Por tabata.uchoa

Rio - Era um verdadeiro rally urbano. Mas, no lugar de veículos off road, adaptados para enfrentar terrenos acidentados, pistas escorregadias e obstáculos, a dona de casa Luana Aleluia, de 24 anos, pilotava um carrinho de bebê pelas calçadas da Zona Norte. Há três semanas ela jogou a toalha e passou a circular com o pequeno Éverton Aleluia, de seis meses, agarrado ao corpo. Também pudera. Ao se esgueirar entre o comércio que avança ilegalmente pela área, na Estrada do Portela, em Madureira, a roda do carrinho ficou presa em um buraco causado pela falta de uma única pedra portuguesa. O que parecia inofensivo se transformou em drama, e a ida à UPA do bairro para uma dose de vacina deu vez à consulta pela queda do recém-nascido no chão.

GALERIA: Veja mais fotos do abandono nas calçadas

No último ano%2C a prefeitura emitiu 15.200 notificações por falta de manutenção em calçadasSeverino Silva / Agência O Dia

Não foram poucas as irregularidades constatadas pelo DIA em blitzes realizadas ao longo da última semana nas Zonas Sul, Norte e Oeste. Idosos, gestantes e mães acompanhadas de crianças hora parecem driblar mesas de bares, veículos de descargas que infringem a lei, hora caminham aos tropeços em solo adverso. Mas são as pedras portuguesas, que compõem alguns dos principais cartões postais do Rio, as campeãs de reclamações.

“Tenho dificuldades para enxergar, não vi o buraco, e olha que era dos grandes”, conta a aposentada Eunice Ribeiro, 82. Ao se desequilibrar, ela adquiriu um corte na testa. Hoje, só anda com acompanhante pela Rua Constante Ramos, em Copacabana.

MÉIER. O calçamento agoniza em área de responsabilidade da PrefeituraSeverino Silva / Agência O Dia

A Princesinha do Mar, notabilizada pelo mosaico em preto e branco, projetado pelo paisagista Roberto Burle Max, compõe parte significativa do total de 1,218 milhão de metros quadrados de pedras portuguesas da cidade, de acordo com a Prefeitura. O orgulho das obras de arte ao alcance de todos, no entanto, não se repete quando o tema é a responsabilidade pela manutenção das calçadas.

Segundo a Secretaria Municipal de Conservação, os trechos em frente a residências e estabelecimentos comerciais são de responsabilidade de seus proprietários. Talvez por isso, muitos se achem no direito de ocupá-las conforme a sua vontade, não respeitando os limites definidos em lei e parecendo não temer a fiscalização que cabe à outra pasta, a Ordem Pública (Seop).

TIJUCA. Na Rua Haddock Lobo é preciso vencer os obstáculos Severino Silva / Agência O Dia

Pela legislação, a área de colocação de mesas e cadeiras em calçadas deve respeitar a “largura mínima de quatro metros e a faixa desimpedida de pelo menos 2,5 metros, sem exceder a ‘testada’ dos imóveis”. Uma infração similar é livremente exercida em Madureira: a colocação de bancas com produtos para fora das lojas, reduzindo o espaço circulável a quase nada. Em ruas de outros diferentes bairros como Tijuca, Botafogo, Méier e Campo Grande é o pleno desrespeito à lei que dá a toada.

Já as calçadas de praias, praças e canais e prédios de propriedade municipal, a responsabilidade é da prefeitura. No trecho da Avenida Dom Hélder Câmara, no bairro da Piedade, na Zona Norte, o que se vê é concreto batido no chão, visivelmente deteriorado pela ação do tempo, no trecho que margeia um rio. Pouco à frente, na altura do condomínio Arena Park, latões e caçambas de lixo obstruem a passagem, enquanto aguardam o sistema de coleta.

PIEDADE. Tem quem driblar caçambas de lixo Avenida Dom Hélder CâmaraSeverino Silva / Agência O Dia

De acordo com a prefeitura, as operações em todas as regiões da cidade são regulares, incluindo as decorrentes de solicitações pelo número 1746. A Seconserva diz realizar fiscalizações por meio de suas 25 gerências. A pasta informa que o prazo de reparo gira entre 30 e 60 dias. No último ano foram 15.200 notificações. Desse total, 70% dos casos teriam sido resolvidos. As multas por não cumprimento das manutenções variam de R$ 250 a R$ 3.000, dependendo do tamanho da área da calçada. Um grupo de calceteiros é responsável pela recuperação e fixação de pedras portuguesas em áreas públicas.

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