Rio - Dia 8 de junho de 2014, 7h46. O primeiro-tenente bombeiro médico Carlito Lessa da Silva recebe um chamado para atender uma mulher em trabalho de parto no bairro Tangará, em Cabo Frio, Região dos Lagos. O bombeiro chegou três minutos depois. Quando entrou na casa de terra batida, a criança acabara de nascer em cima de um lençol e o oficial apenas cortou o cordão umbilical que ligava Vitória à mãe,Letícia Martins dos Santos.
Comovidos com as condições precárias em que a família vivia, Lessa e os outros bombeiros fizeram uma campanha e arrecadaram donativos para ajudar Letícia e a filha Vitória. Os objetos, fraldas, sapatinhos, carrinho, entre outras doações, foram entregues dia 21 de junho. A boa ação de Lessa, no entanto, não foi bem interpretada por seus comandantes.
Lessa foi punido por sua generosidade. Hoje, quase um ano depois, ele começa a cumprir sete dias de detenção porque, segundo a sindicância aberta pelo corregedor interno, coronel Eduardo Ramos dos Reis, Lessa teria usado a viatura ASE-240 do Corpo de Bombeiros, sem autorização do comandante da unidade, para entregar à Letícia o que havia arrecadado.
Os outros dois praças que estavam com Lessa já cumpriram a pena de detenção. O oficial ficará no quartel do Centro. As acusações são negadas pela advogada do militar, Erineth Gonçalves de Souza. Letícia e a vizinha dela, Danila Nascimento Esteler, também afirmam que o oficial foi até o local num carro particular.
“Ele pediu autorização do comandante para levar as doações na viatura, o que foi negado, por isso ele usou o carro particular”, afirma Erineth.
De acordo com a advogada, Lessa se lamentou com um amigo dizendo que estava chateado porque teve seu pedido negado. “Ele disse que dava vontade de sair em socorro. Deduziram que por isso ele foi na viatura e estão punindo o médico por dedução”, afirma Erineth, que entrou com pedido de habeas corpus e foi negado pela Justiça Militar.
“Eles deveriam ser tratados como heróis”, analisa o integrante da Comissão de Direitos Humanos da Câmara de Vereadores, o major bombeiro Marcio Garcia (PR). “Deveríamos ir na contramão dessa punição. A motivação do ato, ajudar quem precisa, está na missão dos bombeiros de salvar vidas”, completou o vereador Garcia. Ele promete acompanhar o caso
Comando nega injustiça
A apuração do caso foi feita em dois procedimentos. Primeiro pelo comando de área e depois pela Corregedoria Interna, que decidiu pela detenção. Em nota, a assessoria da corporação informou que as inconsistências presentes na primeira apuração foram sanadas na segunda e que a materialidade dos fatos já constava no primeiro procedimento.
A nota diz ainda que no registro da Seção de Controle Operacional consta que a viatura foi utilizava para fins diversos, sendo lançadas informações de um “falso aviso” para legitimar seu uso, bem como adulteração de alguns documentos e que as ligações recebidas para acionamento de socorros são gravadas.