Por felipe.martins, felipe.martins
Rio - A mãe de Cleiton Corrêa de Souza, Mônica Aparecida Santana Corrêa, estava revoltada com o descaso do Instituto Médico-Legal, que só fez a liberação do corpo de seu filho às 18h, quando o cemitério já estava fechando. O enterro aconteceu às 21h, após protestos de amigos e parentes do jovem. “Tive que enterrar meu filho no escuro. Um absurdo. Mas não ia sair daqui sem ter meu filho sepultado. Eles morreram juntos, tinham de ser enterrados juntos”, protestou Mônica Aparecida, bastante emocionada. Nesta terça-feira, a partir das 11h, haverá um protesto de moradores de Costa Barros e toda a região pela morte dos cincos jovens.
Demora na liberação do corpo de Cleiton obrigou os familiares a esperar até as 21h. ‘Tinham de ser sepultados juntos’%2C disse a mãe%2C MônicaErnesto Carriço / Agência O Dia

Batalhão do Horror 

Batalhão que no último mês protagonizou dois casos que chocaram os fluminenses, o 41º BPM (Irajá) lidera ranking macabro de mortes por intervenção policial este ano. De janeiro a outubro foram 67 homicídios, 12 a mais que o registrado ano passado. Menos de um mês antes do brutal fuzilamento dos cinco amigos em Costa Barros, o então comandante da unidade, tenente-coronel Marcos Netto — exonerado ontem — se explicava pela morte de dois rapazes numa moto, no caso do macaco hidráulico confundido com um fuzil.

Enterrados nesta  segunda-feira, os cinco amigos — Roberto, 16; Carlos Eduardo, 16, Cleiton, 18; Wilton, 20, e Wesley, 20 — comemoravam o primeiro salário de Roberto e seguiam num Palio, na noite de sábado, quando quatro PMs cravaram o veículo de tiros. O grupo ainda é acusado de plantar pistola junto aos meninos.
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“Foi uma ação trágica e desnecessária. Nada justifica uma atitude dessas”, sentenciou o secretário de Segurança, José Beltrame. “É abominável uma atitude como essa de pessoas treinadas para levar a paz. Cinquenta tiros em um automóvel não é normal”, fez coro o governador Pezão. Os policiais foram presos.
Com base nas informações do Instituto de Segurança Pública, O DIA organizou o ‘ranking da morte da PM’. Atrás do Batalhão de Irajá, figura o 7° BPM (São Gonçalo). De janeiro a outubro, foram 62 mortes por intervenção policial. Depois, o 12º BPM (Niterói), com 55 mortes (mais que o dobro do apurado em 2014).
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Para a cientista social e diretora do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (Cesec) da Candido Mendes, Silvia Ramos, há graves problemas estruturais na cadeia de comando da PM. “As bases não mais respondem às mudanças nos comandos. A PM se tornou ingovernável.”
ONG levou bandeira com 50 furos%2C representando o número de disparosDaniel Castelo Branco / Agência O Dia

O diretor-executivo da Anistia Internacional, Atila Roque, atenta para “a rotina crônica” de morte de jovens negros. “Nesse caso específico do 41º, estamos falando de um batalhão que tem longo histórico de uso extremo da força”, explicou Roque. E ele vai ao encontro da ‘ingovernabilidade’ citada por Silvia. “Como é possível esperar coerência das políticas de segurança, quando, a cada ano, as sucessivas trocas impedem a conclusão de um ciclo de gestão? Causa perplexidade.”

A emoção de uma bandeira
Cerca de 100 pessoas acompanharam o enterro dos jovens e chegaram a fechar uma rua próxima ao Cemitério de Irajá logo após o sepultamento, em protesto contra a violência policial no Rio de Janeiro. Durante o enterro, a ONG Rio de Paz estendeu uma bandeira brasileira com 50 furos, representando a quantidade de tiros disparados contra o carro em que estavam os rapazes, e emocionou os presentes.

Familiares e amigos das vítimas vestiam camisas com os rostos dos jovens e alguns levaram cartazes. “Jovens negros morrem na mão da polícia”, dizia um dos cartazes.  O pai de Roberto de Souza Penha, o advogado Jorge Roberto Lima da Penha, garantiu que processará o estado pelo crime. Ele foi ao enterro com o crachá funcional do filho e sua carteira de trabalho.
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“Vamos buscar a reparação de danos e processar o estado. Acabaram com o sonho do meu filho. Metralharam cinco crianças. Roberto era um moleque gente boa, trabalhador, estudava. Agora tudo acabou”, disse Jorge Roberto, em estado de choque.   
Reportagens de André Balocco, Caio Barbosa, Diego Valdevino, Maria Inez Magalhães, Nicolás Satriano e da estagiária Clara Vieira