Rio - Depois de sete anos e três meses de mandato, o governador Sérgio Cabral (PMDB), 51 anos, passa hoje o bastão ao vice-governador Luiz Fernando Pezão, que assume amanhã o governo, de olho nas eleições de outubro. Primeiro governador reeleito do Rio, que obteve em 2010 a maior votação histórica do estado (5,2 milhões de votos no 1º turno), Cabral se despede dos fluminenses em meio a protestos e com a mais baixa popularidade desde o início da gestão. Segundo pesquisa Ibope, só 18% aprovam seu governo. Em 2010, teve 66% dos votos válidos.
Na avaliação de especialistas ouvidos pelo DIA, o governo Cabral foi marcado por avanços nas áreas de saúde, segurança, economia e mobilidade urbana, e sobretudo pela instalação das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), pela escolha do Rio como cidade-sede das Olimpíadas de 2016 e pela retomada do Complexo do Alemão. No entanto, a boa gestão nos dois mandatos foi manchada pela tortura e morte do pedreiro Amarildo de Souza e por questões pessoais, como viagens frequentes ao exterior, uso de helicópteros para transportar cão da família e ausência em grandes tragédias, como a de Angra dos Reis, em janeiro de 2010.
“Foi positivo. O sucesso da política de segurança permitiu o retorno de grandes empresas para o Rio, fazendo com que o estado voltasse a ser importante centro de negócios do país”, ressaltou o economista Gilberto Braga, lembrando que o interior foi beneficiado com a chegada de grandes montadoras de automóveis.
Felipe Borba, professor e pesquisador do Iesp/Uerj, avalia que, nas políticas públicas, Cabral se saiu bem. “Houve recuperação econômica, novos investimentos federais no Rio e diminuição da violência. Isso é uma marca dele, que vai tentar recuperar na campanha de Pezão”, aposta. Os pesquisadores avaliam que a aliança com os governos federal e municipal foi um dos pontos fortes. “As empresas puderam se beneficiar de incentivos fiscais nas três esferas de governo”, acrescenta Braga.
Na opinião do especialista em mobilidade urbana da UFF Aurélio Lamare Murta, um dos destaques foi a implantação do Bilhete Único. “A iniciativa foi aproveitada de forma positiva, porém, a passagem continua cara, por conta de impostos cobrados pelo próprio estado”, opinou. Para Murta, um dos desafios que fica para as próximas gestões está nos trilhos da SuperVia e do Metrô.
Já o professor e cientista político da PUC-Rio Antonio Carlos Alkmin dos Reis acredita que a avaliação ruim da gestão Cabral atualmente é motivada por um descontentamento geral com os serviços públicos. Ele acredita, porém, que o espaço de avaliação do governo está aberto. “Não é dado que essa marca negativa vai ficar até o final.”
Protestos: Momentos de alta tensão
Enfrentar as ruas, seja por manifestações de servidores ou de passeatas pela melhoria no transporte público, foi um dos desafios de Sérgio Cabral nos anos de 2011 e 2013. E declarações polêmicas, como chamar de “vândalos” bombeiros que reivindicavando melhores condições de trabalho queimaram quartel; médicos saltosos, de “safados”, e professores estaduais de “vagabundos” marcaram o período Cabral no Palácio Guanabara.
Em meio aos ânimos alterados, Cabral ainda teria perdido oportunidade de agradar às ruas na área de mobilidade urbana, para a qual o governo federal liberou recursos de R$ 50 bilhões, após eclodirem as manifestações populares, em junho. “Tínhamos que ter mais projetos para pleitear a verba, mas não tínhamos, apenas a Linha 3 do metrô, que ligará Niterói a São Gonçalo” , ressaltou o professor de Engenharia de Transportes José Eugênio Leal, da Pontifícia Universidade Católica (PUC-Rio).
Pezão: sem medo de botar o pé na lama
O apelido de infância veio do tamanho dos pés — ele calça 47,5 — e acabou incorporado ao nome político. “Eu era goleiro e as pessoas falavam que eu agarrava com o pé. Diziam que era só eu abrir os pés que já fechava o gol”, contava aos amigos o vice Luiz Fernando Pezão (PMDB), 59 anos, que assume amanhã o cargo de governador.
Pezão tem a seu favor o fato de ser operacional e executivo. Nas viagens do governador ao exterior, ele esteve à frente do governo, como em janeiro de 2011, quando cobriu os pés de lama, ao lado da presidenta Dilma Rousseff, para vistoriar a Região Serrana, destruída pelas enchentes e deslizamentos de terra.
Nascido em Piraí, no Sul Fluminense, Pezão é formado em Economia e Administração de Empresas.
Ocupa cargos políticos há 33 anos, tendo sido eleito duas vezes prefeito da cidade, que se projetou internacionalmente com o projeto Piraí Digital, criado por ele. Nos mandatos de Cabral, Pezão acumulou o cargo de vice-governador com o de secretário de Obras, à frente das principais intervenções do governo do estado na área, como o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) nos Complexos do Alemão, Manguinhos, Pavão-Pavãozinho/Cantagalo e Rocinha.
A aposta na infraestrutura
Segundo o presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio de Janeiro, Sydney Menezes, um ponto positivo do mandato de Cabral é o investimento em infraestrutura, como a expansão do metrô.
Porém, ele critica o atraso nos cronograma de obras, citando o Arco Rodoviário, uma rede rodoviária que está sendo construída no entorno da Região Metropolitana. “A gente reconhece o mérito, a decisão política, de priorizar grandes obras de infraestrutura. Porém, a maioria dos prazos iniciais foram descumpridos e elas estão atrasadíssimas. Além disso, grandes reformas, como a do Maracanã, tiveram custos aumentados”, disse.
Arquiteto de um dos maiores escritórios especializados na área e professor da Puc-Rio, Rodrigo Mattos criticou o projeto de extensão da rede metroviária. “Está sendo construído um sistema em linha reta. Se houver problema em alguma estação, a rede inteira para”, afirmou. Além disso, o pesquisador da PUC acredita que falta estrutura de apoio para as unidades de moradia popular construídas na gestão de Cabral. “A habitação é importante, mas também tem que se pensar nas áreas educacionais que vêm associadas ao programa”, disse.