Por thiago.antunes

Rio - ‘Vestiu uma camisa listrada e saiu por aí... Em vez de tomar chá com torrada, ele tomou Paraty”. Na música de Assis Valente, popularizada na voz de Carmem Miranda, a cidade já era cantada como sinônimo de cachaça. Afinal, desde os tempos do Brasil Colônia, ali já se produzia a melhor pinga do país. Para manter a boa fama e celebrar a tradição, a cidade abre nesta quinta-feira a 32ª edição do Festival da Cachaça, Cultura & Sabores. O evento, tão importante no calendário local quanto a Flip — Feira Literária Internacional de Paraty, promete atrair 40 mil pessoas até domingo e lotar hotéis e pousadas em um período de baixa temporada.

A produção artesanal da bebida ocupou o vácuo deixado na economia local quando o ciclo do ouro chegou ao fim, no final do Século 18. Hoje, a terra da cachaça investe cada vez mais na melhoria do produto. E ganhou ainda mais força com o selo de Indicação Geográfica de Procedência (IG), fornecido a partir de 2008 pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI). “A certificação ajudou a dar maior credibilidade e visibilidade à nossa cachaça, e trouxe uma valorização do produto, em torno de 30% a 40%”, conta Lúcio Gama Freire, presidente da Associação dos Produtores e amigos da Cachaça Artesanal de Paraty (Apacap).

Alambique da Cachaça Coqueiro%2C a mais antiga de Paraty%3A desde 1803%2C o negócio passa de geração em geração Divulgação

A atividade, que envolve seis alambiques — entre os quais, o do próprio prefeito da cidade, Carlos José Gama Miranda, o Casé — já é responsável por uma fatia importante da economia local. A produção gira em torno de 350 mil litros por ano e cerca de 70% são comercializados em bares, restaurantes e lojas do centro histórico, e nos próprios alambiques, que se tornaram pontos turísticos, abertos a visitantes o ano inteiro.

O restante é vendido basicamente para Rio e São Paulo, além de rodar o mundo pelas mãos dos turistas estrangeiros que visitam a cidade. “Cada alambique emprega de 12 a 15 funcionários com carteira assinada, fora os empregos temporários na colheita da cana-de-açúcar durante a safra e dos empregos indiretos na cadeia produtiva, que inclui cachaçarias e agências de turismo”, conta o empresário.

Engenheiro civil de 42 anos, Freire é o mais novo produtor da cidade. Em 2009, decidiu retomar um antigo negócio da família e recriou a Cachaça Pedra Branca. Antes, trabalhara com os primos — entre eles, o atual prefeito — na Paratiana, fundada em 1999. “Hoje a cachaça de Paraty é produzida em pequena escala, visando à qualidade. Todos os alambiques são certificados pelo Inmetro e têm padrão de produção controlada. Aumentar a produção é importante, mas sempre dentro de normas que preservem a qualidade do produto”, diz ele.

Formato de feira de negócios

Nesta edição, o festival ganha um novo formato, com cara de evento de negócios, e vai receber exposição de produtores de equipamentos para alambiques e engenhos. A programação conta ainda com área para palestras, oficinas e cursos de drinques e pratos criados a partir da cachaça, com consultores do Sebrae-RJ.

“Queremos valorizar o produto e a cultura locais. Todos os 13 restaurantes participantes têm chefs de Paraty e 90% dos artistas que se apresentam nos shows são daqui”, conta o presidente da Apacap. Na abertura hoje será apresentado o projeto Caminho do Ouro, Cachaça e Gastronomia, que integra as atividades mais importantes para o turismo na cidade. A iniciativa é resultado da parceria entre Apacap, Pólo Gastronômico, prefeitura e associações de turismo.

Lei Seca evita consumo excessivo

Pode parecer ironia, mas restringir o consumo excessivo de álcool no festival é uma das maiores preocupações dos organizadores. Para isso, será montada, pelo segundo ano consecutivo, uma operação Lei Seca da PM. Agentes da Polícia Rodoviária Federal (PRF) também estarão mobilizados, inclusive com bafômetros.

Conforme ajustado com juízes e promotores, a partir das 22h ficará proibida a venda de garrafas e a cachaça só pode ser servida em pequenas doses, nos restaurantes e nos 15 quiosques no centro histórico. O Conselho Tutelar também estará atento, para evitar o consumo de bebida por menores.
“Antes o festival era visto como evento da bebedeira. Muitas pessoas que vinham até perdiam o controle”, disse o secretário de Turismo, Vladimir Santander. Por garantia, será montada uma tenda de hidratação para os primeiros atendimentos e o hospital se prepara para receber frequentadores que se excederem.

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