Rio - O corpo de Kayo da Silva Costa, de 8 anos, está sendo velado na capela de Moça Bonita, próximo ao Campo de Bangu, Zona Oeste, na manhã desta sexta-feira. O menino foi morto, na noite desta quinta-feira, ao ser baleado na cabeça durante troca de tiros entre policiais e bandidos em frente ao Fórum de Bangu. Ele estava indo para a escolinha de futsal quando foi alvejado e morreu na hora. O sepultamento da criança será realizado no cemitério de Murundu, em Realengo, às 11h desta sexta.
O treinador de Kayo, Luiz Manuel, afirmou que a vítima "era um menino alegre e aplicado aos treinos". Ele acrescentou que o garoto sonhava ser jogador profissional do Vasco. Ainda de acordo com o treinador da categoria sub 9, da qual a criança fazia parte, todos os integrantes do grupo estavam treinando quando receberam a notícia do falecimento do amigo. As crianças ficaram inconsoláveis.
Durante o velório, a tia de Kayo, que trabalha como balconista próximo onde ocorreu o tiroteio, criticou a falta de bom senso da Secretaria de Segurança. "Com tempo de tanta tecnologia e vídeoconferências, para quê levar um criminoso para o fórum?", questionou muito abalada.
Os familiares do menino conhecido como Kayo Cabeludinho chegaram no fim da noite de quinta-feira no Instituto Médico Legal, na Leopoldina, ainda em estado de choque. O avô da criança, Joamir Faria do Rosário, de 42 anos, foi o único que conseguiu falar com os jornalistas.
"Foi uma tragédia. A ficha ainda não caiu para ninguém. O sonho dele era jogar no Vasco e ganhar uma chuteira nova de Natal. A gente ia comprar a chuteira dele amanhã, de surpresa, para o jogo dele no fim de semana", contou Joamir.
Amigos postaram homenagens ao beque parado. Um deles foi o treinador Sérgio Kazú Bangu, que mostrou foto do menino com tarja de luto no Facebook. A postagem recebeu mais de 600 comentários e foi compartilhada por mais de mil internautas em pouco mais de uma hora.
Invasão frustrada
Por volta das 17h30 um grupo, com cerca de 10 bandidos armados com fuzis, chegou em dois carros e invadiu o fórum procurando pela carceragem. PMs reagiram e houve intenso tiroteio. Durante a fuga, os criminosos continuaram atirando. Nos fundos do prédio, Maria José da Silveira Rodrigues, de 54 anos, estava em um ônibus da linha 738 (Bangu-Marechal Hermes), quando foi baleada na barriga. Na ação, o sargento Oliveira, que trabalhava na segurança do fórum, foi baleado ao entrar no prédio para alertar outros PMs sobre a tentativa de invasão e acabou não resistindo. O corpo dele será sepultado às 16h desta sexta-feira, no Cemitério Jardim da Saudade, em Sulacap, na Zona Oeste.
O grupo pretendia resgatar Alexandre Bandeira de Melo, o Piolho, e Vanderlan Ramos da Silva, o Chocolate, apontados, respectivamente, como chefes do tráfico do Morro do Dezoito, em Água Santa, e da Favela Gogó da Ema, em Belford Roxo. Eles estavam sendo julgados no Fórum de Bangu. Segundo a PM, nenhum dos 23 réus que estavam no local foi resgatado. Os comparsas fugiram.
Bangu em estado de choque
No fórum, servidores se trancaram dentro dos cartórios junto com o público. “Eram muitos tiros. Todo mundo ficou em pânico. Quando a situação acalmou, havia marcas nas paredes e sangue nos corredores”, contou um funcionário do tribunal, que teve o carro roubado. O dono de um estacionamento foi feito refém pelo bando e liberado na Avenida Brasil. “Só pensava na família”.
A camareira Maria José da Silveira Rodrigues, atingida na barriga quando estava no ônibus, tem sete filhos e não corre risco de vida. “Ela só tinha um mês de carteira assinada”, disse Rosângela Fernandes, sobrinha da vítima. Até à noite desta quinta-feira, nenhum dos criminosos havia sido localizado pela PM, que reforçou o policiamento na região e na Favela Vila Vintém por tempo indeterminado.
Imagens nítidas
A Divisão de Homicídios vai identificar os criminosos captados nas câmeras do fórum. “As imagens são boas. Deu para identificar nitidamente o rosto de cada um”, disse o delegado Alan Duarte. Nesta sexta-feira moradores farão homenagem ao atleta do Bangu, depositando flores brancas no local onde o menino morreu. Em seguida farão passeata. “Queremos proteção do Estado, porque temos um fórum que recebe criminosos todo dia”, cobrou o morador Carlos Oliveira.
Secretário pede transferência de Piolho e Chocolate para presídios federais
O secretário estadual de Segurança, José Mariano Beltrame, solicitou, logo após a tragédia, a transferência para presídios federais de Alexandre de Melo, o Piolho, e Vanderlan Ramos da Silva, o Chocolate, alvos da tentativa de resgate. Chefe do tráfico nos morros do Dezoito e Saçu, em Água Santa. Piolho tem 40 anos e foi preso em abril, em Jacarepaguá. Contra ele havia seis mandados de prisão por homicídio, tráfico, associação para o tráfico, roubo e formação de quadrilha.
Segundo a polícia, ele possui perfil violento e teria enterrado várias vítimas no alto do Saçu. Piolho cumpria pena no Instituto Penal Ismael Pereira Sirieiro, em Niterói, onde ganhou benefício para trabalhar fora e não voltou mais, em 2010. Acabou recapturado em abril passado.
Por sua vez, Chocolate, de 30 anos, estaria à frente de quadrilha de traficantes com atuação no Gogó da Ema, Jardim Bom Pastor e Guachá, todas em Belford Roxo. Segundo a polícia, Chocolate esteve por trás da guerra do tráfico no Morro do Jorge Turco, em Rocha Miranda, durante o ano passado.
Ações se repetem na saída de fóruns
Nos últimos cinco meses, pelo menos outras duas ações de bandidos para libertar comparsas levaram pânico às ruas de Niterói. Em junho, um grupo de marginais armados de fuzis trocou tiros com agentes da Secretaria de Administração Penitenciária (Seap), na Alameda São Boaventura, quando o ônibus do órgão com 20 detentos passava pela via.
Os presos estavam sendo transportados do Fórum de São Gonçalo, na Região Metropolitana, para o Complexo Penitenciário de Bangu. Agentes rechaçaram a tentativa de resgate e o grupo fugiu em seguida. Em maio, o agente penitenciário Antonio Pereira foi morto a tiro após ser baleado nas costas durante uma tentativa de resgate de presos, na Rodovia Niterói-Manilha, na altura de São Gonçalo.
Colaborou: Leandro Resende
Edição: Bianca Lobianco