Rio - O coordenador da Comissão Nacional da Verdade, Pedro Dallari, solicitou ao ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, nesta sexta-feira, que a Polícia Federal acompanhe as investigações da Polícia Civil do Rio de Janeiro sobre o assassinato do ex-agente do Centro de Informações do Exército, Paulo Malhães, ocorrido nessa quinta-feira à noite na zona rural de Nova Iguaçu.
Em entrevista exclusiva ao DIA publicada no dia 20 de março, Paulo Malhães assumiu que foi um dos comandantes da missão que sumiu com a ossada de Paiva em 1973. O DIA reafirma o contéudo da reportagem. O coronel afirmou que seus cinco filhos e oito netos sofreram “sanções” depois que suas declarações foram publicadas.
Depoimento à Comissão Nacional da Verdade
O coronel da reserva Paulo Malhães prestou depoimento à CNV em 25 de março. No testemunho, deu sua versão sobre operação do Exército para desaparecer com os restos mortais do deputado federal Rubens Paiva. Informou também que agentes do CIE mutilavam corpos de vítimas da repressão assassinadas na Casa da Morte, em Petrópolis, arrancando suas arcadas dentárias e as pontas dos dedos para impedir a identificação, caso fossem encontrados.
Para a CNV, o crime e sua eventual relação com as revelações feitas por Malhães à Comissão Nacional da Verdade, à Comissão Estadual da Verdade do Rio e à imprensa, deve ser investigada com rigor e celeridade.
"Por se tratar de uma situação que envolve investigação conduzida pela CNV, que é órgão federal, pedi que a Policia Federal fosse acionada para acompanhar as investigações conduzidas pela Polícia Civil do Rio", afirmou Dallari.
Coronel ficou em poder dos assassinos por nove horas
O coronel foi encontrado morto na manhã desta sexta-feira em sua casa, em um sítio do bairro Marapicu, no interior de Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense. De acordo com a Delegacia de Homicídios da região, três homens invadiram a residência de Malhães na tarde dessa quinta-feira. Ele ficou em poder dos bandidos por nove horas. As investigações apontam que o coronel foi abordado às 13h e ficou refém até as 22h. Cristina Batista Malhães, viúva do coronel, também foi rendida e trancada em um quarto. O caseiro também ficou trancado em outro cômodo.
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A mulher e o caseiro do militar da reserva foram chamados para prestar depoimento. De acordo com a DH, a vítima não tinha marcas de tiros no corpo. Segundo agentes que realizaram a perícia no local, Malhães morreu por asfixia. Um rifle e uma garrucha antiga foram apreendidas pelos policiais e impressões digitais foram colhidas para análise.
Crueldade nos porões
O DIA divulgou no dia 26 de março deste ano que o ex-coronel Paulo Malhães relatou à Comissão da Verdade técnicas para ocultar cadáveres de presos políticos em prisões clandestinas como a Casa da Morte, em Petrópolis. Em depoimento, o militar da reserva de 76 anos admitiu que torturou e matou militantes nas prisões clandestinas da repressão.
“Quando o senhor vai se desfazer de um corpo, quais são as partes que podem determinar quem é a pessoa? Arcada dentária, digitais e só”, respondeu ele aos questionamentos de José Carlos Dias, membro da CNV. “Quebrava os dentes. As mãos, não (eram cortadas). Cortavam-se os dedos. E aí se desfazia do corpo… Eu não era tão especialista assim, existia gente mais especialista do que eu”, disse.
Os guerrilheiros assassinados eram aqueles que, após serem presos, não concordavam em trabalhar para o Exército como agentes infiltrados em suas organizações de esquerda. Malhães também explicou que as mutilações nos corpos eram feitas em quartinhos das prisões clandestinas. Questionado diversas vezes sobre quantos presos políticos matou, o coronel disse não lembrar. “É impossível determinar quantos”, afirmou.
O militar também admitiu que não tem nenhum arrependimento dos crimes que cometeu. “Eu acho que eu cumpri o meu dever”, declarou. Questionado sobre seu envolvimento no desaparecimento da ossada de Rubens Paiva, ele disse que recebeu a missão do Centro de Informações do Exército, mas não conseguiu cumpri-la pois foi acionado para outra ação. Em outro momento do depoimento, disse que os restos mortais de Rubens Paiva eram “uma massa morta, enterrada e desenterrada”. “Não tinha mais nada. Nem sei se aquela massa era realmente dele.”
Reportagem de Leandro Resende