Por thiago.antunes

Rio - Moradora de Belford Roxo, na Baixada Fluminense, a doméstica Ana Paula da Cruz, de 34 anos, estudou até o sétimo ano do Ensino Fundamental. Deixou os estudos de lado para ajudar sua mãe. “Na minha casa éramos seis irmãos e não tinha como ela sustentar todo mundo. Comecei a trabalhar com 13 anos e não pude mais parar para estudar”, disse.

Ana Paula é uma das milhares de pessoas do estado que abandonaram as salas de aula antes de completar ao menos o Ensino Fundamental, seja por ter que entrar no mercado de trabalho ou qualquer outro motivo. Muitas delas não voltam a frequentar a escola, mas não devido à falta de vagas.
Um estudo inédito da Fundação Centro Estadual de Estatísticas, Pesquisas e Formação de Servidores Públicos do Rio de Janeiro (Ceperj), obtido com exclusividade pelo DIA, aponta que, em todo o estado, 589.959 vagas de Ensino de Jovens e Adultos (EJA) estão ociosas.

Público-alvo do Ensino de Jovens e Adultos são pessoas como a doméstica Ana Paula%2C de 34 anos%2C que parou de estudar aos 13 para trabalharDaniel Castelo Branco / Agência O Dia

Apesar disso, existem 3,6 milhões de pessoas que não têm o Ensino Fundamental ou o Ensino Médio completo e que poderiam estar frequentando estas turmas para aumentar a sua escolaridade. Destas, 187,19 mil são analfabetas — 2,46% da população economicamente ativa acima de 15 anos. O estudo mostra ainda que houve uma queda no número de matrículas no EJA. Em apenas três anos, entre 2010 e 2013, houve 150.368 matrículas a menos, uma redução de 35,19%.

Para o coordenador de Políticas Públicas Sociais da Ceperj, Fábio Gomes, a baixa procura pelas vagas deve-se ao fato de a baixa escolaridade não ser motivo para a inserção no mercado de trabalho em muitos municípios. “Acreditamos que a queda nas matrículas tem a ver com o fato de o ensino de jovens e adultos ser uma escolha de cada um. As pessoas podem já estar empregadas, e, no fim do dia, podem estar desgastadas. Isso exige uma determinação por parte de quem quer aprender”, explicou.

Ele aponta ainda o gasto extra com transporte e alimentação e o desconhecimento dessa oferta de vagas. “Tem que haver uma melhor divulgação”, completou. O estudo revela as 10 cidades com maior demanda por EJA. Dessas, cinco estão na Região Serrana — Sumidouro, Bom Jardim, São José do Vale do Rio Preto, Duas Barras e Trajano de Moraes. Com mil habitantes, Sumidouro apresenta a maior demanda: 83,81%.

Dos 14,9 mil habitantes registrados pelo Censo de 2010 do IBGE, quase metade (7.099) era de analfabetos ou pessoas sem Ensino Fundamental ou Médio completo. “O principal indício de que para esta demanda é de que grande parte da população vem da produção agrícola e a renda está concentrada na economia familiar”, ressalta Gomes.

Demanda menor, mais matrículas

Apesar de ser a menos demandante de EJA, a Região Metropolitana responde por 64% das matrículas efetuadas, principalmente nas cidades de Duque de Caxias, Nova Iguaçu, Rio de Janeiro e São Gonçalo, contra 5,48% na Serra, a mais demandante. Niterói possui a menor demanda (25%). São 62.614 pessoas sem instrução ou com Ensino Médio incompleto. Em seguida, vêm Rio de Janeiro, Nilópolis, Mesquita e São Gonçalo.

Para Fábio Gomes, do Ceperj, o aspecto principal é a não obrigatoriedade de matrículas dessas pessoas, já que elas se inscrevem quando convém ou quando os custos estão dentro de suas possibilidades. “A redistribuição das vagas ociosas por municípios que têm maior demanda não é uma opção relevante. Seria se não houvesse vagas ociosas em algum deles”, explicou.

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Outro problema, de acordo com ele, é a evasão escolar. “As pessoas não precisam terminar os estudos. Isso faz com que, a cada dificuldade, seja por questão econômica, de tempo ou de desgaste, eles abandonem a sala de aula”. Segundo ele, uma alternativa para elevar a participação na Educação de Jovens e Adultos no estado é focar mais no ensino semi-presencial. “O governo está investindo para atrair pessoas que não podem estudar presencialmente”, afirma.

Para o estado, falta interesse de candidatos

Para o estado, o que falta para aumentar as matrículas não é falta de divulgação, mas de vontade do próprio candidato. “Temos faixas em diversas escolas divulgando a educação para jovens e adultos. Quando a pessoa quer, corre atrás do seu objetivo”, afirmou a coordenadora de EJA na Secretaria de Estado de Educação, Rosana Mendes.

Para ela, o modelo presencial predomina (71%) porque o ensino semi­presencial traz uma dificuldade grande aos alunos. “A pessoa precisa aprender a aprender sozinha, mas muitas das vezes não entende o que lê. O desafio é grande”, disse.

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