Por nicolas.satriano

Rio - Seguindo a tendência nacional, a maioria dos cariocas defende a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos. Pesquisa realizada pela Unicarioca revela que 88% dos entrevistados apoiam a Proposta de Emenda à Constituição(PEC), atualmente em tramitação na Câmara dos Deputados.

A pesquisa também revela que 67% dos moradores do Rio não creem mais nas casas de correção para infratores, dos quais 55% acreditam que a privação de liberdade torna os menores “mais revoltados” e mais perigosos.

Clique na imagem para visualizar o infográfico completoArte O Dia

“Há uma contradição nesses resultados, porque o carioca tem medo, se sente acuado, quer uma solução. A ideia do ‘qualquer coisa é melhor que nada’. E o dado mostra a opinião de que os cariocas não creem na melhora desses jovens se forem presos. O problema da violência, por lógica, se agravaria”, resume Jalme Pereira, coordenador da pesquisa realizada pela Unicarioca.

Para 89% dos cariocas, o crime praticado por menores tende a diminuir se a redução da maioridade penal for aprovada. “Se fosse assim, nós não teríamos violência nunca. A sociedade espera que o menor se sinta intimidado”, afirma Jalme. Foram realizadas 712 entrevistas com 12 questões no Centro do Rio no mês passado.

Segundo o coordenador, a pesquisa se restringiu à região central da cidade pois por ali passam moradores de todas as localidades do município. A análise dos resultados concluiu, por exemplo, que moradores das zonas Norte e Oeste anseiam mais pela redução da idade penal do que os da Zona Sul.

Depois de perguntar objetivamente qual a opinião sobre a proposta que tramita no Congresso, a pesquisa deixou o entrevistado livre para opinar a partir de quantos anos o jovem deve responder criminalmente. Dezesseis anos foi a idade mais lembrada (27%), seguida por 12 anos, defendida por 21% dos ouvidos. Já 18% querem a redução para 14 anos, enquanto outros 15% defendem a passagem de 18 para 15 anos

O levantamento da Unicarioca constatou que para 92% dos cariocas, a violência cometida por menores vem aumentando, e 89% consideram o número de crimes praticados por menores de 18 anos “estatisticamente significante”. Dados da Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp) do Ministério da Justiça estimam que os menores de 16 a 18 anos são responsáveis por 0,9% do total dos crimes praticados no Brasil.

Pela pesquisa, 53% dos cariocas defendem pena integral para crimes hediondos, como homicídios, estupro e sequestro. Outros 18% são favoráveis à internação em casas de correção, 12% defendem a pena máxima de 30 anos de reclusão e 5% chegam a defender prisão perpétua para os menores. Apenas 5% dos entrevistados apostam no cumprimento de medidas socioeducativas.

Rafael Custódio%2C da ONG ConectasDivulgação

'Sabemos quem vai preso no Brasil'

5 minutos com Rafael Custódio, da ONG Conectas

Advogado especialista em Direito Penal, Rafael Custódio é coordenador de Justiça da ONG Conectas Direitos Humanos e crê que o alto número de defensores da redução da maioridade penal decorre principalmente do “desconhecimento” da população sobre o tema.

1. Por que tanta gente defende a redução da maioridade penal?

A sociedade vê na prisão uma resposta eficiente para problemas que ela não resolve. Deveria servir de exemplo para este tipo de argumento o fato de que, apesar de termos a quarta maior população carcerária do mundo, somos um dos países que mais mata.

Deveríamos ser um dos países mais seguros do mundo, já que temos muitos presos. Não há exemplo de nenhum país do mundo que tenha reduzido a maioridade penal e apresente redução da criminalidade na sequência. É um desconhecimento muito grande, motivado pelo fato de os crimes cometidos por menores aparecerem mais na imprensa, mas estatisticamente, são ínfimos dentro do total. Os crimes dos adultos seguem sendo muito mais numerosos e mais violentos.

2. O que mais contribui para este “desconhecimento” ?

Há uma grande sensação de impunidade e insegurança no Brasil. Menores infratores são punidos, e com rigor. A Fundação Casa em São Paulo vive superlotada, as unidades no Rio de Janeiro também. Quando a sociedade elege um jovem como inimigo, demonstra que nós temos uma grande fraqueza.

Ao querer colocar esse menor dentro de uma penitenciária, significa dizer que não se crê na possibilidade de garotos de 15, 16 anos terem a menor chance de se recuperarem e conseguirem se reinserir na sociedade. Não há a visão de uma mínima chance de recuperação.

3. Qual efeito imediato que uma eventual aprovação da PEC traria sobre a Justiça e sobre o sistema prisional brasileiros?

Sabemos muito bem quem é que vai para prisão no Brasil. Há um perfil claro: são geralmente os menos escolarizados, mais marginalizados. O menor que for para cadeia é punido também por não ter tido escola. A redução seria como o Estado lavar as mãos para um problema grave.

Além disso, temos um sistema penitenciário completamente falido. Colocando mais jovens nas cadeias, o crime organizado se fortaleceria, a partir da cooptação destes jovens para suas fileiras.

PEC agita Brasília

Até ser aprovada, a PEC que reduz a maioridade penal movimentará os corredores do poder. Na semana passada, audiência pública na Comissão de Direitos Humanos do Senado ouviu associações de juízes e organizações não governamentais.

Parlamentares como Cristóvam Buarque (PDT-DF) e Lindbergh Farias (PT-RJ) foram contra a proposta, que aguarda parecer de uma comissão especial na Câmara antes de seguir para plenário. O relator do grupo, composto por 27 deputados, é Laerte Bessa (PR-DF). Vinte e um deputados da comissão são publicamente defensores da redução da maioridade.

Também na semana passada, o novo presidente da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Dom Sérgio da Rocha, divulgou nota em que diz ser contra a redução da idade penal. “Não é solução para violência”.

Um dos casos de violência citados pelos defensores da redução da maioridade é o assassinato da jovem Liana Friedenbach pelo então adolescente Champinha, em 2003. O crime, ocorrido na zona rural de São Paulo, chocou o país e acendeu o debate sobre o tema.

Doze anos depois, o pai da vítima, o advogado Ari Friedenbach, mudou de opinião e passou a defender a redução apenas para os menores que cometerem crimes hediondos. 

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