Por paloma.savedra

Rio - Com a morte do traficante mais procurado do Rio, Celso Pinheiro Pimenta, o Playboy, de 33 anos, no Complexo da Pedreira, Zona Norte do Rio, neste sábado, a maior preocupação da polícia, agora, é evitar possíveis reações dos comparsas do criminoso e que outra facção tente invadir o conjunto de favelas nos próximos dias. A região já está ocupada pelo Comando de Operações Especiais (COE) da PM. “As forças especiais da PM (entre elas, o Bope e o Batalhão de Choque) já estão ocupando o complexo”, disse o coordenador de Inteligência da PM, coronel Antônio Goulart.

INFOGRÁFICO: Confira o passo a passo da operação

Em uma operação cirúrgica, as polícias Civil, Federal e Militar acabaram com o reinado do traficante mais procurado do Rio. Playboy foi emboscado na casa de dois cômodos da namorada, entre a Pedreira e o Morro da Lagartixa, na Zona Norte, na manhã deste sábado. O homem que cresceu na Zona Sul e ostentava colares de ouro e poder de chefão estava apenas com quatro seguranças que fugiram após tiroteio com os policiais. Ao receber voz de prisão, Playboy reagiu a tiros de pistola, foi baleado no tórax e abdômen e morreu a caminho do Hospital de Bonsucesso.

Playboy foi morto durante ação no Morro da PedreiraDivulgação

“O traficante tinha uma ampla rede de informantes e proteção. Com cem policiais envolvidos, sempre há perigo de não se manter o sigilo, mas não houve vazamento, o que foi fundamental para o sucesso”, comentou o coronel.

Três helicópteros e três blindados chegaram ao Complexo da Pedreira por volta do meio-dia de ontem. A Polícia Federal monitorava os passos do traficante há um ano. “Toda vez que as polícias se unem, o resultado é excelente. Ele era um criminoso violento, beligerante, que procurava expandir seus domínios e a eficácia da investigação e do planejamento nos permitiu chegar a ele”, avaliou o delegado da Polícia Federal João Luiz Caetano.

Estavam na coletiva os delegados da Polícia Federal%2C Harry Taveira e João Caetano%2C o delegado da Core%2C Fabricio Pereira%2C e o coronel da PM%2C Antônio GoulartAlexandre Brum / Agência O Dia

Playboy era considerado o maior ladrão de cargas do estado e líder da facção Amigos dos Amigos (ADA). O Disque-Denúncia estabelecera recompensa de R$ 50 mil por informações sobre ele.

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Segundo o delegado Fabrício Pereira, da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core) da Polícia Civil, a surpresa da ação impediu que o traficante pudesse arregimentar mais homens para se defender. “Já realizamos outras operações para prendê-lo, e sempre houve uma reação violenta. Desta vez, ele foi surpreendido e praticamente não encontramos resistência”.

As investigações sobre a quadrilha de Playboy continuam, segundo a PF. Os delegados não descartam que, conforme o próprio Playboy confessou há cerca de um ano, pagamentos de propina a policiais tenham dificultado a prisão dele anteriormente. “Vamos em busca de prender os comparsas e, se houver, algum agente público envolvido, também será preso”, garantiu João Luiz.

Playboy se preparava, segundo a PM, para tomar, no Complexo da Maré, bocas de fumo da facção Terceiro Comando Puro. Ele estaria fazendo acordo com o Comando Vermelho para dividir o território, deixado recentemente pelo Exército. Antes de comandar mais uma vitória do terror, Playboy perdeu.

Traficante era cria de Laranjeiras e entrou cedo para o mundo do crime

Morador de Laranjeiras%2C Playboy entrou aos 14 anos para o crimeRevista Veja / Leslie Leitão 7.02.2015

Último remanescente da quadrilha de Pedro Machado Lomba Neto, o Pedro Dom, Celso Pinheiro Pimenta, o Playboy, era nascido e criado em Laranjeiras, filho de um jornaleiro e uma dona de casa, e pai de seis filhos. O jovem de classe média entrou cedo para o mundo do crime e aterrorizava a Zona Sul no início da década passada. Por volta dos 14 anos, era conhecido como ‘Mamadeira’ e praticava roubo de casas e carros na região. Foi preso duas vezes antes de completar 18 anos.

Por intermédio de um padrinho, foi parar na Aeronáutica, de onde acabou sendo expulso após ser preso num assalto. Aos 22 anos, começou sua especialização na criminalidade ao roubar 11 fuzis de um quartel e vender a um traficante do Morro do Dendê, na Ilha do Governador.

Em entrevista à revista ‘Veja’ no início deste ano, Playboy contou ter tomado os fuzis de volta por falta de pagamento e levado para o Complexo da Maré, onde reencontrou Pedro Dom, antigo parceiro de infância em Laranjeiras.

Após sua facção perder força dentro do Complexo da Maré, Playboy se refugiou no Complexo da Pedreira, onde comandava uma das maiores facções do estado, com poderia bélico estimado em mais de 300 fuzis.

Na comunidade, “governava” de dentro de um bunker com mão de ferro. Os inimigos eram tratados sem perdão. Playboy ordenava que fossem esquartejados e queimados na localidade conhecida como Mangueira.

Playboy foi aluno de colégio tradicional da Zona SulRevista Veja / Leslie Leitão (7.02.2015)

Sua liberdade, até ontem, era comprada com muito dinheiro dado a policiais corruptos, cujas identidades ele nunca revelou. No ano passado, foi preso e acabou “perdendo” mais de R$ 1 milhão para os “vermes” — como ele chamava os policiais para quem dava o “arrego” (propina), que girava em torno de R$ 100 mil mensais, entregues pessoalmente.

Playboy gostava de ações ousadas. Uma das mais famosas atribuídas a ele foi o roubo de quase 200 motos do pátio do Detro (Departamento de Transportes Rodoviários) no fim do ano passado. Playboy nega que tenha ordenado a ação e garante ter mandado os traficantes da comunidade devolverem as motocicletas.

Outra imagem que correu o mundo e ficou ligada a Playboy foi a de traficantes da sua quadrilha armados de fuzil dentro da piscina da Vila Olímpica de Honório Gurgel.

Celso Pinheiro Pimenta estava foragido do sistema penitenciário desde agosto de 2009, quando recebeu o benefício do regime semi-aberto. Atualmente, Playboy estava condenado a 15 anos e oito meses de prisão em regime fechado.

A ostentação era uma marca de Playboy%2C que gostava de posar com muitos cordões de ouro e armas também banhadas a ouroReprodução

A fila anda: Arafat herda o poderio de Playboy e está na mira da polícia

Com a morte de Playboy quem assume o posto de chefão do tráfico do Complexo da Pedreira é Carlos José da Silva Fernandes, o Arafat, de 37 anos, foragido do sistema penitenciário desde 2012, após receber o benefício da Visita Periódica ao Lar (VPL). Ele cumpria pena por tráfico de drogas. O Disque-Denúncia (2253-1177) oferece R$ 1 mil de recompensa por quem der informações que leve à prisão do traficante.

Gilberto Mendes Dias, o Betinho, também está na linha de sucessão da quadrilha e é foragido do sistema penitenciário desde 2010. “Embora saibamos que Playboy será substituído, a morte dele nesse momento causa um grande baque no tráfico na região”, afirmou o delegado da DRE da PF, João Luiz Caetano.
Além de todo o Complexo da Lagartixa, Playboy tinha o domínio do tráfico também dos morros do Juramento, o Jorge Turco, Mundial, Proença Rosa, todos próximos a sua região. Mas ele queria ampliar seus territórios e seu próximo alvo era o Complexo da Maré.

Polícia procura herdeiro de PlayboyDivulgação

Segundo as investigações, Playboy já estava em negociação com traficantes do Comando Vermelho (CV) para expulsar os integrantes do Terceiro Comando Puro (TCP) da região e tomar o controle do tráfico nas favelas Vila do João, Esperança, Salsa e Merengue Vila dos Pinheiros. Como aliado nessa transação, Playboy tinha o traficante e líder da facção Amigos dos Amigos, Edmílson Ferreira dos Santos, o Sassá, preso em 2005. Ele permanece na Penitenciária Federal do Rio Grande do Norte, em Mossoró.

Playboy foi emboscado na casa da namorada, onde funciona também um terreiro de umbanda. Segundo informações que chegaram à Polícia Federal, ele dormiu no local já se preparando para passar por um ritual no qual tomaria banho de sangue de bode. O encontro com o pai de santo foi monitorado pela polícia, que chegou ao traficante antes do ritual, que estava marcado para ser realizado na madrugada de hoje.

“Se ele queria fazer isso para ficar com o corpo fechado, a Core (Coordenadoria de Recursos Especiais) chegou antes”, comentou o delegado Fabrício Pereira.

Os policiais foram ao Complexo com informações sobre três possíveis esconderijos de Playboy na tarde de ontem. “Nosso objetivo específico era capturá-lo, mas infelizmente ele reagiu, atirando na equipe com a pistola. Dentro da casa, encontramos ainda um fuzil, que foi apreendido”, detalhou o delegado.

Pezão elogia polícia e especialistas condenam morte

O governador do Rio, Luiz Fernando Pezão, lamentou ontem a morte do traficante Celso Pinheiro Pimenta, o Playboy. “Lamento muito (a morte do Playboy). Mas mostra que a polícia está trabalhando”, comentou Pezão. Em seguida, o governador lembrou que a polícia tem feito diversas prisões, como a que ocorreu na semana passada, em Araruama, de Ipojucan Soares de Andrade, o Velho, chefe do tráfico em Japeri, na Baixada Fluminense. “Isso tudo mostra que a inteligência da polícia está funcionando”, disse o governador, que destacou ainda a importância da integração das polícias do estado.

Na avaliação do doutor em Sociologia e membro do Laboratório de Análise de Violência da Uerj, Ignacio Cano, a operação na Pedreira foi um fracasso porque resultou na morte de Playboy e não em sua prisão.

“Qualquer operação que resulte em morte não pode ser comemorada como um sucesso porque ela é um fracasso. Tem que prender, não matar. Uma operação bem sucedida nem troca de tiros tem. Essa história de que capturando bandidos famosos vamos acabar com a violência é velha. O que tem que ser atacado é essa forma de controle territorial”, disse Cano.

Para sociólogo e cientista político Paulo Baía, a morte de Playboy não vai mudar o cenário violento no Complexo da Pedreira e nem no Rio. Ele lembrou que outros criminosos do peso de Playboy também foram mortos em ações policiais no passado e que a história só se repete, ano após ano.

“No primeiro momento pode até diminuir um pouco a violência, mas a lógica da guerra é essa: sai um, entra outro. Daqui a pouco teremos outro nome para substitui-lo. Foi assim com o Bem-Te-Vi, na Rocinha (morto em 2005 por policiais civis) e outras centenas de histórias iguais a essas que conhecemos muito bem. Essa guerra só ajuda a aumentar a violência”, analisou Baía.

Reportagem de Adriana Cruz, Caio Barbosa, Eugênia Lopes, Flávio Araújo, Guilherme Santos, Maria Inês Magalhães e Vania Cunha

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