Por felipe.martins

Rio - A defesa da descriminalização do uso de drogas chegou à Prefeitura do Rio. Eleito como vice na chapa de Eduardo Paes (PMDB) em 2012, Adílson Pires (PT), que também comanda a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social, pediu que o usuário deixe de ser tratado pela ótica da segurança para ser visto como um dependente, que precisa de ajuda médica.

“Visitei Portugal, que tem a legislação mais avançada da Europa, e fiquei impressionado com os resultados”, conta Adílson, num discurso parecido com o do secretário estadual de Segurança, José Mariano Beltrame.

“Eles passaram anos reprimindo uma espécie de cracolândia que existia no Centro de Lisboa, onde usavam heroína, sem no entanto terem sucesso. Só conseguiram resultados quando passaram a usar a política de redução de danos.”

Adílson Pires durante o seminário ‘Alemão%2C Saídas para a Crise’ promovido pelo DIA%2C Cesec e Iser em abrilFernando Souza / Agência O Dia

Segundo Adílson, que também citou a mudança na legislação americana sobre consumo de maconha, mandar para a prisão jovens olheiros do tráfico, por exemplo, alimenta a indústria da droga. “Entendo a pessoa que seja contra, mas é necessário ver os números. Portugal teve grandes avanços, e a sociedade precisa entrar neste debate.”

Através da secretaria que comanda, o vice-prefeito incentiva as discussões, via parceria com a ONG Viva Rio. Na parede de seu gabinete, as fotos com Lula, Dilma e Benedita da Silva mostram o orgulho de ter ajudado a fundar o PT. Talvez por isso, neste momento de crise política, ele tenha decidido voltar a hastear bandeiras históricas do partido. “A classe política brasileira vive um momento difícil, está desacreditada. Há um conjunto de fatores que leva as pessoas a desacreditar”, afirma. “A legislação portuguesa usa a quantidade de droga como determinante para a pena. Mesmo aqueles que são considerados pequenos traficantes não vão presos: cumprem medidas socioeducativas.”

Elogios a Fernando Henrique Cardoso pela ‘coragem’

A defesa da descriminalização do uso de drogas uniu PT e PSDB. Na entrevista, o vice-prefeito elogiou a coragem do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, única voz no meio político atual a apostar na mudança de foco da questão para a área de saúde.

“No Brasil, infelizmente, a figura pública mais importante que lida com este tema é o presidente Fernando Henrique Cardoso, pessoa com quem tenho profundas diferenças ideológicas”, diz. “Sou obrigado a admitir que ele tem tratado disso com muita coragem.”

Adílson volta a citar o caso da cracolândia de Lisboa para reforçar a urgência do debate na sociedade. Segundo ele, eram mais de 500 usuários de heroína, que foram cadastrados pelo programa e passaram a ser acompanhados pelos serviços de saúde, na tentativa de se livrarem do vício. Muitos estão conseguindo: “Temos de nos atualizar sobre isso.”


Críticas à redução da maioridade

A ligação entre drogas e menores também foi abordada. Adílson usa um estudo com adolescentes ligados ao tráfico, de Jaílson Souza Silva, do Observatório de Favelas, para reforçar sua tese — trocar o foco de segurança para a saúde.

“A pesquisa mostra que, se um garoto exercesse uma atividade para receber salário parecido, optaria por este novo trabalho. Muitos estão vendo os colegas sendo mortos, presos. Não é atrativo.” A aprovação da redução da maioridade penal, após segunda votação polêmica pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha, é uma “cortina de fumaça”, na sua opinião. “Como dizem que 80% da população apoia, tem muito político que se diz a favor para ter votos”, afirma. Para ele o Estatuto da Criança e do Adolescente, que fez 25 anos, veio justamente para criar uma legislação específica a menores.

“Antes, o juiz determinava a pena do menor infrator. O ECA veio regular isso. Seu objetivo é ressocializar o menor, não puni-lo. Os governos precisam dar prioridades para cumprir a legislação,que é boa.”

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