Por adriano.araujo
Santiago e a filha Vanessa no dia do casamento%3A ‘Sei que ele está bem. Eu sou a continuação da vida dele’Álbum de família

Rio - A jornalista Vanessa Andrade, filha do cinegrafista Santiago Idílio Andrade, que teve morte cerebral nesta segunda-feira após ser atingido na última quinta-feira por um rojão lançado por um manifestante, falou pela primeira vez à imprensa sobre a morte do pai.

Em entrevista ao programa Encontro com Fátima Bernardes, Vanessa disse que ainda é muito difícil aceitar a perda de Santiago, tão jovem como ela. "A gente nem sabe ao certo onde começa a doer, pois todos os lugares dói. É assim que me sinto agora. Parece que ainda não caiu a ficha"

Sobre o seu trabalho como jornalista, apesar da perda, ela falou que a tragédia não irá abate-la na profissão e que vai continuar o trabalho de seu pai.

"Quando o vi pela primeira vez após a cirurgia, com o corpo muito inchado, a cabeça muito inchada, eu disse a ele: 'você veio para ser inesquecível e eu vou continuar esse trabalho'. (...) eu vou continuar, não me abala, não. As pessoas precisam saber que a imprensa está aí, vai lutar, continuar mostrando. Infelizmente aconteceu com meu pai, mas sou a continuação dele. Vou levar o nome dele para que todo mundo tenha orgulho dele assim como eu", disse.

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O martírio em serviço de um trabalhador

?Um homem dedicado à família, amigo leal e profissional que amava o ofício que exercia há 20 anos. Em todas as conversas e depoimentos de parentes e amigos de Santiago Andrade, essas são as definições mais comuns sobre o cinegrafista, que lutou, até o último instante, pela vida e para fazer o seu trabalho.

“Fazia tudo com muito carinho, tanto que, mesmo caindo, ele foi segurando a câmera”, lembrou Arlita Andrade, viúva do cinegrafista, à Rede Globo. Ela disse que ele já fazia planos para a aposentadoria, em breve. Santiago, muito querido no meio jornalístico, era casado há 30 anos e criou uma filha e três enteados.

Repórter Alexandre Tortoriello%2C sobre Santiago%3A ‘Grande companheiro’ Alessandro Costa / Agência O Dia

Desde a notícia da explosão, a família se uniu a amigos numa corrente de fé e solidariedade. Pelas redes sociais, a filha, Vanessa Andrade, mobilizou centenas de pessoas para fazerem orações e doações de sangue. Os pedidos foram prontamente atendidos. Na porta do hospital, colegas se revezavam em buscas de notícias e torcendo pela recuperação.

Quando soube que o inevitável aconteceria, Vanessa buscou o colo do pai — de quem seguiu os passos e também se tornou jornalista — para uma despedida emocionada, no domingo. “Éramos só nós dois, pai e filha, na despedida mais linda que eu poderia ter”, escreveu Vanessa numa carta emocionante (leia na íntegra ao fim da matéria).

Santiago tinha 20 anos na profissão e dois prêmios de Jornalismo por coberturas de mobilidade urbana Reprodução Internet

Pouco antes de perder o companheiro de uma vida inteira, Arlita encontrou forças para fazer um apelo: “O que falta é amor pelo ser humano. Peço que essas pessoas não sejam violentas, que não façam isso. Isso não vai levar a nada. Eles destruíram uma família que era muito unida.”

O tempo de carreira deu a Santiago a serenidade e o profissionalismo necessários para enfrentar os desafios, que foram muitos. Enchentes, manifestações, operações policiais, Carnaval, apenas para citar alguns exemplos do trabalho incansável do repórter cinematográfico.

Sempre sorridente, brincalhão e disposto a ajudar os outros, Santiago fez uma legião de amigos, tão leais quanto as lágrimas de emoção que eles derramaram ao se despedir do cinegrafista ontem. “Uma das pessoas mais fáceis de se gostar, grande companheiro nas dificuldades. O mais cuidadoso cinegrafista que conheci acabou sendo pego dessa forma. Agora que não terei mais sua amizade, que ao lado de Deus olhe para a gente aqui embaixo”, disse o repórter Alexandre Tortoriello, premiado junto com Santiago.

“Não vai ser fácil esquecer os momentos de otimismo dele, quando eu me deixava abater pelas dificuldades. Esse era o velho ‘Santi’. Preocupado com todos e sempre humilde. É o segundo amigo que perco nessa guerra urbana não declarada. Basta. Não quero mais derramar lágrimas por causa da estupidez humana”, afirmou o repórter da TV Justiça Adeilton ‘Che’ Oliveira.

“Estava com dores na coluna, mas dizia: ‘Deus me livre ficar na cama, prefiro trabalhar’”, lembrou o cinegrafista Sérgio Colonese. A família doou os órgãos, atendendo a um pedido do cinegrafista. Ele será cremado no Rio, após o velório, hoje. Ontem, uma missa na Igreja Santa Cecília, em Botafogo, homenageou Santiago.

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