Por adriano.araujo

Rio - Qual o impacto que uma festa literária na favela tem na vida de seus moradores? Para Júlio Ludemir, organizador da Flupp da Mangueira, o mesmo que teria se fosse na Zona Sul. “Ninguém pede o CEP de um evento no Theatro Municipal. Por que deveria pedir quando é na favela?”, dispara o idealizador do evento, de quarta a domingo na Rua Visconde de Niterói, na antiga fábrica da Kibon, aos pés da Estação Primeira. “Não convidamos as pessoas para se exporem na Mangueira. Venham!”.

O bombardeio de Ludemir tem a ver com a disputa do tráfico pelos pontos de venda na comunidade, que conta com UPP. Seguro, ele promete invadir a Mangueira com mais 30 poetas para dar “rajadas de literatura e poesia”, na terceira versão do evento numa comunidade — já esteve no Prazeres e Vigário Geral.

O produtor cultural Júlio Ludemir numa livraria%3A evento homenageia líder negro Abdias NascimentoAndré Mourão / Agência O Dia

Hoje chamada de Festa Literária Internacional das Periferias, antes Festa Literária das UPPs — a Flupp é o amor da vida de Ludemir, que também criou a Batalha do Passinho. Numa defesa enfática do (re)conquista do território, se mostra irritado com o que vê como olhar preconceituoso de quem não entende o que é a favela.

“Todos os dias os moradores da Mangueira sobem e descem o morro normalmente. Quando as pessoas me perguntam se o evento é na Mangueira, põem em prática um preconceito, inclusive racial”, acredita.

Para quem ainda tem medo, um recado: a Flupp repete a estratégia das escolas de samba e sai do miolo da comunidade, longe do epicentro da batalha do tráfico. “Somos um evento republicano, para todos. Dizer que não dá para ir à festa por causa da Mangueira é o mesmo que não passar pela Av. Brasil por causa da Maré, ou escapar de São Conrado por conta da Rocinha.”

Quem for lá, verá.

Trinta autores participantes são de fora do país

?A Flupp terá 60 autores — destes, 30 virão de fora. Ludemir destaca a mesa das 14h de quarta-feira como uma das mais significativas. Nela, Leonora Miano, camaronesa radicada em Paris, vencedora do prêmio Femina, um dos mais importantes da França, estará com ChiBundu Onuzo. A jovem, da Nigéria, tem 21 anos e foi a primeira autora desta idade a publicar pela Faber & Faber, a que publicou 12 autores ganhadores do Prêmio Nobel.

“Elas vão debater o tema ‘O amor nos tempos de ebola’, conta Ludemir. Neste mesmo dia será feita uma homenagem ao centenário do líder negro Abdias do Nascimento, já falecido. Como a quarta-feira também é o Dia Mundial do Hip Hop, o evento terminará com uma festa.

Na quinta-feira, Heloisa Pires fará um relato de contos e de histórias de origem africana às 8h, na Flupp Parque. O povo indígena também terá espaço no encontro, com Ailton Krenak, Edson Kayapó e Graça Graúna, às 18h. A periferia ganha espaço, sexta-feira, na mesa ‘Clandestinos da Palavra’, com autores das cenas locais, na Tenda Quilombola.

Sábado, destaque para a mesa ‘Faça um rabisco que eu corro o risco’, em que a dançarina Luciane Ramos, e dançarinos da companhia ‘Na Batalha’ mostrarão as influencias africanas sobre o corpo da juventude da periferia. Domingo, Shows da rapper Toni Blackman e do ‘Batuque favela’ fecham o evento às 21h.

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