Rio - Eles falam árabe, coreano e até russo, além de italiano, inglês, francês e espanhol. Mas não fazem parte do contingente de turistas estrangeiros que todos os dias desembarcam no Rio, e sim de um seleto grupo de militares do Batalhão de Policiamento em Áreas Turísticas (BPTur) que falam idiomas pouco usuais no Rio. A formação em línguas que fogem do trivial é uma prévia da preparação da corporação para atuar nos Jogos Olímpicos de 2016.
No BPTur, os 196 agentes da unidade carregam na braçadeira da farda a bandeira do país no qual dominam o idioma, o que facilita a comunicação dos estrangeiros com os policiais nas ocorrências. Alguns dos policiais aprenderam outras línguas fazendo cursos. Outros, em viagens pelo mundo, e há ainda os que trazem o idioma do berço por serem filhos de estrangeiros. É o caso do soldado Adman Barcelos, que aprendeu a falar árabe com o pai imigrante.
“Falei a língua até os 10 anos, idade que eu tinha quando ele morreu. Depois parei, mas falo bem. Agora, estou no curso aprendendo a escrita. Me sinto preparado para atender ocorrências com árabes”, afirma ele.
Amante das línguas, o tenente Yan Tarik Pimentel Madeira, de 29 anos, está estudando russo. Ele já domina o inglês e o francês. “Gosto de aprender idiomas. O russo é uma língua muito difícil, por isso precisei de um curso, ao contrário do inglês e francês que aprendi sem ter aulas. Mas até a Olimpíada estarei pronto para praticar o russo”, espera o oficial.
Filho de coreano, o soldado Bruno Marques Kim, 31, também aprendeu a linguagem oriental dentro de casa. “Se precisar me comunicar com um coreano, consigo fazê-lo sem o menor problema”, diz ele, ressaltando a importância de dominar outros idiomas. “Isso é fundamental para o profissional de segurança pública do Rio, cidade que tem muitos turistas de várias nacionalidades”, avalia ele.
Falar outro idioma, além do português, pode garantir uma vaga no BPTur para o policial que quer ingressar na unidade ou permanecer nela. A afirmação é do próprio comandante da unidade, tenente-coronel Mauro Fliess Costa. “É normal na corporação fazermos remanejamentos. Mas, como somos um batalhão de áreas turísticas, damos preferência aos policiais bilíngues na hora das mudanças”, conta o oficial. “Não é a única característica que levamos em conta na hora de transferir um policial, mas ela pesa bastante na hora da nossa escolha”, explica o oficial.
Experiência ao redor do mundo
Três anos morando na Toscana, Itália, foram suficientes para a soldado Lívia Peixoto, de 27 anos, aprender o idioma da terra das massas. Mas a saudade da família falou mais alto e ela voltou para o Brasil. Há sete meses na corporação, a PM está há quase 30 dias no BPTur. Antes, era lotada na Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) Nova Brasília, no Complexo do Alemão.
“Aprendi a língua em atividades do dia a dia, como ir à padaria. Isso facilita a comunicação com os turistas porque podemos alertá-los como se prevenir dos criminosos antes que sejam atacados. E eles ficam agradecidos”, explica ela, que trabalha em patrulhamento na orla.
As andanças pelo mundo também possibilitaram ao soldado Rafael de Assis Lopes, 32, falar espanhol e inglês. Em 2007, ele morou em Madri, na Espanha, e depois em navios de cruzeiros. Agora, está aprendendo francês em um curso pago por ele. “Trabalhamos numa cidade que recebe turistas do mundo todo o ano inteiro. Os estrangeiros se sentem seguros quando falamos a mesma língua”, garante ele, há quatro anos na PM.
Treinamento intensivo para evento
Segundo o comandante da unidade, tenente-coronel Mauro Fliess de Castro, a maioria dos PMs paga o curso de idiomas com o próprio salário. “Eles buscam a qualificação profissional por vontade própria, e isso tem que ser valorizado”, elogia o oficial.
“Mas estamos buscando parcerias com consulados e instituições de ensino para que os policiais possam ter, pelo menos, descontos nas mensalidades. Isso pode garantir o ingresso de mais PMs nos cursos de idiomas”, espera Mauro Fliess.
E uma dessas parcerias já acontece desde 2012 com a Universidade Federal Fluminense (UFF). A instituição é responsável pelo Curso Especial de Policiamento em Áreas Turísticas (Cepat) para a Polícia Militar. Além de receberem lições de espanhol e inglês, nas aulas os participantes aprendem sobre a história e geografia dos países, marketing turístico, negociação de conflitos, policiamento comunitário, imunidade diplomática e proteção a turistas. A parceria foi feita justamente para qualificar os policiais militares para os grandes eventos.
“Aprendemos, por exemplo, a lidar com autoridades de outros países em casos de ocorrências policiais. E ter noção da história do país do qual falamos a língua também é muito legal para compreender um pouco mais o turista. Acho importante”, avalia o soldado Marcus Azevedo, 34, que fala inglês e tem noção de espanhol.
Como o efetivo do BPTur é pequeno para o tamanho do evento que será a Olimpída 2016, além de trabalhar nos dias escalados, os PMs ficarão também de sobreaviso durante o período das competições, principalmente os que falam os idiomas menos usuais.
“Eles poderão ser acionados a qualquer momento se houver ocorrências com turistas das nacionalidades que eles dominem o idioma”, explica o comandante do BPTur. Os policiais ficarão mais concentrados nas áreas turísticas, como orla e Pão de Açúcar. Poucos irão para locais de competição. “Se precisarem, serão deslocados para esses lugares”, diz o oficial.