Por felipe.martins

Rio - Ruas desertas e comércio fechado às 21h, levando prejuízo aos lojistas e limitando a quase zero as poucas opções de lazer. Segundo moradores, esse é o cenário visto nas últimas semanas no Complexo do Alemão, e teria como motivo uma ordem de policiais militares que reocupam a região há uma semana. Em redes sociais, pessoas que moram no conjunto de favelas denunciaram, com fotos e vídeos, que o ‘toque de recolher’ começou há três dias e partiu das forças especiais da PM.

M. trabalha em uma loja na localidade conhecida como Coqueiro, na parte alta do complexo, e foi um dos comerciantes que receberam a ordem. “Na segunda-feira, os policiais passaram aqui mandando todo mundo fechar as portas: ‘Pode fechar, pode fechar’, eles diziam”, contou.

Comerciantes do Alemão afirmam que policiais percorrem as ruas mandando lojistas baixarem as portas Divulgação

Moradora do Reservatório, C. passou os três últimos dias sem ir ao trabalho. “A polícia manda e a gente tem que obedecer. Faltei ao trabalho porque chego às 22h em casa e nessa hora já não pode ter ninguém na rua. Tudo fica deserto e os policiais te mandam entrar logo. Fico com medo de atirarem”, disse.

Quem mora nas regiões da Alvorada, Praça do Cruzeiro, Largo do Coqueiro e Areal — esta última, onde morreu o menino Eduardo, semana passada — também tem sido obrigado a se recolher mais cedo, segundo relatos dos próprios moradores.

Questionado nesta quinta-feira sobre o problema, o comandante-geral da PM, coronel Alberto Pinheiro Neto foi categórico: “Isto não é procedimento da polícia.” O comandante ressaltou que policiais poderão ser punidos, caso o fato seja comprovado. “Se, em algum momento, um policial determinou a um morador que ficasse em casa, vamos investigar”, ressaltou Pinheiro Neto, repetindo a posição da Coordenadoria de

Polícia Pacificadora. O coordenador de Comunicação da corporação, coronel Frederico Caldas, também reagiu às denúncias dos: “É absurdo imaginar que isso esteja acontecendo”.
Carlos Coutinho, 32, fotógrafo do Coletivo Papo Reto, fez um vídeo em que mostra o comércio fechado na terça-feira, por volta das 21h. As imagens foram divulgadas numa rede social. “O toque de recolher vem acontecendo desde que os homens do Choque e do Bope ocuparam o morro”, contou.

Policiais do Comando de Operações Especiais (COE) — formado pelos batalhões de Operações Policiais Especiais (Bope), de Choque (BPChoque), de Ações com Cães (BAC) e Grupamento Aeromóvel (GAM) — estão no Alemão desde o dia 2, depois que episódios de violência vitimaram, entre outros, o menino Eduardo, de 10 anos.

Depoimentos e reconstituições

Agentes da DH Capital tomarão novos depoimentos de parentes, testemunhas e PMs envolvidos na morte do menino Eduardo de Jesus, 10, assassinado com tiro na cabeça no dia 2, no Complexo do Alemão. De acordo com o o titular da DH, Rivaldo Barbosa, a polícia quer mais detalhes do crime, principalmente por parte da irmã da vítima, de 14 anos.

O comandante da PM%2C Pinheiro Neto%2C negou ordem para moradores Bruno de Lima / Agência O Dia

Nesta quinta-feira, quatro PMs envolvidos no caso do menino e intimados não compareceram à DH. Outros três, porém, que trocaram tiros no dia 1º, quando Elizabeth de Moura, 41, foi morta por bala perdida em casa, na Nova Brasília, foram à especializada, mas o conteúdo dos depoimentos não foram revelados.
Semana que vem a DH fará a reconstituição das mortes de Eduardo, Elizabeth, e do capitão Uanderson Silva, 34, comandante da UPP Nova Brasília, morto com um tiro no peito em 2014.

PMs passarão por psicólogos

Colocar em ordem uma casa do tamanho e com os problemas do Complexo do Alemão requer da polícia muito mais que operações. Além da caça aos traficantes e da volta dos policiais da UPPs aos bancos acadêmicos, a PM vai contra-atacar em outros pontos estratégicos para as quadrilhas do Alemão, como o Morro Camarista Méier, no Engenho de Dentro. É para lá, segundo fontes da polícia, que bandidos do conjunto de favelas estariam fugindo e onde será feito o próximo treinamento de policiais da UPP.

Quinta-feira, o comandante-geral da tropa, coronel Pinheiro Neto, enfatizou que, além das instruções de reciclagem, os PMs também recebem acompanhamento psicológico para enfrentar o estresse causado pelo trabalho em área conflagrada — por conta da morte trágica do menino Eduardo, dois policiais pediram licença médica. No total, 320 PMs de três comunidades do Alemão serão reciclados.
“Precisávamos de um treinamento de autoproteção dos policiais para diminuir o risco. Era uma deficiência.

Em áreas de maior conflagração, é possível que o policial esteja mais estressado. Policiais são seres humanos, portanto, erram”, adimitu o coronel, ressaltando que a intervenção feita no local pelas forças de elite da PM é uma reorganização. “Houve um desequilíbrio do processo de pacificação. Os marginais procuram novas dinâmicas para o crime e temos que mudar também.”

Colaborou Amanda Prado


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