Por paloma.savedra

Rio - A imagem é de duas crianças dentro de uma delegacia, após um furto do qual são apontadas como autoras. Os meninos, um de apenas 6 anos, e outro de 12, foram levados diretamente à 17ª DP (São Cristóvão), em um procedimento que seria comum e legal a qualquer criminoso maior de idade, o que não ocorreu. O fato não só viola as regras dispostas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), como pode deixar marcas permanentes na vida dos menores. 

'Se meu filho tivesse 18 anos, já estaria preso injustamente'

"Esse procedimento é violador de todos os direitos protetivos da infância e da adolescência. Mandei ofício ao chefe da Polícia Civil lamentando esses excessos da polícia", declarou o desembargador da 7ª Câmara Criminal do Rio de Janeiro, Siro Darlan, que foi titular da 1ª Vara da Infância e Juventude.

O magistrado destaca que a criança de 6 anos jamais poderia ter sido levada a uma delegacia, e sim diretamente ao Conselho Tutelar. Ele afirma que o artigo 230 do ECA foi claramente violado pelos policiais, o que representa a "política fascista de Segurança Pública do Rio". Darlan diz ainda que o caso deve ser apreciado pelo Ministério Público do Rio (MP), para que o órgão tome as medidas cabíveis. 

Desembargador Siro Darlan criticou medida da polícia e acredita que o MP deve apreciar o casoFernando Souza / Agência O Dia

Os dois menores foram levados para a delegacia por policiais, depois de uma senhora afirmar que eles arrancaram o seu colar. Os PMs e a Polícia Civil trataram o caso como flagrante. De acordo com o magistrado, o ECA determina o encaminhamento do menino de 6 anos ao Conselho Tutelar e o do menino de 12 à Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA), não a uma delegacia comum. Ao adolescente, também podem ser aplicadas medidas socioeducativas, diferente do menor de apenas 6.

"Trata-se de uma criança de 6 anos que jamais deveria entrar ali. O lugar dela é no Conselho Tutelar. A apreensão dessa criança é absolutamente ilegal. O artigo 230 penaliza as pessoas que prendem ilegalmente adolescentes e crianças", afirmou ele, que ainda acrescentou:

"É um absurdo que isso tenha acontecido no Rio de Janeiro, mas é esse sistema fascista de segurança pública que criminaliza uma criança. Acho que esse caso deve até ser apreciado nos tribunais internacionais", opinou o desembargador. 

Para Darlan, além de infringir a lei, o ato prejudica o futuro desta e de outras crianças: "Essa violação é multiplicadora da violência. Quando você apresenta essa imagem é uma declaração de que ele (o menino) nasceu para ser bandido. É apenas uma criança, e o Estado lhe nega a oportunidade de ser criança, de ter uma creche, uma escola, um Conselho Tutelar".

Para Beltrame, caso é emblemático e polícia agiu 'em flagrante'

Na contramão das declarações de Darlan, o secretário de Segurança Pública do Rio, José Mariano Beltrame, defendeu a ação da polícia no caso, apesar de lamentar o envolvimento de crianças em um furto. A afirmação foi veiculada em vídeo no Twitter da secretaria. 

"É um caso emblemático, em que uma criança de 6 e uma de 12 são presas em flagrante, detidas em flagrante, roubando uma senhora. É o limite, não consigo entender como uma criança de 6 anos pode ser partícipe desse tipo de ação", opinou Beltrame.

Beltrame diz que outros setores são importantes para que esses casos não se repitam: "Isso tem acontecido e nos preocupa. E o caso de hoje é sem dúvida emblemático para que se veja onde estão as falhas desse processo e que todos nós da sociedade procuremos uma saída. E eu acho que não passa exclusivamente pela polícia".

"Esses dois menores precisam de muitas outras coisas que não só a ação da polícia, mas como foi um flagrante, a polícia tem que agir", concluiu. 

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