Por bianca.lobianco

Rio -Trancado na viatura Renault Logan 54-6069, do Batalhão de Vias Expressas (BPVE), um funcionário de uma empresa de roupas íntimas teve um fuzil apontado para a sua cabeça pelo soldado Orlando da Silva, no dia 13 de junho do ano passado. Para pressioná-lo ainda mais a entregar a propina de R$ 6 mil, ele colocou o cano da arma dentro da boca da vítima. Silva faz parte de um grupo de seis policiais especializados em atacar veículos de confecções de lingerie da Região Serrana do Rio, conhecido como ‘Gangue da Calcinha’, como publicou com exclusividade ontem a coluna ‘Justiça e Cidadania’. Impressiona a violência do bando.

Os PMs agiam na Avenida Brasil e na Rodovia Washington Luís, e interceptaram 13 funcionários de 12 empresas que seguiam da Região Serrana para São Paulo. Com medo de novos ataques, as vítimas criaram uma rota alternativa, com 100 quilômetros a mais. Passaram a seguir para Volta Redonda e até Barra Mansa, para ter acesso à Rodovia Presidente Dutra rumo à capital paulista. Os PMs usavam as viaturas do batalhão — onde as vítimas eram algemadas — como cativeiros móveis para forçar os donos de empresa a pagarem resgates de até R$ 9 mil. Também agrediam os alvos e roubavam o que estava à vista, como dinheiro das carteiras e sacolas com roupas íntimas.

Cativeiro móvel%3A clique para ver o infográfico completoArte O Dia

R$ 100 e sacolas de roupas

“Eles atuavam como ladrões comuns. Tanto na forma de agir, como no tratamento com as pessoas”, afirmou o promotor Paulo Roberto Mello Cunha Júnior, do Ministério Público (MP). A juíza Ana Paula Figueiredo, da Auditoria de Justiça Militar, aceitou a denúncia do MP contra o grupo por roubo, extorsão, extorsão mediante sequestro e concussão (exigir vantagem indevida em função do cargo).

As penas variam de dois a 15 anos de prisão. A magistrada decretou a prisão preventiva do soldado Orlando da Silva, e dos sargentos Fábio Xavier André, André Luís Alves Pascoal, Elson do Rêgo Brito e Denilson Francisco de Paula, investigados pela 7ª Delegacia de Polícia Judiciária Militar (DPJM). Eles foram presos sexta-feira e levados para a Unidade Prisional, o antigo BEP.

Em 3 setembro, Silva e Denilson já haviam sido presos. Eles foram acusados também de exigir R$ 100 e sacolas de roupas. Ficaram seis meses presos e agora voltaram para a cadeia. Denunciado por concussão, o subtenente Vágner dos Santos Carneiro responderá em liberdade. Mas foi afastado. Todos serão interrogados em audiência dia 8, a partir das 12h30.

Grande parte dos ataques era feita no Trevo das MargaridasCarlos Eduardo Cardoso / Agência O Dia

Na denúncia do MP, vítimas dão detalhes dos ataques dos PMs

Para roubar R$ 300 e seis sacolas de calcinhas e sutiãs, o sargento Andre Luís Alves Pascoal foi agressivo. Chutou a vítima, garantiu que estava próximo a uma favela e foi taxativo: “Você vai ser o que eu quiser, um bandido, um traficante ou até morrer de bala perdida”, contou uma das vítimas em depoimento. O bando é tratado na denúncia do Ministério Público enviada à Justiça também como ‘os piratas do asfalto’.

O grupo costumava ainda levar as pessoas emboscadas para saques em caixas eletrônicos e para próximo de uma base do BPVE, embaixo da Linha Vermelha, próximo à Rodovia Washington Luís. Outra estratégia era ameaçar as vítimas de levà-las à delegacia, além de tirar fotos dos carros e anotar os números de documentos para futuras represálias em caso de denúncia.

Em outra ação, Pascoal um dos mais violentos do bando, em maio do ano passado, abordou casal, que estava com filho 12 anos. De olho nas mercadorias e alegando irregularidades, ele recolheu R$ 9 mil. Alegou que se fosse preso iria até o inferno atrás de uma das vítimas e ameaçou matá-la para ela nunca mais ver o filho.

Na casa de um dos policiais havia 117 peças de lingerie

Na semana passada, policiais da 7ª Delegacia de Polícia Judiciária Militar (DPJM) fizeram buscas, por ordem judicial, em armários de PMs do BPVE, além de endereços dos acusados. Na casa do sargento André Luís Alves Pascoal, em Bangu, na Zona Oeste, eles encontraram 117 calcinhas, sutiãs e cuecas.

Muitas das vítimas do bando eram abordadas na Avenida Brasil, altura do Trevo das Margaridas. Após algemá-las na viatura, eles costumavam dar voltas próximo a comunidades, como o Parque União, que fica no Complexo da Maré, e Cidade Alta, ambas na Zona Norte.

No dia 2 de fevereiro do ano passado, por exemplo, Pascoal e o sargento Fábio Xavier André obrigaram uma vítima a entregar R$ 5 mil, proveniente das vendas de roupas íntimas em São Paulo, e mais R$ 400 que estavam na carteira dela, sob a ameaça de ser deixada em uma favela. “Se você conseguir sair vivo de lá será bom, mas se não conseguir o problema é seu”, afirmou um dos policiais.

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