Por paulo.gomes

Rio - Uma semana após a retirada de mais de 100 pessoas do edifício Hilton Santos, no Flamengo, o novo endereço das famílias desabrigadas fica no coração do Centro do Rio, a Cinelândia. Na segunda-feira, parte da praça, próxima ao cinema Odeon, estava tomada por colchões e pertences dos invasores. No domingo, guardas municipais tentaram desmontar o acampamento improvisado e houve tumulto. O grupo afirma que só vai sair do local quando tiver garantia de novas moradias. O Estado fará na quarta-feira um mutirão para identificar a situação de cada família.

A rotina na Cinelândia dos ex-ocupantes do prédio do Clube de Regatas do Flamengo, que está alugado ao grupo EBX, de Eike Batista, é na base do improviso. Na segunda-feira, O DIA flagrou a jovem Lorraine dando banho nos seus filhos dentro de um balde. “Pegamos água no restaurante para dar banho nas crianças. A comida vem de doação do pessoal que passa e de alguns bares que dão quentinhas”, contou Lorraine Drielly Silva, de 16 anos, mãe de três filhos.

As famílias desabrigadas%2C com bebês e crianças%2C estão vivendo de doações e dormindo em colchões%2C com suas malas e demais pertences%2C na CinelândiaCarlos Moraes / Agência O Dia

Além dos colchões, o grupo também colocou um sofá na praça. As roupas e outros pertences ficam armazenados em caixas e sacolas. “Quando saímos do Flamengo, trouxemos tudo nas costas. Isso é tudo que temos”, completou Flavia Teixeira. Mesmo morando na rua, o grupo faz questão de manter a limpeza. A varrição fica por conta de Rosangela de Oliveira, 48. “Na primeira noite que passamos aqui tinha muito rato e barata por conta do lixo”, declarou.

Os desabrigados reclamam da atuação da Guarda Municipal. Segundo eles, no domingo, um agente teria agredido uma jovem que se recusou a retirar o colchão da calçada. “Eles vieram pegando tudo e um pedaço de madeira caiu na cabeça do meu filho de um ano. Quando fui discutir com o guarda, ele me deu uma chave de pescoço que eu quase fiquei sem ar. Ele só me largou porque mordi o braço dele”, declarou Lorraine Drielly.

A Guarda Municipal teve acesso ao vídeo gravado pelos próprios ocupantes que mostra o momento da confusão. Em nota, o órgão informou que agiu para remover uma estrutura com tapumes que estava sendo construída no local, por volta das 18h, e a jovem teria “tentado agredir o agente com um cabo de vassoura e precisou ser contida, até que retirassem o objeto de suas mãos, sendo liberada logo em seguida”. A Guarda Municipal declarou ainda que não houve uso excessivo de força. Segundo a Secretaria de Ordem Pública, é proibido por decreto municipal de 2008, a montagem de estruturas em áreas públicas, como barracas de camping, colchão e papelão.

Famílias não querem ir para abrigos

Desde a semana passada, os ex-invasores do prédio do Flamengo dividem a praça com uma feira de livros. Por conta da movimentação, as doações de mantimentos aos desabrigados aumentaram. “Tem muita gente que contribui, mas ainda precisamos de água, comida e roupa. Quem puder doar vai ajudar muito”, disse Rosangela de Oliveira.

Na semana passada, a prefeitura ofereceu dois abrigos aos invasores: um em Santa Cruz, na comunidade do Antares, e outro em Jacarepaguá, mas todos se recusaram a ir. “Querem colocar a gente num lugar que só tem viciado em drogas. Não queremos abrigo, queremos casa”, apontou outra ocupante, Flavia Teixeira, 31.

O grupo de mais de 50 pessoas que permanece na Cinelândia será atendido amanhã, pela Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social, para identificação de cada família, na sede da Defensoria Pública, de 9h às 16h. Em nota, a Secretaria informou que fará um mutirão para detectar a necessidade de cada um.

Histórico de invasões

Desde a chegada dos desabrigados à Cinelândia, a Secretaria de Ordem Pública informou que vem realizando operações para impedir a montagem de estruturas.

A reintegração de posse do edifício do Flamengo, no dia 14, foi marcada por momentos de confusão. Um incêndio dentro do prédio motivou um tumulto e policiais utilizaram spray de pimenta para conter os invasores. Na ocasião, dois homens foram detidos.

Antes de ocupar o edifício no Flamengo, o mesmo grupo também invadiu o antigo prédio Oi, no Engenho Novo, onde também foi retirados pela força policial. No mês passado, as famílias chegaram a ficar 15 dias em um imóvel da Cedae, na Gamboa, de onde também foram removidas pela Polícia.

O grupo é formado por antigos moradores das comunidades de Manguinhos e Mandela, na Zona Norte.

Você pode gostar