Por thiago.antunes

Rio - A recuperação de um jovem infrator tem preço. E no estado está orçada em cerca de 10 salários mínimos por mês. A quantia, muito acima da renda da maioria das famílias brasileiras, é o custo para os cofres públicos de cada adolescente internado em unidades do Departamento Geral de Ações Socioeducativas (Degase). O valor chama menos atenção pelo número do que pela sua aplicação, pois a instituição não consegue detalhar a planilha de custo do uso da verba.

Em números exatos, são R$ 7.580 que o governo diz investir em cada menino ou menina sob sua tutela por decisão judicial. Por ano, a conta individual chega a R$ 90.960, quase três vezes e meia o gasto com um preso do Complexo Penitenciário de Bangu: R$ 26.856 por ano ou R$ 2.238 mensais.

Apesar do dinheiro investido, a reincidência ainda é um indício de que o serviço deixa a desejar. Há cinco anos, 48% dos jovens que já estiveram no Degase voltaram pelo menos uma vez para cumprir medida socioeducativa. Com o tempo este este número reduziu, mas ainda é significativo. Em 2013, 27% dos apreendidos voltaram a cometer crimes e acabaram internados novamente. Para o desembargador Siro Darlan, este índice não reflete a realidade.

Apreendido após furtar um celular%2C adolescente de 14 anos teria sido agredido. Internado%2C chegou a ficar em coma. Família teme sequelasJosé Pedro Monteiro / Agência O Dia

“Tem que colocar neste dado aqueles que completam 18 anos e vão para o sistema penitenciário”, argumentou o magistrado. Para parentes que têm jovens no Degase, o dinheiro usado na recuperação poderia ser até maior se os resultados fossem de excelência e os casos de violência cessados. Somente este ano, foram abertas 29 sindicâncias para apurar episódios de agressão contra internos e agentes, motins, fugas e danos ao patrimônio nas oito unidades de internação e nas 17 de semiliberdade.

Uma das investigações envolve um estudante de 14 anos que foi apreendido no Degase depois de ser acusado de roubar um celular. No mês passado, ele foi levado em estado grave para o Hospital Municipal Evandro Freire, na Ilha do Governador. O jovem, que estava internado no Centro de Socioeducação Dom Bosco — antigo Instituto Padre Severino —, se recupera em casa, após ficar em coma.

A família está assustada e teme que o garoto fique com sequelas. “Desde que saiu do hospital, meu irmão está aéreo, não esboça reação. Ninguém sabe o que aconteceu lá, nem ele, porque não se lembra de nada. Como uma pessoa pode entrar normal e sair dessa forma? Se investem tanto neste meninos como não conseguem dizer o que fizeram com ele?”, reclama a auxiliar administrativo Ana Paula Vieira, 24 anos.

Nas unidades%2C jovens têm atividades esportivasJosé Pedro Monteiro / Agência O Dia

Defasagem escolar é alta

Mais de 80% dos jovens apreendidos estão com defasagem entre idade e série escolar. A montagem de uma estrutura nas unidades para o aperfeiçoamento profissional dos meninos pode explicar, em parte, os altos gastos do governo com os jovens.

Para Ricardo Teixeira, professor dos MBAs da Fundação Getúlio Vargas (FGV), é evidente que o valor investido nos adolescentes em conflito com a lei chama a atenção porque daria perfeitamente para que pais oferecessem aos seus filhos uma condição de vida muito acima da realidade brasileira, com escolas bilíngues, professores de idiomas particulares e viagens ao exterior.

Reincidência ainda é altaJosé Pedro Monteiro / Agência O Dia

Mas, na ponta do lápis, no entanto, alerta Teixeira, o orçamento do estado inclui gastos com a administração que são diluídos em uma estrutura de segurança patrimonial e pessoal e de agentes voltada para um público muito menor, por exemplo, que o do sistema carcerário, que é de 35.911 presos. “Com certeza absoluta, quem dispuser de R$ 7.580 por mês para o filho vai conseguir oferecer a ele uma boa educação e de condições de vida. Quem tem este valor como faixa de renda familiar já é considerado classe média no Brasil”, afirma o professor.

Mentalidade de carcereiro

Para o desembargador Siro Darlan um dos entraves na ressocialização é o fato de muitos agentes ainda terem “a mentalidade de carcereiro, não de educador”. Segundo ele, a medida socioeducativa só teria eficácia se houvesse uma participação efetiva da família, já que ela é a chave para entender o comportamento dos menores infratores. “Se R$ 7 mil, R$ 12 mil ou R$ 100 mil recuperassem, estava valendo o investimento. Mas o que se vê é que o modelo que está em funcionamento não recupera”.

Atualmente, há 1.550 jovens sob responsabilidade do Degase. À frente de um grupo de mães que têm filhos no sistema, Mônica Suzano, 41 anos, disse que a situação nas unidades melhorou, mas ainda há o que se fazer: “Meu filho entrou aos 15 anos no Padre Severino e morreu aos 20, na rua, de joelho, e com um tiro no peito dado por um policial. Digo que a grande escola do crime dele foi lá no Degase”.

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