Rio - A morte do comandante da Unidade de Polícia Pacificadora Nova Brasília, no Complexo do Alemão, capitão Uanderson Manoel da Silva, de 34 anos, aumentou o clamor da categoria pelo endurecimento de punição para quem cometer crimes contra policiais. Um projeto de lei que prevê aumento de um terço da pena para este tipo de delito já foi debatido, no ano passado, entre autoridades de segurança pública e o ministro da Justiça José Eduardo Martins Cardozo. De acordo com o Ministério da Justiça, a minuta ainda encontra-se sob análise.
“Já passou da hora do debate ser levado a sério. O policial militar que comete um crime, por exemplo, é julgado pela Justiça comum e pela militar. Não é justo que o criminoso passe por um julgamento mais brando. O meliante precisa pensar duas vezes antes de apertar um gatilho contra um agente de segurança pública”, disse, durante o sepultamento do capitão Uanderson, na tarde de ontem, o comandante da PM, coronel Luís Castro. “A Polícia Militar está de luto”.
Também emocionado durante a cerimônia que contou com honras militares e levou mais de 600 pessoas ao cemitério de Sulacap, o comandante das UPPs, coronel Frederico Caldas, endossou o discurso. “Oferecemos nossas vidas ao próximo. Não é justo que a lei nos enxergue desta maneira. A morte do capitão e dos outros seis policiais lotados em UPPs neste ano não será capaz de nos fazer recuar neste ideal de pacificação”, disse, entre lágrimas.
O secretário de Segurança Pública, José Mariano Beltrame, por sua vez, evitou falar no projeto de lei e creditou a série de conflitos na Nova Brasília à geografia local. “Os becos e vielas possibilitam esconderijos de criminosos”, lembrou ele, que prometeu se empenhar por penas exemplares para os envolvidos nos ataques de quinta-feira à UPP.
A morte do primeiro comandante de UPPs desde o início do processo de pacificação também foi lamentada por autoridades da alta cúpula do governo. No Rio, em campanha pela reeleição, a presidenta Dilma Rousseff deu destaque ao pioneirismo do Rio no projeto de segurança. “Lamento pelo cidadão que nos deixa. Mas acredito na política implementada e pretendo estendê-la para outros estados do Brasil”, disse.
Já o governador Luiz Fernando Pezão lamentou o óbito do “pai de família que não voltou para casa”. Pezão lembrou que a resistência do tráfico, encontrada até hoje no Complexo do Alemão, é proporcional à importância que a região sempre teve para a principal facção criminosa do estado, o Comando Vermelho.
Desde ontem, o Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar (Bope), que já atuava nas vielas do Complexo do Alemão, passou a operar com efetivo reforçado. Já entre policiais da UPP, o contingente ganhou 300 homens.
PM exalta bravura e diz que colete impediria morte
O coronel Frederico Caldas reconheceu que se o comandante da UPP Nova Brasília estivesse vestido com colete à prova de balas no momento em que se dirigiu ao Largo da Vivi, onde colegas de farda estavam encurralados, talvez não tivesse morrido. No entanto, argumentou que a atitude dele reflete o espírito de todo policial.
“Ele era bem treinado e extremamente ponderado. No entanto, o instinto de todo policial o fez partir, sem olhar para trás, com o intuito de ajudar seus oficiais”, disse. Para evitar que situações como essa voltem a ocorrer, a Secretaria de Segurança Pública lançou, na última semana, um curso de especialização voltado para comandantes de UPPs. “Trabalhamos aspectos psicológicos e operacionais. O ensino conta com profissionais de várias áreas”, explicou Caldas.
Definido como “calmo, inteligente e gente boa”, o capitão Uanderson acumulava experiência em comandos da PM. Há três semanas no comando da UPP Nova Brasília, ele já servia há três meses no local, como subcomandante. Antes, foi lotado no 14º, 15º e 41º BPM (Bangu, Duque de Caxias e Irajá, respectivamente). “Ele vivia 24 horas por dia para a polícia e para a família. Eram 11 anos de entrega total à corporação”, disse o amigo Luiz Henrique Araújo, que serviu com ele como fuzileiro, no Batalhão Payssandu, na Ilha do Governador, em 1999.
Preso teria atirado granada para impedir socorro a comandante
A polícia investiga se o grupo de cerca de 10 bandidos que abriu fogo contra os PMs e alvejou o capitão Uanderson agiu com o aval do chefão do tráfico do Alemão Luciano Martiniano da Silva, o Pezão. PMs relataram que o bando estava fortemente armado e até jogou uma granada contra os policiais que tentaram socorrer o comandante da UPP Nova Brasília.
Um desses criminosos seria Cassiano da Silva Harris, de 20 anos, preso na madrugada de ontem por agentes da 22ª DP (Penha). Ele foi reconhecido por militares como quem atirou o artefato, que só não explodiu porque o pavio apagou antes. Contra o acusado foi expedido mandado de prisão temporária de 30 dias. Apesar de Cassiano não ter antecedentes criminais, a polícia afirma que ele tinha envolvimento com o tráfico.
Ontem, o secretário de Segurança Pública, José Mariano Beltrame, lamentou a morte do oficial e disse que Cassiano será transferido para um presídio de segurança máxima. Pela manhã, policiais do Batalhão de Operações Especiais (Bope) detiveram outro suspeito em um galpão no Alemão.
Ainda segundo policiais, o capitão estava na sede da UPP, mas correu para auxiliar soldados que estariam encurralados pelos tiros no Largo da Vivi. Ele entrou em um beco e tentou passar por uma porta, mas em seguida gritou: “Tô pegado”, indicando aos colegas que foi atingido. O comandante estava sem colete. Os PMs que estavam próximos tentaram tirar o capitão do local o mais rápido que puderam, mas até chegar a viatura ainda enfrentaram tiros.