Por adriano.araujo

Rio - Em tempos de brigas na Justiça e nas ruas entre taxistas e motoristas do Uber pela legalidade ou não do transporte de passageiros, ao redor da Rodoviária Novo Rio o que se vê é um show de irregularidades.

De dentro do terminal saem ônibus regulares para todos os cantos do país. Do lado de fora, basta o passageiro chegar à calçada para a bandalheira começar. Aos que chegam à cidade, a oferta inicial, na frente de todo mundo, é de táxis piratas para levar o visitante ao destino. Sem nenhuma cerimônia.

Aos que pretendem viajar, são oferecidos carros particulares, no melhor estilo das proibidas lotadas. Por perto circulam guardas municipais e policiais militares. Mas isso não atrapalha o esquema ilegal de transporte alternativo.

Família chega à rodoviária paralela em um 'pirata'Agência O Dia

A máfia do transporte irregular tem, como toda máfia, suas regras. No setor de embarque, por exemplo, são oferecidas as viagens “além-poça”, ou seja, as que passam pela Ponte Rio-Niterói, sendo a Baía de Guanabara a poça, na linguagem popular local.

Na rodoviária paralela são oferecidas viagens para Araruama, Cabo Frio, Campos ou para onde o passageiro quiser, dependendo apenas do quanto estiver disposto a pagar. “Aqui tem de tudo. Se o passageiro quiser ir até o Amazonas, a gente vai. É só desembolar o dinheiro do bolso”, explica o agenciador que fica sentado numa cadeira em frente à porta de entrada da Novo Rio.

Os preços são pré-fixados, mas também negociáveis. E dependem do serviço. Para Araruama, pelo ônibus regular, a corrida sai por cerca de R$ 40. No carro pirata, a R$ 45 desde que o passageiro aceite dividir o veículo com mais três outras pessoas. Se quiser exclusividade, pode ser por R$ 180. Com direito a ser pego em casa ou no trabalho.

“Não tem nada que a gente não faça. Boa vontade a gente tem. É só o passageiro ter boa vontade também”, garante outro agenciador, que se apresentou com o nome de Márcio Mãozinha.

Poucos metros adiante, sob o viaduto da Avenida Francisco Bicalho, surgem os agenciadores das viagens para o Sul do Estado. Assim como para o Norte, se o passageiro quiser esticar e descer um pouco mais pelo mapa, basta combinar o valor.

“É só botar preço. Eu tenho o meu. Mangaratiba é R$ 30, Angra é R$ 40 e Paraty, R$ 50. Se botar mais, vou até Aparecida do Norte (SP)”, diz o motorista, que se identificou como Rogério.

Em área mais próxima ao setor de desembarque, de acordo com o que foi dividido pelo grupo, saem as corridas para a Região Serrana. “Oficialmente, a gente vai para a serra. Petrópólis, Teresópolis, Friburgo. Mas se fecharmos na encolha, pode ser qualquer destino”, afirma Macalé, o intermediador.

Agenciador (sentado), que é quem negocia com passageiros, espera viagemAgência O Dia

?Passageiros se arriscam em busca de mais rapidez

Os passageiros que se dispõem a encarar uma viagem com carros piratas sabem que estão correndo riscos, mas optam por pagar preços mais baixos e ter mais rapidez na viagem intermunicipal. Se é pirata, naõ tem regra. Se não segue normas, é perigoso.

A cozinheira Fátima Mendonça, de 47 anos, contou que optou pelo serviço clandestino às vésperas do Réveillon de 2013, quando tentou comprar passagens de ônibus para São Pedro D’Aldeia e não conseguiu. Acabou sem opções em meio a uma rodoviária lotada.

“Estava tudo abarrotado e eu cheia de bolsas e criança. Você não faria isso? Passaria o Ano Novo na rodoviária? Duvido. Senti firmeza no piloto e fui. Não me arrependi. Se tem oferta é porque tem demanda”, disse ela.

O responsável pelo transporte, que se identificou como João Paulo, admitiu estar fora da lei, mas garantiu — apesar de não mostrar — ter habilitação e os documentos do carro em dia. O veículo, um Meriva, estava aparentemente em bom estado.

“É igual a cavalo em Paquetá. Se for um pangaré mal tratado, o turista não pega para dar uma volta. Fica com pena ou receio de alguma coisa. Se o carro estiver esmerilhado, o passageiro não entra. Tem medo. Uma coisa é pegar uma van da Rocinha para a Central. Outra é uma viagem para a Região dos Lagos”, comparou, defendendo-se.

Quem não espera horários nas linhas regulares se arrisca nos 'piratas'Agência O Dia

?Consórcio pede providências

Ilhada em meio ao caos, o Consórcio Novo Rio, que administra o terminal rodoviário, informou através da assessoria de comunicação que não tem responsabilidade sobre seu entorno.

Ainda assim, o consórcio avisou que cobra providência das autoridades em relação ao transporte irregular intermunicipal, a cargo do Detro (Departamento de Transportes Rodoviários do Estado do Rio de Janeiro).

“Em função das diversas reclamações, enviamos ofícios e pedidos regulares aos órgãos públicos no sentido de solucionar estes problemas do entorno. Ações são feitas, mas ainda assim, sem solução efetiva”, disse o consórcio em nota.

Procurado pelo DIA, o Detro, também através da assessoria de imprensa, informou por e-mail que “vem intensificando o combate ao transporte de passageiros sob cobrança sem autorização.”

O órgão confirmou ainda que este ano já foram recolhidos 2.329 veículos, sendo 1.252 carros particulares, táxis e Kombis, 753 vans irregulares e 321 ônibus piratas em todo o Estado do Rio de Janeiro.

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