Por adriano.araujo

Rio - Nascido e criado nos morros, o funk tem uma história de altos e baixos. Ganhou voz em meados da década de 1990, mas em seguida foi marginalizado por ter, em alguns locais, sua imagem associada aos ‘proibidões’, letras que exaltavam termos pornográficos e o tráfico de drogas. Ficou oprimido por um tempo, mas nunca esquecido. Há alguns anos, retomou seu fôlego graças a artistas e produtores que se dedicam a resgatar o melhor do mais carioca dos ritmos. Agora, com status de movimento cultural e apoio financeiro da Secretaria Estadual de Cultura, o funk começa uma nova etapa de sua história, com bailes legais e financiados como projetos do estado em áreas com UPPs.

Mês passado, uma equipe julgadora participou da última etapa de seleção de projetos inscritos no edital, lançado pela secretaria em dezembro, para escolher programas que receberiam apoio para serem realizados. Entre os presentes, havia representante do Comando de Polícia Pacificadora (CPP), que deve levar aos comandantes de UPPs a mensagem sobre os trabalhos vencedores e estabelecer com eles um canal para viabilizar a realização dos eventos.

Funk livre%3A Ação é uma nova etapa na história do gênero musical polêmicoem comunidadesArte O Dia

Paulo Bahia, sociólogo e cientista político da UFRJ, acredita que, além de valorizar a cultura, o investimento no movimento funk pode dissociar os eventos da criminalidade. “Ficando dentro da legalidade, o funk se distancia de vez da imagem e do contato com o tráfico. Ter patrocínio, editais ou financiamentos, faz com que se valorize a identidade cultural da população. O funk já é uma cultura estabelecida em todas as localidades e classes sociais”, analisa.

Entre as mais de 100 inscrições, havia shows, gravações de CDs e promoções de artistas, e até lançamento de revistas e teatro sobre a história do movimento. Só foram aceitas inscrições de pessoas, grupos ou associações que tivessem atuação comprovada no funk há pelo menos dois anos.

A comissão escolheu 19 projetos de bailes em comunidades ocupadas por forças de segurança, além de outros 17 trabalhos, divididos nas seguintes categorias: produção musical, circulação artística, audiovisual, memória e comunicação. Um dos objetivos da secretaria para a seleção dos trabalhos era que ele ajudasse no reconhecimento do funk como movimento cultural.

Rocinha, Borel, Alemão

Os idealizadores de bailes receberão R$ 20 mil cada para tocar o projeto. As demais categorias, R$ 15 mil, totalizando quase R$ 650 mil em apoio financeiro. A verba deve ser liberada no final de julho, e os produtores têm que seguir à risca os prazos apresentados na inscrição, além de prestar contas. Todos devem seguir protocolos de autorização e legalização.

Alguns dos trabalhos vencedores preveem bailes em locais fora da capital, como Caxias, e a comunidade da Chatuba, em Mesquita. Na Região Metropolitana, moradores da Rocinha, Borel, Cidade de Deus e Complexo do Alemão também podem esperar pelos bailes financiados.

Mr. Catra faz bailes em três morros

Grande incentivador do movimento, Mr. Catra tem equipe que foi uma das vencedoras da concorrência. O projeto Baile do Negão pretende levar o som para três comunidades: Morro dos Prazeres, em Santa Teresa; Fogueteiro, no Catumbi; e Morro do Gambá, no Complexo do Lins. O evento terá preços populares e participação de moradores. “Estou muito feliz com a aprovação dos bailes em comunidades. Além de levar música para as pessoas, vai dar emprego para muitos pais. Minha equipe já tem até data para cantar”, comemora. Outra que está empolgada é a MC Marcelly, do funk Bigode Grosso. Para ela, que conquistou crianças e adultos de todas as idades, o ritmo unifica culturas e classes. “O funk ganhou muito com isso. Ele veio da comunidade e era um absurdo não poder ter bailes lá.

"Além de levar música para as pessoas%2C vai dar emprego para muitos pais. Estou muito feliz"%2C diz Mr. Catra%2C que teve projeto aprovadoJoão Laet / Agência O Dia

Fuzis no salão e pedradas

?Diversão para muitos, os bailes também foram palco de muita confusão quando traficantes insistiam em estender sua truculência e domínio na única opção de lazer nas comunidades.

Em dezembro, O DIA mostrou que o concorrido baile do Parque União, no Complexo da Maré, por exemplo, era ponto de exibição de fuzis pelo bando do chefão do tráfico Jorge Luiz Moura Barbosa, o Alvarenga.

Em janeiro, no recém-pacificado Complexo do Lins, duas viaturas da UPP foram atacadas a pedradas depois que policiais tentaram acabar com um baile clandestino.

Cenas de violência nos bailes mancharam a história do funk no RioPaulo Araújo / Agência O Dia / 8.6.1994


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