Por daniela.lima

Rio - Doze anos após a condenação do Brasil por órgão da ONU, causada pela morte da gestante Alyne Pimentel por negligência hospitalar na Baixada, a mortalidade materna segue como um grave problema da região. Em dez municípios com mais de 80 mil habitantes, a média de 94,5 mulheres mortas por problemas na gravidez ou parto, a cada 100 mil bebês nascidos vivos, é quase cinco vezes maior que o tolerado pela Organização Mundial da Saúde (20 por mil). Se comparada com o Rio (69,7), ela é 35,5% maior. Japeri lidera o ranking, com 274,5 por mil, seguido por Mesquita (131,1). 

Clique na imagem para conferir os dados completosDivulgação


Os números, da Comissão Estadual de Prevenção e Controle de Morte Materna no Rio de Janeiro, fazem parte da sexta reportagem da parceria entre O DIA e a Casa Fluminense.

“Somos o quarto estado com a maior quantidade absoluta de óbitos maternos, atrás de São Paulo, Minas e Bahia”, diz o economista Vitor Mihessen, frisando que o Rio melhorou cinco posições de 2011 para 2012, indo da 11ª para 15ª colocação. O estado, no entanto, ainda tem média de 79,2 mortes por mil habitantes, contra 64 por mil do Brasil, que não cumprirá a meta do milênio, como se comprometeu. Alyne morreu aos 28 anos, no sexto mês de gravidez, após peregrinar em busca de atendimento na Baixada.

Os números são ainda piores para as mulheres negras. De acordo com o Conselho Estadual de Prevenção e Controle de Morte Materna, elas morrem duas vezes mais que as brancas ou pardas. Entre as que têm menos estudo, o risco é três vezes maior. “As mulheres são tratadas com descaso. Como seres fadados a parir em sofrimento e dor. Quando são pobres e negras, como Alyne, o preconceito das equipes de saúde é maior”, diz Angela Freitas, do Conselho Estadual dos Direitos da Mulher.

Segundo o Ministério da Saúde, entre 1990 a 2011 a mortalidade materna caiu 55%. O quadro, porém, segue assustador. Só no ano passado 179 grávidas morreram no estado do Rio. Para a OMS, taxas acima de 150 são consideradas muito altas.

“Não é mais aceitável que se trate a morte materna como destino das mulheres, uma simples fatalidade”, critica Beatriz Galli, da OAB. 

Solução passa por diálogo entre unidades

A qualidade da assistência obstétrica nas maternidades, serviços de urgência e pré-natal poderiam evitar 90% das mortes de gestantes. A avaliação é do Ministério da Saúde. “Hoje, a gestante faz o pré-natal e não sabe onde terá o bebê. É uma loteria, que define o destino dela e da criança”, diz Beatriz Galli, que enfatiza a importância do planejamento familiar.

Na opinião de Angela Freitas, não basta o Programa Saúde da Família: é preciso que todas as unidades de saúde falem entre si e estejam interligadas. O Ministério da Saúde informou que investiu, desde 2011, mais de R$ 3,3 bilhões para oferecer assistência e planejamento familiar até o segundo ano de vida do bebê. O programa atende 2,6 milhões de gestantes.

Já a Secretaria Estadual de Saúde disse que inaugurou, nos últimos três anos, duas maternidades na Baixada: o Hospital da Mulher Heloneida Studart, em Meriti, e o Hospital da Mãe, em Mesquita — além da reabertura da maternidade Municipal Mariana Bulhões, em Nova Iguaçu. 

Hipertensão é a principal causa da morte na gravidez

As complicações decorrentes do aborto, feito em sua maioria em clínicas clandestinas, são a quarta maior causa de morte materna no estado do Rio. No Brasil, a tentativa de interrupção da gestação ocupa a 5ª posição entre os motivos que levam a óbito. A maior parte das mortes de mulheres — 78% — ocorre por problemas de hipertensão, hemorragia obstétrica e infecção, principalmente entre as mulheres negras, de 10 a 49 anos.

Para a advogada Beatriz Galli, da Comissão de Bioética da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ), essas mortes poderiam ser evitadas com um pré-natal de qualidade. “Ou elas chegam sem ter ido às consultas, ou fizeram um pré-natal ruim. Logo um parto que poderia ser simples torna-se de alto risco, porque não foi tratada uma hipertensão, por exemplo”, critica. Para ela, os serviços na Baixada para gestantes de risco ainda são precários.

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