Rio - A cada 45 minutos, 22 pessoas desaparecem no Brasil. É como se, no segundo tempo de uma partida de futebol, nem o seu time e nem o adversário voltassem do vestiário. Com esse alerta, o portal ‘Meu Filho Sumiu’ joga luz sobre um dos mais graves problemas sociais enfrentados pelo Brasil e lembrado no mundo todo neste domingo, Dia Internacional da Criança Desaparecida. A cada ano, 250 mil pessoas somem misteriosamente sem deixar vestígios. Destas, o Ministério da Justiça estima que 40 mil sejam menores de idade — sete mil somente no município do Rio.
Para que esses milhares de rostinhos nunca caiam no esquecimento, a data será celebrada pela primeira vez em uma favela carioca. Mães e parentes de vítimas vão participar de um culto evangélico, às 10h, na quadra do Morro do Chapéu Mangueira, no Leme. O evento é uma iniciativa do site www.meufilhosumiu.com, ferramenta de busca de desaparecidos, utilizada por 4 milhões de usuários. Para utilizá-la, basta acessar o site e cadastrar a vítima. A informação é repassada para o Ministério Público, delegacias, e divulgada nas redes sociais.
Junto com o site, o advogado Arnaldo Gesuele criou um aplicativo que dispara um alarme a cada denúncia de uma nova vítima. “As primeiras 24 horas são fundamentais para localizar a criança. Depois disso, a cada hora que passa, ela pode estar a caminho do exterior”, explica.
Uma das fotos compartilhadas é a de Gisela Andrade de Jesus. Ela sumiu, em 2010, aos 9 anos, quando voltava da escola, na favela Nova Holanda, e parou em posto de gasolina para beber água. Foi a última vez que foi vista. Sem notícias da filha, a auxiliar de serviços Lenivanda Andrade, 36 anos, vive à base de remédios. “Ela tem bronquite. Então quando o tempo esfria, fico desesperada imaginando onde ela está. Se está sendo bem cuidada, se está se alimentando. É a minha única filha”, desabafa a mãe.
Para muitos pais, uma nova esperança surge com a inauguração da delegacia especializada em pessoas desaparecidas no Rio. A unidade será instalada na Cidade da Polícia, no Jacarezinho, e vai atender casos de desaparecimento na capital. A inaugurada será após a formatura dos novos inspetores, em junho.
SOS Crianças localizou 85% dos desaparecidos
Há 18 anos o programa SOS Crianças Desaparecidas, da Fundação para a Infância e a Adolêscência (FIA), vinculada à Secretaria estadual de Assistência Social, já conseguiu localizar 2.790 crianças _85% dos casos. O jovem D., 15 anos, é um deles. No ano passado, ele abandonou os estudos e foi morar numa favela, onde ganhava R$ 1 mil por semana vendendo drogas. A família registrou a ocorrência, espalhou cartazes do SOS e peregrinou atrás do adolescente. “Descobri que ele estava numa boca de fumo. Fui até os traficantes e implorei para que o deixassem ir embora. Expliquei que ele tinha pai e mãe e era bom aluno. Permitiram, mas ele foi jurado de morte se voltasse à favela”, conta a mãe E..
Fotografias e informações sobre crianças e adolescentes desaparecidos podem ser encontradas no site do programa (www.soscriancasdesaparecidas.rj.gov.br). Qualquer informação sobre o paradeiro de um deles, basta discar 100 ou ligar para (21) 2286-8337.
Falta de legislação e integração de bancos
?O Dia Internacional da Criança Desaparecida foi criado, em 1979, nos EUA, e nos anos seguintes se estendeu a países da Europa, onde até hoje a polícia não descobriu o paradeiro da pequena Madeleine McCann, que sumiu aos 3 anos, de dentro de um resort em Portugal. No Brasil o tráfico de pessoas, que muitas vezes está por trás dos desaparecimentos, ganhou as telas na novela ‘Salve Jorge’, da TV Globo, que ajudou a polícia a resgatar brasileiras na Europa.
Para o coordenador do programa SOS Criança Desaparecida da FIA, Luiz Henrique Oliveira, falta no Brasil uma legislação própria e integração entre os diversos cadastros de buscas dos órgãos públicos. “O Brasil tem que abraçar essa causa com um conjunto de medidas que possa rapidamente dar uma resposta aos desaparecimentos’, ressalta.