Por thiago.antunes

Rio - Os 21 presos semana passada no Complexo do Alemão podem responder pelas mortes e ferimentos a bala de policiais militares que trabalham nas favelas. O inquérito da 45ª DP (Complexo do Alemão) e do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público, foi enviado à Divisão de Homicídios (DH), que apura as mortes ocorridas em confronto.

Ordens para o bando atirar nos policiais teria partido de Edson Silva de Souza, o Orelha, chefe da quadrilha, preso durante a Operação UranoFabio Gonçalves / Agência O Dia

Escutas telefônicas autorizadas pela Justiça e que constam na denúncia do Ministério Público apontam que os acusados e quatro menores teriam participado de ataques a policiais, a delegacia, a UPP e ainda ateado fogo a ônibus. As ordens para o bando atirar em agentes da lei partiram de Edson Silva de Souza, o Orelha, chefe da quadrilha, além dos seus comparsas Cristian Nascimento da Silva, o CR, e Igor Cristiano Santos de Freitas, o King. Este último continua foragido.

Neste domingo, O DIA mostrou que um dos menores apreendidos durante a operação estava no grupo que matou a tiro o soldado da UPP Nova Brasília, Rodrigo Paes Leme, em março, como revelaram as investigações. De acordo com o diretor da DH, delegado Rivaldo Barbosa, o inquérito que culminou na ação da semana passada será anexado aos outros que apuram as mortes e tentativas de homicídios de policiais. Caso sejam confirmadas as participações, os acusados serão indiciados também por esses crimes.

O capitão Uanderson Manoel da Silva%2C comandante da UPP Nova Brasília%2C foi morto com dois tiros no peitoReprodução Internet

Levantamento feito pelo DIA mostra que pelo menos nove policiais militares foram baleados e outros três morreram em confronto com traficantes, somente este ano, no Complexo do Alemão. Além do soldado Paes Leme, o soldado Fábio Gomes da Silva, da UPP Fazendinha, morreu depois de ser alvejado no rosto, em 22 de março. Dia 11, traficantes mataram com dois tiros no peito o comandante da unidade Nova Brasília, capitão Uanderson Manoel da Silva.

Bandidos riam de feridos

Na denúncia do Ministério Público, escutas telefônicas revelam o desdém com que os bandidos se referiam aos policiais. Em um dos grampos, o acusado identificado como Igor deu ordens aos integrantes da quadrilha para “observarem e arrebentarem os policiais”, ressaltando que os comparsas deveriam “atirar consciente e cada um descarregar um pente”. Segundo as investigações, a ação seria uma retaliação pelo combate ao tráfico feito por PMs da UPP Nova Brasília.

Outros trechos das gravações mostram que os traficantes agiam com deboche quando policiais eram feridos. Depois de indagar um comparsa se estavam “dando muito tiro nos PMs”, Igor pergunta: “Está com pena?” E os dois começam a rir. Em 6 de março, um criminoso não identificado conta para Igor que “aquele p... foi de ralo (sic) tudinho”, referindo-se a policial baleado pela quadrilha. Neste mesmo dia, o soldado Paes Leme foi morto a tiros.

Paz celebrada com torneio de futebol para crianças

O Dia Mundial da Paz foi celebrado na manhã deste domingo com um torneio de futebol para crianças no Complexo do Alemão. As partidas foram realizadas em um dos pontos de constantes confrontos entre policiais e traficantes, conhecido como Inferno Verde. Embora o policiamento tenha sido reforçado, as autoridades do governo do estado não compareceram.

Ano passado, tiros assustaram o público que acompanhava a corrida Desafio da Paz, que contou com a participou o secretário de Segurança, José Mariano Beltrame. Algumas pessoas entraram em pânico e se abaixaram com o barulho das rajadas de fuzil. O incidente atrasou a corrida. Mesmo assim, Beltrame participou do evento, acompanhado por um segurança.

Partidas foram realizadas no Inferno Verde%2C um dos pontos de confrontos entre policiais e traficantesSeverino Silva / Agência O Dia

No evento deste domingo, os tiros foram substituídos por gritos de gol. Jovens entre 11 e 13 anos de diferentes regiões do Alemão se encontraram no torneio. Após as partidas, foram distribuídas, de graça, pipoca e pizza feitas pelos participantes da competição. “Esta é a terceira edição. Já fizemos torneio entre comunidades de facções rivais, entre moradores e policiais. O objetivo é agregar”, destaca o organizador do evento, Camilo Coelho. O time vitorioso foi o Inferno Verde. Os finalistas ganharam uniformes e chuteiras foram sorteadas. Os jogadores eliminados participaram ainda de uma oficina de desenho.

Moradores criticam agentes armados com fuzil no evento

Minutos antes dos jogos, um grupo de PMs revistou dois moradores, liberados em seguida. Os agentes foram hostilizados por alguns moradores, que criticaram policiais armados com fuzis no meio das crianças. “Não é preciso tantos policiais aqui. E ainda mais armados com fuzis”, disse Cléber Araújo, da empresa de turismo do Alemão.

“O evento é importante para chamar a atenção dos governantes para esta área, que é esquecida dos projetos de políticas públicas”, afirma. A Secretaria de Segurança Pública não se pronunciou sobre o assunto. O Dia Mundial da Paz é realizado pela ONG Peace One Day, que produz o evento pelo menos um dia no ano, espalhando a mensagem de cessar-fogo nos conflitos.

Você pode gostar