Por adriano.araujo

Rio - Ambicioso, o traficante Celso Pinheiro Pimenta, o Playboy, de 33 anos, arquitetava conquistar territórios até em áreas já dominadas por Unidades de Polícia Pacificadora (UPP), como o morro do Andaraí, na Zona Norte.

Para aumentar seu poderio, Playboy, que fazia parte da facção Amigos dos Amigos (ADA), negociava uma aliança com parte da facção Comando Vermelho (CV). Há três meses, montou base no morro dos Macacos, em Vila Isabel, onde também tem UPP. Dali, comandou uma série de ações com o objetivo de conquistar o Morro do Andaraí, segundo a polícia. Outra meta era expulsar rivais do Terceiro Comando Puro e tomar o controle do tráfico nas favelas Vila do João, Esperança, Salsa e Merengue e Vila dos Pinheiros, no Complexo da Maré, em processo de ocupação da PM.

Funeral%3A cortejo do corpo de Playboy não pôde ser acompanhado pela imprensa. Mãe do criminoso passou mal e desmaiou duas vezesFernando Souza / Agência O Dia

Playboy comandava cerca de 300 homens. Mas há quatro meses começou a temer traidores. Em maio, o medo aumentou com a prisão de Enio Costa de Oliveira, o Rei Eco, principal homem da quadrilha nos roubos de carga. Nas últimas semanas, o cerco foi se fechando, até que, às 12h40 de sábado, o traficante foi morto em megaoperação policial no Complexo da Pedreira, em Costa Barros. No enterro, ontem no Catumbi, familiares, amigos e comparsas fizeram um cerimônia sem ostentação, porém tensa, fechada para a imprensa e entrecortada por fogos de artifício.

“O cerco estava se fechando. Ele sabia disso. No meio criminoso se convive com a desconfiança de traição. A prisão do Rei Eco enfraqueceu a quadrilha”, explicou o delegado Marcelo Luiz Santos, da Delegacia de Roubo e Furto de Cargas (DRFC). Outra baixa no bando aconteceu em março, quando Caio Fernando Santos da Silva, o Molusco, foi baleado na perna durante um roubo a caminhão. Ele está foragido.

A EMBOSCADA

A operação que emboscou o traficante mobilizou as polícias Civil, Federal e Militar. No sábado, o bandido foi cercado por agentes da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core) que durante as investigações identificaram três endereços usados pelo bandido para dormir. Playboy estava na casa da namorada na Rua Ayrton Senna 40, e, ao perceber a chegada da polícia, tentou fugir e invadiu um outro imóvel, onde havia um homem e uma adolescente de 14 anos. Neste local, ele reagiu com uma pistola Glock, foi atingido por tiros no abdômen e no tórax e morreu a caminho do hospital. Quatro seguranças conseguiram fugir com fuzis.

No primeiro esconderijo de Playboy, os policiais encontraram oito quentinhas na sala. No quintal havia uma moto ligada, pronta para fuga, e outra caída no chão, o que leva os investigadores a acreditar que o bandido estava com mais comparsas.

O homem e a adolescente que estavam na casa invadida por Playboy foram levados para depor na Polícia Federal. “A quadrilha ainda conta com cerca de 300 homens”, diz Harry Taveira, delegado da Polícia Federal. “Nosso trabalho continua com o objetivo de prender outros criminosos”.

Foguetório%3A amigos de Playboy soltam fogos durante enterro do traficante no cemitério do CatumbiFernando Souza / Agência O Dia

Tio do traficante diz que sobrinho foi executado

Celso Pinheiro Pimenta, o Playboy, foi enterrado ontem, no Cemitério do Catumbi. No velório, o tio dele, o comerciante Cosme Pinheiro, de 62 anos, afirmou que ele foi executado. “A ação desastrosa da polícia matou meu sobrinho. A verdade é que ele foi assassinado. Dei muitos conselhos a ele, que era como um filho. A família não aprovava a vida que ele levava, mas ele tinha o direito de viver”, desabafou Cosme. Durante o cortejo houve uma intensa queima de fogos.

Dezenas de pessoas acompanharam o enterro. A mãe de Playboy, Rosa Maria Pinheiro de Araújo, teve que ser medicada e desmaiou várias vezes durante o velório. A capela onde estava o corpo ficou cheia de coroas de flores, que chegavam a todo momento. Uma delas era dos morros do Zinco, da Mineira e do Querosene, todos do Complexo do São Carlos. Outra foi mandada por pessoas do Morro dos Macacos, em Vila Isabel. “Descanse em paz, guerreiro”, dizia a frase.

Por medida de segurança, policiais do 3º BPM (Méier), 4º BPM (São Cristovão) e 16º BPM (Olaria) fizeram a segurança na entrada e no entorno do cemitério, segundo informações da assessoria de imprensa da Polícia Militar. Porém, o número de PMs na região era pequeno.

A imprensa não teve acesso à capela e também foi impedida de acompanhar o cortejo de Playboy. Na saída do caixão, as pessoas que estavam no velório gritavam palavras de ordem e xingaram e agrediram os cinegrafistas, fotógrafos e repórteres.

O tio de Playboy lembrou dos últimos momentos com o ele. “Estive na Pedreira quinta-feira. Não sabia que seria minha despedida dele. O que o levou para a vida do crime foram as más companhias. Era um garoto bom. Não tenho mais medo. O medo que tinha era de perdê-lo”, lamentou Cosme.

?Acusações a policiais

?Playboy tinha medo de morrer. A revelação foi feita pelo próprio traficante em uma entrevista dada ao coordenador-executivo do Grupo Cultural AfroReggae, José Junior. O vídeo foi postado ontem por ele em sua página no Facebook. Na conversa, Playboy disse também que era ameaçado de morte por policiais.

“Medo de morrer, com certeza. Acho que todo ser humano quer viver e quer poder criar os filhos. Ninguém quer morrer. Já pensei em sair disso tudo, poder ter uma vida melhor e ficar tranquilo. Nessa vida, as pessoas que nos amam também ficam apreensivas. Policiais falam que, se me pegar, vão me matar. Posso até me render que vão me matar”, afirmou.

Em um outro trecho da entrevista publicado por Junior também em sua rede social no sábado, o traficante contou que até tentou ser trabalhador. “Mas as circunstâncias da vida não me permitiram”, disse ele, alegando que não era o responsável por todos os crimes atribuídos a ele. “Não sou nenhum santo, mas muita coisa estão me forjando (sic)”, justificou.

?Medo nas ruas e nos muros da favela

A Pedreira amanheceu sem Playboy e sem segurança. Nos arredores da região até ontem dominada pelo traficante Celso Pinheiro Pimenta sinais de medo apareciam no comércio com as portas semi-abertas, nas pichações lamentando a morte do criminoso e no fechamento da Unidade de Pronto Atendimento (UPA), que deveria funcionar durante 24 horas.

Apesar do reforço de policiamento prometido pela Polícia Militar, a equipe de reportagem do DIA se deparou com apenas três viaturas do Batalhão de Choque. E as três estavam baseadas a salvo, num posto de gasolina, fora da zona de tiro.

“A vida aqui é assim, meu filho. A gente não vive. Sobrevive. Do jeito que dá, do jeito que Deus permite. Ou que o tráfico permite. Quando permite”, disse uma moradora, na fila de uma loja para comprar o frango assado do almoço de domingo.

Um dia depois da morte de Playboy%2C o comércio na Pedreira amanheceu com as portas semifechadas Paulo Araújo / Agência O Dia

Na ruas no entorno do Morro da Pedreira, era possível ver a presença de olheiros do tráfico com radiotransmissores, mas sem armamento ostensivo. Barricadas também continuavam por toda parte. O DIA encontrou com algumas delas na esquina das ruas Darvin Brandão com Sargento Silvio Hollenbach e em várias transversais da Avenida José Arantes de Melo e da Estrada de Botafogo. A boca de fumo entre as ruas Glicério e Gil Eanes também funcionava livremente. Num muro na Estrada de Botafogo era possível ver a mensagem ‘Costa Barros em luto’ pichada.

“A polícia disse que viria aqui no domingo. Aliás, disse que viria ontem. Nós já acostumamos. É o salve-se quem puder”, disse outro morador.

No sábado, as forças de segurança anunciaram o reforço de até 400 policiais na região. Ontem, a PM informou que alguns batalhões que integram o Comando de Operações Especiais (COE) estavam dentro da comunidade.

?Reportagem de Adriana Cruz, Caio Barbosa, Flávio Araújo, Maria Inez Magalhães e Vânia Cunha

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