Rio - A idolatria desmedida é alvo de estudo e crítica por parte de psicólogos e profissionais de Educação. Para eles, atos radicais de adolescentes, em nome de ídolos, refletem a busca de um referencial de conduta fora da família e podem ser indício de carência afetiva.
”A admiração por um artista é algo normal na idade. Os atos extremos, no entanto, revelam a necessidade de chamar atenção e o reflexo da ideologia passada pelo ídolo. A exposição a riscos, muitas vezes, se dá como uma fuga à carência de afeto familiar. É como se o jovem clamasse por proteção dos pais e do estado”, acredita a psicóloga especializada em terapia de família, Valésia Vilela.
Para a pedagoga da Uerj, Eloisa Ribeiro, a única forma de evitar que a idolatria se transforme em fanatismo desmedido é o diálogo. “Os pais têm que passar limites aos filhos, noções de hierarquia e manter a fiscalização. O adolescente, muitas vezes, age inconsequentemente. Cabe ao pai frear excessos”, garante.
Opinião partilhada pela psicóloga, que completa: “O jovem é como uma pipa: não quiser que voe, não se pode dar linha. A melhor maneira de controlá-lo é o diálogo aliado à imputação de regras. O adolescente deve ter horários e atividades controladas com bom-senso”, avalia.
Show de Bieber é só em novembro, mas fila já começou
O tempo fechou para os cerca de 150 fãs do cantor Justin Bieber, que se revezam em acampamento perto do Sambódromo desde o dia 16 por lugares no gargarejo do show do astro no dia 3 de novembro. Ontem, agentes da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social inspecionaram o local e conferiram as condições de segurança e higiene às quais os adolescentes (muitos menores de idade e sem o acompanhamento de responsáveis) estão expostos. Relatório dos riscos encontrados e cadastro com os nomes dos cerca de 30 jovens daquele turno foram encaminhados ao Conselho Tutelar, que pode decidir pela remoção imediata do acampamento.
“Realizaremos reunião com a Vara da Infância e Juventude amanhã (hoje) e estudaremos cada caso. Levantaremos a frequência escolar e os hábitos alimentares dos jovens, nesse período. Os responsáveis legais que não estiverem acompanhando seus filhos podem ser acionados para que os retirem. Se o acampamento for considerado nocivo e se não houver obediência ao pedido, o desinstalaremos”, garantiu o conselheiro tutelar, Renato Lopes.
Pela manhã, guardas municipais e agentes da Secretaria de Ordem Pública já haviam pedido aos fãs que desmontassem durante o dia as 17 barracas que ocupavam a calçada da Av. Salvador de Sá e dificultavam o tráfego. Elas poderiam ser remontadas à noite. Segundo a Seop, o acampamento fere o código de condutas, que não permite estadia com barracas em vias públicas.
A fiscalização e iminência de remoção desesperaram os jovens, que apesar dos contratempos, se dispunham a continuar por lá — em muitos casos, à revelia dos pais. “Já fomos assaltados por usuários de drogas e enfrentamos chuvas, mas queremos ficar”, disse Ana Beatriz Silva, 14, entre lágrimas. Em nota, a Polícia Militar ressaltou a importância de as vítimas registrem as ocorrências para que sejam tomadas providências.
Número 1 da fila, o estudante Norton Braga garante que, independente da ordem judicial, os maiores de idade resistirão: “Podem nos impedir de ficar em barracas, mas não de continuar aqui, sentados em cadeiras e guardando lugar para os menores ocuparem no dia da apresentação”.
Banho em bares e marmitas doadas
O esquema de vigília no acampamento segue rígida rotina de revezamento. Cinco grupos de 30 jovens se alternam em turnos de seis horas e prestam solidariedade uns aos outros.
”Quem chega de casa traz comida para quem pernoitou aqui. Recebemos doações de moradores da região e até de PMs que fazem a ronda noturna”, contou Luan Freitas, 16. Para higiene pessoal, são usados banheiros de pensões e bares da região. “Pagamos R$ 5 para tomar banho e contamos com a generosidade dos donos dos botequins para usarmos banheiros”, completou ele, que está faltando na semana de provas na escola para ficar lá.
Os esforços, segundo os jovens, serão compensados assim que o ídolo pop pisar no palco. “Terei que me controlar para não desmaiar. Grande parte da minha vida é dedicada a ele. Fui operada há menos de um mês e me endividei para estar aqui”, contou a jovem Thayná Lima, 18, única fã acompanhada por responsável, no turno da manhã. Para a mãe dela, Maria Melo, a devoção é um alívio, se comparada a outros vícios que ela poderia ter. “Ela não se droga e não se envolve com pessoas ruins. Por que impedir que ela demonstre o amor que sente pelo Justin?’, questionou.