Por thiago.antunes

Rio - Crime passional é a principal linha de investigação da Divisão de Homicídios (DH) para elucidar a morte da delegada-substituta da 36ª DP (Santa Cruz), Tatiene Damaris Sobrinho Damasceno Furtado. O corpo foi encontrado ontem à tarde na cozinha de casa, na Rua Lomas Valentinas, em Realengo. A DH não descarta outras hipóteses, como vingança de milicianos. O sepultamento será nesta sexta, às 14h, no Cemitério Jardim da Saudade, em Sulacap.

Marido da vítima, Alessandro Oliveira Furtado — que alega ter encontrado a mulher morta — foi levado para a delegacia, onde foi autuado por homicídio e ficou preso, pois foi flagrado no local do crime e entrou em contradição várias vezes. Segundo investigadores, ele é o principal suspeito do assassinato. A Polícia Civil investiga se brigas ou ciúmes teriam motivado o homicídio.

Até 22h15 desta quinta agentes aguardavam o laudo de exames do Instituto Médico-Legal (IML) para saber a causa da morte. Porém, indícios apontavam para estrangulamento. O corpo não apresentava sinais de perfuração de faca ou tiros, mas havia muitos hematomas. “Dá a entender que ela lutou com o assassino até falecer”, contou um investigador. Segundo a PM, que recebeu a informação sobre o corpo pouco depois do meio-dia, a residência da delegada não tinha sinais de arrombamento nas portas e janelas.

Policiais isolaram o imóvel%2C na Rua Lomas Valentinas%2C para a realização da perícia e a retirada do corpo%3A investigadores analisam se brigas ou ciúme teriam motivado crimePaulo Araújo / Agência O Dia

Quando policiais do Batalhão de Bangu chegaram ao local, traficantes da Favela Vila Vintém soltaram fogos de artifício, deixando o clima ainda mais tenso. Agentes da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core) deram apoio aos militares com o uso de um blindado.

Aos investigadores da Divisão de Homicídios, a motorista da van escolar que buscou a filha de três anos de Tatiene no endereço contou que, ontem pela manhã, Alessandro levou a criança sozinho até o carro. Ela estranhou o fato, já que a vítima costumava acompanhar a menina nessa ocasião.

A motorista disse ainda que o suspeito estava sem camisa e não aparentava qualquer tipo de ferimento no corpo. Alessandro, que não aparentava estar nervoso e alterado, ainda teria conversado normalmente antes de voltar para casa. O principal suspeito, que seria estudante de Direito, em um primeiro momento teria dito que a mulher foi vítima de latrocínio (roubo seguido de morte), já que objetos como um computador teriam desaparecido do imóvel.

Segundo informações de inspetores da Polícia Civil, que não quiseram se identificar, também havia suspeita de que a delegada vesse sofrendo ameaças de um grupo de milicianos. Essa hipótese não foi confirmada e, de acordo com agentes, a DH chamou delegados da região onde Tatiene Damaris foi encontrada morta para uma reunião em caráter emergencial.

Tatiene Damaris, há dez anos na polícia, estava na 36ª DP (Santa Cruz)Carlos Moraes / Agência O Dia

Policiais de várias especializadas estiveram no local. Um morador descartou a ação de milicianos na localidade onde a delegada morava . “Em nosso bairro não tem milicianos, e sim ação de traficantes aqui perto. Nunca ouvi discussão entre eles. Era um casal tranquilo, e ela, muito discreta. Nem sabia que era policial”, disse um vizinho, que pediu para não ser identificado.

Um comerciante, que também pediu para não ser identificado, contou que Alessandro, conhecido na rua como Russo, tinha o hábito de comprar quentinhas no bairro na hora do almoço e quase não falava com os moradores.

“Era calado e pacato, porém estranho. Por muitas vezes só dava ‘boa tarde’ e seguia a pé com a filha para comprar quentinhas. Estão relatando que ele é o suspeito. Se for, seria uma bomba para a vizinhança, pois eles não tinham o hábito de discutir. Pelo menos, nunca vi”, garantiu o comerciante. Vizinha da delegada, que morou por três anos no condomínio Lonas Valentinas, que fica a 100 metros do local do crime, uma comerciante contou que Tatiene não costumava chegar em casa de viatura.

Vizinhos dizem estar chocados

O assassinato de Tatiane Damaris parou Realengo e tumultuo o trânsito da região. A 30 metros do local do crime, um carro bateu na traseira de um ônibus. Os motoristas teriam se distraído por causa da enorme quantidade de policiais na Rua Lomas Valentinas.

Incrédulos e chocados com a barbárie, vizinhos se recusaram a acreditar que o marido da policial possa ser o suspeito do crime, porém alegaram que o casal, por ser discreto demais, possa ter algo para esconder. “Poucas vezes vi o Alessandro na rua com a esposa. Era estranho”, contou uma dona de casa.
Vizinho da delegada, um comerciante ficou assustado ao avistar carros da PM cercando o imóvel. “A movimentação da polícia chamou até atenção do traficantes que acharam que a Vila Vintém fosse invadida. Não sabemos com quem vivemos dentro da própria casa”, lamentou.

Profissional empenhada e séria, afirmam colegas

Vista por colegas da Polícia Civil como uma profissional séria e empenhada, Tatiene Damaris dedicou quase dez anos de sua vida à Polícia Civil. Em 2005, ela entrou na instituição como papiloscopista, função que exerceu até 2008, quando foi aprovada no concurso para delegada. Ao término do curso foi lotada na 35ª DP (Campo Grande), onde ficou até setembro do mesmo ano, sendo transferida para a 34ª DP (Bangu). No entanto, cerca de cinco meses depois, voltou para Campo Grande.

Após anos de trabalhos na distrital e investigações sobre milícias e tráfico de drogas, Tatiene foi então para a 36ª DP (Santa Cruz), onde desempenhava a função de delegada-assistente desde agosto deste ano. Casada com Alessandro Oliveira Furtado desde junho de 2009, a vítima tinha dois filhos — uma menina de 2 anos e um adolescente de 17, que seria fruto de outro relacionamento. Colegas da Academia de Polícia contam que a vítima era discreta e não costumava participar de confraternizações.

O último caso envolvendo a morte de um delegado no Rio foi em 2008, disse ontem a DH. No dia 20 de maio daquele ano, o então delegado da 20ª DP (Vila isabel), Alcides Iantorno de Jesus, foi assassinado no Recreio. Na época, foi morto pelo ex-PM Alexandre Lins de Medeiros. O motivo: vingança. Em 2003, Alexandre fora preso por Alcides, então na Delegacia de Roubos e Furtos de Automóveis, sob acusação de ser armeiro do traficante Paulo César da Silva Santos, o Linho, apontado como o chefão do tráfico de drogas da Maré. O ex-policial militar foi morto dias após o assassinato de Iantorno.

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