Rio - A terceira rodada de pesquisas realizada com policiais das Unidades de Polícia Pacificadora pelo Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC) mostrou que é preciso repensar o projeto das UPPs para não inviabilizá-lo por completo e jogar por terra todo o trabalho que está sendo feito há cerca de 8 anos pela secretaria de Segurança Pública (Seseg).
“O projeto das UPPs foi o que de melhor aconteceu no Rio nas últimas décadas, considerando que antes disso só havia polícia de guerra, onde, se fosse favela, podia atirar e matar à vontade. Mas é preciso mudar”, alerta a cientista social Silvia Ramos, uma das coordenadoras da pesquisa.
Confira infográfico com dados da pesquisa
E a mudança apontada pelo estudo tem a ver com a retomada da polícia de proximidade, algo que foi sendo deixado de lado segundo os próprios policiais. Muitos deles, inclusive, a favor desta mudança, condenada não só pelos especialistas como também pelo cúpula da secretaria de Segurança Pública do Estado (Seseg).
“Notamos um aumento das operações tradicionais, convencionais, táticas, e uma redução da polícia de proximidade, da ronda a pé, do contato com os moradores, com os projetos sociais da comunidade. Não era isso que estava previsto no projeto”, explica Silvia.
De acordo com os pesquisadores da CESeC, um dos motivos que levaram a esta deterioração do projeto inicial das UPPs foi a fragilidade na preparação dos PMs.
“O tempo de preparação já aumentou, mas ainda falta uma formação especializada para polícia de proximidade. É a mesma preparação para o policial do batalhão”, explicou a socióloga Bárbara Musumeci Mourão, também do CESeC.
O subsecretário de Educação, Valorização e Prevenção da Seseg, Pehkx Jones, admitiu parte dos problemas, disse que a pesquisa foi feita em parceria com o governo do Estado, mas lembrou que o levantamento divulgado agora foi feito em 2014, quando houve um acirramento da violência nas áreas de UPPs.
“Nós apoiamos a pesquisa e aceitamos as críticas. Partimos delas para aperfeiçoar o projeto. A questão é que, divulgada agora, faz parecer que nada foi feito nos últimos meses. E foi. Já houve uma correção de rumos e vai continuar havendo. Não faremos vista grossa para erros e críticas. Há problemas? Sim, bastantes. Mas estamos trabalhando seriamente para corrigi-los”, garantiu Pehks Jones.
Dentre as mudanças estão a reforma do currículo na academia, para que os novos soldados tenham uma formação voltada para o policiamento de proximidade. E os demais policiais também estão passando por cursos de reciclagem com o mesmo objetivo.
“A gente já tinha esta percepção no fim do ano passado. Sabemos que o jovem que entra na Polícia Militar tem o sonho de ser um Capitão Nascimento. Mas não é este policial que a gente quer nas UPPs”, disse o subsecretário, referindo-se ao personagem vivido pelo ator Wagner Moura no filme Tropa de Elite.
De acordo com a pesquisa, foi o abandono da polícia de proximidade que fez aumentar a rejeição dos moradores aos policiais, e a resistência destes policiais ao trabalho nas Unidades de Pólícia Pacificadora. No ano passado, 65,8% dos 2.002 entrevistados de 36 UPPs disseram ter sido xingados por moradores. A avaliação positiva das UPPs, assim, caiu de 60,2% para 41,3% em dois anos.
“O PM que anda a pé e conhece o jovem da comunidade não vai abordar esse morador dando tiro. Isso faz diferença”, disse Silva Ramos.
O subsecretário concorda, mas faz uma ressalva: ‘a diferença é que esta proximidade não dá para ser feita em território conflagrado. Precisamos garantir a tranquilidade para poder agir assim em seguida”, explicou.