Rio - O governador Luiz Fernando Pezão e a cúpula da segurança, entre eles o comandante-geral da Polícia Militar, coronel José Luís Castro Menezes e o secretário de Segurança José Mariano Beltrame, se reuniram na manhã desta quinta-feira para discutirem sobre os últimos episódios de violência que aconteceram na cidade e em Niterói.
GALERIA: Militares reforçam segurança no Complexo da Maré
No final da reunião que aconteceu no Centro Integrado de Comando e Controle (CICC), Beltrame anunciou que a Polícia Civil realizará várias operações a partir de sexta-feira e que o efetivo do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) nas ruas será dobrado. De acordo com o secretário, que foi o único que falou com a imprensa após o encontro, a cidade já passou por outros episódios de violência mais grave do que aconteceram durante a quarta-feira.
"O que eu posso dizer é que o Rio de Janeiro já viveu dias muito piores do que o de ontem (quarta-feira). A cidade pede paz e ela tem razão de pedir. E o meu interesse é trabalhar para a sociedade".
Beltrame lembrou que já aconteceram ataques criminosos em vésperas de eleições passadas. "Há uma predisposição a isso (confrontos). Não posso garantir que está relacionada (ao período eleitoral), mas se vocês fizerem um período de reflexão e lembrar do que o tráfico fez aqui em 2007, botou fogo em pessoas vivas dentro de um ônibus, metralhou delegacias e, em 2010, começou a espalhar focos de incêndio, agora novamente nós temos essas ações", explicou Beltrame, garantindo que que a polícia vai seguir trabalhando para tentar combater a violência no Rio de Janeiro.
Comunidades pacificadas têm novos confrontos durante a madrugada
"A intenção dos traficantes é desmoralizar o processo de pacificação. Mas nós temos muita gente do serviço de inteligência nas ruas para solucionar esses problemas. Não vai haver recuo", completou.
Ataques assustam o Rio às vésperas das eleições
Desde as primeiras horas de quarta-feira, os traficantes promoveram ataques contra militares e queimaram ônibus, espalhando uma onda de violência em vários pontos do Rio e Niterói. Uma das ações mais audaciosas foi a fuga de bandidos que tentaram invadir duas comunidades do Complexo da Maré pela pista lateral da Avenida Brasil, trocando tiros com rivais em plena luz do dia.
A mais importante via expressa do Rio, num horário de intenso movimento, teve o trânsito interrompido por tanques do Exército para garantir a segurança de quem circulava ali. Três suspeitos de participar desta ação foram presos. À noite, um coletivo foi queimado em área nobre de Niterói, em represália à morte de dois jovens.
O principal atentado desta quarta aconteceu pouco antes das 15h. Como O DIA noticiou há duas semanas, traficantes do Complexo do Caju tentam retomar o controle da venda de drogas nas comunidades Vila do João e Conjunto Esperança, ambas na vizinha Maré. Com apoio de criminosos do Morro da Pedreira, em Costa Barros, bandidos tentaram nova investida na quarta à tarde. Armados com fuzis e pistolas, o bando acessou as comunidades, mas foi recebido a tiros pelos rivais. Os disparos chegaram à Av. Brasil, o que gerou pânico e fez motoristas tentarem sair do local na contramão.
O bando invasor fugiu pelo Canal do Cunha, uma área de mangue ao lado da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Os tiros fizeram com que funcionários da instituição fossem liberados antes do fim do expediente. Em nota, a Fiocruz negou a tentativa de invasão. Com a Força de Pacificação do Exército ocupando a via expressa, policiais do 4º BPM (São Cristóvão), da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) Caju e de unidades de elite da corporação fizeram cerco na região.
Acionados por testemunhas que viram a quadrilha invadir uma empresa de transportes próxima ao Canal do Cunha — o bando foi flagrado por câmeras de segurança —, os PMs da UPP prenderam os fugitivos Leandro da Silva de Campos, Wallace Marcelino e Edson Ribeiro Roque. Eles tentaram obrigar um motorista da firma a ajudá-los na fuga. Os outros traficantes conseguiram escapar.
Os criminosos, que escaparam pelo mangue, estavam sujos de lama. Na delegacia, o trio confirmou que é do Morro da Pedreira. A polícia já sabe que as tentativas de invasão na Maré são executadas por ordem de Celso Pinheiro Pimenta, o Playboy, chefe do tráfico na Pedreira.
Segundo a polícia, os bandidos entram pelo Caju, que é da mesma facção Amigos dos Amigos (ADA), e atravessam o Canal do Cunha em barcos de pescadores para acessar a Maré. Com os presos, foram apreendidos dois fuzis, duas pistolas, carregadores e munição.
Morte de dois jovens gera revolta em área nobre de Niterói
A morte de dois jovens do Morro do Cavalão, que fica entre Icaraí e São Francisco, fez com que criminosos levassem pânico a endereços nobres de Niterói, no início da noite de ontem. Um ônibus da linha 38 (Itaipu-Terminal) foi incendiado na Rua Joaquim Távora. De acordo com informações obtidas pelos policiais militares, cerca de 15 menores mandaram todos os passageiros saírem do ônibus e atearam fogo. Uma barricada de fogo podia ser vista na entrada do Túnel Raul Veiga, que liga os bairros.
Também no início da noite um veículo com criminosos abordou pessoas que faziam churrasco na Avenida Rui Barbosa, em São Francisco e praticou assaltos. Apavorados, motoristas fugiram pela contramão, e o trânsito foi interrompido por duas horas. O reflexo do engarrafamento chegou à Ponte Rio-Niterói. O registro das duas ocorrências foi feito na 77ªDP (Icaraí).
Segundo a PM, os jovens eram suspeitos de integrar o tráfico e entraram em confronto com os militares. O comandante do 12ºBPM (Niterói), coronel Gilson Chagas, disse que criminosos desceram da mata no alto do morro, que foi cercado pela polícia. “Mobilizamos equipes com apoio de helicópteros para tentar prender os bandidos”. Na noite desta quarta-feira, boatos de que crianças haviam sido reféns em um colégio foram espalhados pelo aplicativo WhatsApp. Chagas mandou checar a informação logo que esta começou a ser espalhada, e constatou se tratar de boato.
Confrontos e mortes
Complexo da Penha — Homem identificado como Peru morreu na noite de terça-feira após confronto com o Bope, na localidade Vacaria. Segundo policiais, o suspeito seria olheiro do tráfico e estaria com pistola e granada. Em represália, grupo de 60 bandidos e menores atacou com paus, pedras e garrafas as bases da UPP na Vila Cruzeiro e Merindiba, além de patrulha na Esquina do Pecado.
Complexo do Alemão — Também na noite de terça, houve confronto na Favela Nova Brasília. Um suspeito morreu e dois ficaram feridos. Ontem, PMs foram recebidos a tiros na localidade Prédios Novos.
Mangueira — Terça à noite, policiais da UPP encontraram uma criança e dois adultos baleados após confronto entre bandidos. O patrulhamento foi reforçado.
Água Santa — Suspeitos num Sorento abriram fogo ontem contra uma patrulha que interceptou o veículo na Rua Torres de Oliveira, na entrada do Morro do Dezoito. Os tiros atingiram duas viaturas e um adolescente de 17 anos, que passava no local. Bandidos fugiram para o morro.
Formiga — Revoltados com operação de repressão ao transporte irregular, mototaxistas fizeram protesto e queimaram um carro na Rua Conde de Bonfim. Com medo, comerciantes fecharam as portas. Houve conflito com policiais da UPP, mas sem registro de tiros.
Alerta em possíveis ataques a outras comunidades com UPPs
Os confrontos em várias regiões da cidade afetaram a rotina dos estudantes. De acordo com a assessoria da Secretaria Municipal de Educação, na Maré, 11 escolas, três creches e dois Espaços de Desenvolvimento Infantil (EDIs) não funcionaram nos três turnos, deixando 8.283 alunos sem aulas. Contando com outras escolas, quase 12 mil ficaram sem escola.
A guerra de facções rivais na Maré se acirraram na semana passada. Informações passadas ao Disque-Denúncia (2253-1177) citavam ameaças de ataques na região e em outras áreas com UPPs. Naquela semana, foram registrados confrontos no Lins de Vasconcelos, Mangueira, complexos da Penha e do Alemão, Tabajaras (em Copacabana).
As informações da polícia são de que, especificamente na Maré, o traficante Playboy quer retomar o reduto que o ADA perdeu para o Terceiro Comando Puro (TCP) em 2008. Desde então, várias tentativas de invasão foram feitas, mas a primeira depois da ocupação do Exército foi há duas semanas.
Ainda segundo alertas do Disque-Denúncia, traficantes também estariam preparando ataques na comunidade do Mandela II, em Manguinhos, e no Batan, em Realengo. Neste último, o plano seria reunir cerca de 50 bandidos e atacar a UPP local durante a madrugada. Os traficantes sairiam da Vila Vintém para reforçar o ataque. Sobre Manguinhos, o alerta de ataque foi feito ontem. Menores armados estariam sendo usados pelo tráfico em um plano de ataque à base da UPP no Mandela.
A polícia também atenta para informações de supostos alertas de ataques criminosos no dia da votação, domingo. Bandidos de diferentes facções estariam se articulando em redes sociais para uma ação contra seu principal alvo: as UPPs. No entanto, apesar dos recentes tiroteios, não foi confirmada nenhuma movimentação.