Por nicolas.satriano

Rio - Ser mãe é padecer no paraíso. Que o digam Janaina Novaes, 51, e Fabiana Monteiro, 37. As duas são ‘guardiãs de anjos’, como se denominam. Moradoras do Chapéu Mangueira e Babilônia, fazem parte de um grupo de 30 mulheres das favelas que têm filhos deficientes, mas não constam em pesquisas.

Da esquerda para a direita%3A Larissa%2C Fabiana%2C Hygor%2C Janaína e NiltonPaulo Araújo / Agência O Dia

“Tudo aqui é mais dificil. Até já mandaram eu deixar ‘meu monstro trancado em casa’”, conta Janaina. A fala cruel de um vizinho é só um dos empecilhos que a mãe de Hygor (25) e Nilton (6), ambos com deficiência intelectual, enfrenta. Há três anos, fundou a ONG ‘Anjos Especiais’ com o objetivo de incluir portadores de necessidades especiais numa sociedade exclusória.

“Ninguém os chama para festinhas ou sair. Por isso nos organizamos para levá-los ao teatro, circo e museu.” Como presente do Dia das Mães, uma fixação: assistir a show de Jorge Aragão. “É o sonho deles”.

Negro, jovem e vivo

Com 61,4% de sua população formada por pretos e pardos, a Maré recebe hoje a campanha ‘Negro, Jovem e Vivo’, parceria da Anistia Internacional com a Redes da Maré e o Observatório de Favelas, que atuam na região. O objetivo é chamar a atenção para o alto índice de assassinatos que acontecem no Brasil e atingem, em sua maioria, os jovens negros.

Cultura da morte

Pesquisa da Anistia mostra que 77% dos jovens assassinados no Brasil em 2014, entre 15 e 29 anos, são pretos e pardos. “Precisamos desnaturalizar as mortes e quebrar a cultura em que a morte de um menino negro na favela parece ser o desfecho esperado de uma trajetória”, conta Édson Diniz, diretor da Redes da Maré.

Arte como atração

Com um manifesto em que convida a sociedade a debater o tema, diversas ações acontecerão no complexo. A Escola Livre de Dança se apresenta na Feira da Teixeira, com dançarinos do Passinho da Rua C. No Centro de Artes da Maré haverá uma roda de conversa com Binho Cultura e Dudu de Morro Agudo, além da performance do grupo Los Chivitos.

Ignorância escolar

O preconceito que elas sentem não acontece apenas por parte dos moradores da favela. Fabiana, mãe de Larissa, 20, já sofreu várias situações constrangedoras dentro da escola da filha. “A professora me questionou por que eu deixava minha filha menstruar, se eu a queria grávida. Eu disse que é porque ela tem mãe. Eu que a limpo. Por que a intromissão?”

Luta por igualdade

A experiência de ter criado Hygor fez com que Janaina pesquisasse seus direitos. “Nilton frequenta escola regular, tem uma cuidadora para ele na sala.” Mas nem sempre foi assim: Janaina não conseguiu matricular Hygor na mesma unidade há 10 anos — nem Fabiana. “A diretora disse que eu queria bagunçar com tudo colocando uma menina especial lá.”

Óculos da filha é o presente para a mãe

Fabiana tem mais três filhos, mas o presente de Dia das Mães que tem tirado o seu sono é para Larissa. “Ela tem down, e eu vejo que ela quer ver TV e não consegue, aperta os olhos e se inclina de lado. Queria que minha filha pudesse sentar para assistir à novela com a família.” O seu maior medo é o mesmo de Janaina: morrer antes dos filhos. “Eu tenho muito medo de faltar e não cuidarem deles, principalmente do Hygor, que não vai sozinho ao banheiro. Prefiro sofrer com a perda do meu filho do que deixá-lo abandonado.”

Agenda

BIKE NO TURANO
Modalidade olímpica, o Cross Country invade amanhã o Morro do Turano, no Rio Comprido, a partir das 11h, pelo Circuito estadual de Mountain Bike de Favelas. Entrada franca.

TEATRO NA CHACRINHA
A peça ‘A Hora do Povo ou a Boca do Céu’, com diversas indicações ao Prêmio Zilka Salaberry, estará em cartaz amanhã, na Arena Chacrinha, em Pedra de Guaratiba.

DIÁLOGOS SOBRE JONGO
O jongo, tradicional ritmo africano, entrará em debate nesta quinta-feira, na Arena Carioca Dicró, a partir das 18h. Parque Ary Barroso, Penha. Entrada pela Rua Flora Lobo.

BLACK SANTA NO PRAZERES
Neste sábado, o Morro dos Prazeres receberá sua tradicional festa black, que reúne muita gente bonita e música boa a partir das 22h na Praça Doce Mel. Entrada gratuita.

AS FAVELAS DO RIO vão ganhar versões do Viradão Cultural em julho e agosto. O projeto Favela Criativa, da Secretaria Estadual de Cultura, abriu as inscrições para selecionar grupos e atividades culturais para atuar na Rocinha, Alemão, Cidade de Deus e Manguinhos, entre outras.

Com Tássia di Carvalho

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