segundo, a de Álvaro Lopes é de 4,27%. Em participação familiar, Jacob salta para um índice de 11,28%, na frente também de Lopes, com 9,53%. “Quem tem índice de 4 ou 11 não manipula nada”, completou.
Investigações paralelas à CPI ganham gás
Outras duas frentes de investigações sobre formações de cartéis e má qualidade na prestação de serviços dos ônibus em andamento podem ganhar a motivação da população. O vereador Eliomar Coelho (Psol), autor do pedido de criação da comissão e que renunciou o cargo de membro depois que ela foi composta pelo bloco do governo, vai apresentar na semana que vem na Câmara um pedido de diligência na Secretaria Municipal de Transportes.
Se a presidência da Câmara aprovar, Eliomar poderá requisitar documentos ao órgão, que deverá disponibilizá-los ao vereador. Entre as demandas, estão o acesso ao inteiro teor dos estudos e diagnósticos técnicos que embasaram a elaboração do edital de licitação e a relação de multas emitidas por infrações cometidas por todos os consórcios e empresas, desde 2011. O resultado desta e outras investigações sobre o transporte rodoviário que o gabinete de Eliomar tem feito serão apresentadas em um relatório paralelo ao da CPI.
A comissão especial do TCM que apura o serviço também está em processo de colheita de dados como números e placas de ônibus. Apesar de a comissão ter prazo para conclusão dos trabalhos para o dia 26, o procurador José Ricardo de Castro adiantou que ele deve ser prorrogado por mais 30 dias “porque o que começou como uma pequena semente tem virado uma grande árvore.”
Perguntas repetidas e respostas já esperadas
Nas três horas e meia de audiência ontem, era quase impossível ouvir réplicas entre os vereadores e depoentes. A enxurrada de perguntas, elaboradas na maior parte pelo relator Professor Uóston (PMDB), eram respondidas sob a desatenção do restante dos membros. Entre um questionamento e outro, sobre a possível formação de cartel entre as empresas — o tema central da audiência — o presidente da RioÔnibus, Lélis Teixeira, respondeu a pelo menos três perguntas iguais formuladas por vereadores diferentes.
“Ficou claro que não há caixa preta. Os documentos comprovam isso”, declarou Lélis, após entregar uma pilha de documentos à CPI, que promete ser lida por oito assessores da comissão nas próximas semanas.
Ao final da audiência, um vídeo com mais de dez perguntas de cidadãos foi exibido para comentários do presidente da RioÔnibus. Os questionamentos tratavam da demora dos coletivos no ponto e da lotação deles. Na justificativa, Lélis culpou o trânsito caótico da cidade e garantiu melhorias após a implantação de mais corredores BRS e BRT.