Rio - As recorrentes cenas de violência policial não assustam a população tanto quanto a possibilidade de uma extorsão dos agentes de segurança pública. É o que mostra uma pesquisa feita pelo Instituto Gerp, a pedido do DIA. De acordo com o levantamento, a maior parcela (39%) identifica a corrupção como o principal problema da Polícia Militar.
O excesso de violência é o quarto quesito apontado: 8%. Antes vêm a falta de treinamento (20%) e a remuneração (13%). Foram ouvidas 870 pessoas no estado, entre 18 e 23 abril, e a margem de erro é de três pontos.
Para o sociólogo e coordenador do Laboratório de Análise da Violência da Uerj, Ignacio Cano, o índice da violência ocupar o quarto lugar reflete uma certa tolerância com a repressão. “Há setores da sociedade que concordam com a violência policial, como a ideia de que bandido bom é bandido morto, mas não aceitam a corrupção”, aponta Ignacio Cano.
O pesquisador pondera também que, como esse tipo de violência atinge sobretudo determinadas minorias — como a população negra da periferia —, a classe média acha que está mais imune a agressões de policiais. “Os senhores de classe média não têm medo de agressões da polícia. Mas uma extorsão pode afetar qualquer um”, analisou.
Delegado e doutor em Ciência Política, Orlando Zaccone diz acreditar que a percepção encontrada no levantamento tem relação com a mídia. “Acho que essa percepção ocorre mais em virtude dos noticiários e dos grandes debates, em alguns casos. Não sei se essas pessoas já foram vítimas de extorsão policial”, afirma Orlando Zaccone.
Ele observa que a impressão é curiosa, já que a corrupção pode ser percebida em outras instituições públicas, mas a violência é restrita a policiais e criminosos.
“A corrupção não é exclusividade dos PMs; existem outros órgãos com casos até mais volumosos. Interessante é se perguntar como a sociedade acaba assimilando o discurso de que a corrupção é o maior dos males, mas convive muito bem com a violência”, critica Zaccone. Procurada pelo DIA, a Secretaria de Segurança Pública não se pronunciou.
O Gerp também perguntou se os entrevistados já tinham sido assaltados ao menos uma vez — e 48% responderam que sim. Outros 30% dos consultados disseram que já foram assaltados três ou mais vezes.
O professor Ignacio Cano alerta que, apesar de alarmante, o dado é semelhante aos da maioria das capitais brasileiras. “Em média, em um ano, o índice fica entre 10% e 20% no máximo, sendo que 20% já são um índice bastante elevado”, detalhou. No levantamento, o Gerp não perguntou quando ocorreram os assaltos.
Segundo a pesquisa, o perfil dos moradores mais assaltados é composto por mulheres a partir dos 35 anos e com renda superior a 20 salários mínimos.
Jovens sofrem mais assaltos e são os mais descrentes
A pesquisa revela que jovens entre 18 e 34 anos estão entre os mais assaltados. E os que têm entre 16 e 17 anos são os mais críticos em relação à corrupção policial (61%).
Na periferia da região metropolitana, 76% dos entrevistados disseram nunca ter sido assaltados.
Na outra ponta, entre os locais menos assaltados no estado aparecem o Centro e o Norte Fluminense, com 82% e 70%, respectivamente.
A desconfiança dos jovens em relação à PM foi constatada pelo DIA em entrevistas com alunos da Universidade Federal Fluminense, em Niterói. A região tem sofrido um recrudescimento desse tipo de crime, entre outros.
“A Polícia Militar é uma instituição corrupta e não nos sentimos protegidos. Parece que eles só servem para criminalizar os pobres e, principalmente, os negros”, afirmou a universitária Teresa Machado, de 25 anos.
Para o estudante Bruno Avelino, 16, adolescentes são um dos principais alvos dos criminosos.“Um homem armado nos roubou em frente ao Campo de São Bento. Vários amigos do meu colégio já foram assaltados”, relatou.
Ele também diz que não confia na Polícia Militar. “É uma instituição muito corrompida. A gente os vê entrando em restaurantes e comendo de graça”, criticou.
A estudante Camila Areas, 19, foi assaltada em Icaraí. “A rua estava cheia, mas a viatura de PM mais próxima estava a quatro quarteirões de distância”, disse.