Rio - Chega de esperar por São Pedro. Para o Ministério Público Federal (MPF), os governos devem urgentemente assumir a crise da água e decretar estado de calamidade hídrica, que pode prever, entre outras medidas, o racionamento.
“Há uma crise instalada em São Paulo, se espalhando pelo Norte e Noroeste do Estado do Rio. Pelo menos nessas áreas, o poder público precisa convocar a população a se engajar em medidas para economizar água, mesmo não sendo ela a responsável pelo problema. Mas estão esperando literalmente a solução cair do céu”, disse o procurador da República em Campos dos Goytacazes, Eduardo Santos de Oliveira.
Ele é autor da ação civil pública contra a transposição do Rio Paraíba do Sul e pela criação de um plano nacional de emergências para crises hídricas. A ação está no gabinete do ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Oliveira lembrou que, devido à seca do Paraíba do Sul e seus afluentes, que atinge seu nível mais baixo em 80 anos, já existe mortandade de animais e pescadores e pequenos agricultores amargam sérios prejuízos no Norte do estado, onde o rio deságua.
A cidade de São Fidélis decretou estado de emergência — dependendo ainda do reconhecimento do governo federal — e outros municípios estudam tomar a mesma medida, como São Francisco do Itabapoana. Moradores da região já sofrem com a falta d’água, especialmente em São João da Barra, na foz do Paraíba, onde a prefeitura está tendo que contratar carros pipa para abastecer escolas e postos de saúde porque o mar invadiu o rio e a água chega salinizada às torneiras.
Em Campos, de acordo com o procurador, problemas com abastecimento estariam sendo mascarados. “Já questionei a concessionária (Águas do Paraíba) por realizar racionamento não declarado, interrompendo o fornecimento por até dois dias, alegando questões técnicas e de limpeza.”
Para Oliveira, não basta tomar “medidas paliativas e desesperadas”, como reduzir a vazão do Paraíba do Sul, oferecer carros pipa ou “abrir poços artesianos sem planejamento, causando prejuízo à saude humana”. É preciso tomar medidas como limpeza e desassoreamento dos rios, saneamento básico e ativação do cadastro técnico federal de atividades poluidoras. Tudo isso não resolve a situação agora, mas vai ajudar a enfrentar o problema ano que vem, já que o quadro só tende a piorar.
“O poder público chegou a uma encruzilhada. Todo mundo está rezando para chover, mas deixou a situação se agravar demais. O problema é tão crítico que se chover uma ou duas semanas não vai resolver. E a população tem que ser alertada”, disse.
Nesta quarta-feira o MPF lançou em Campos a campanha nacional “No Fluxo da Vida, Cada Gota Conta”, para conscientizar sobre a preservação dos recursos hídricos. Houve ações na Escola Pequeno Jornaleiro e blitzen educativas na BR-101 e dentro da cidade, com apoio das polícias Rodoviária Federal e Militar e Guarda Municipal. A ideia é levar a iniciativa na próxima terça-feira a São João da Barra e, ainda em novembro, a São Fidélis e ao Rio.
Os mais de 180 municípios que integram a Bacia do Paraíba do Sul nos estados do Rio, São Paulo e Minas Gerais também serão oficiados sobre a campanha. “Queremos ainda receber dados sobre o saneamento básico nestas cidades”, disse o procurador.
Rio descarta limitar uso
O secretário de Estado do Ambiente, Carlos Portinho, descartou a possibilidade de racionamento e disse que o Rio estuda outras alternativas para minimizar o problema da seca. “Nós estamos fazendo o nosso trabalho sem, no momento, pensar em racionamento, pois ainda temos um certo conforto”, disse. Entre as soluções, estão a captação de água melhorada nos lençóis freáticos e a reformulação em tubulações nas cidades abastecidas, tornando o sistema mais econômico.
“É hora de começar a pensar em outras alternativas. A dessanilização da água ainda é um processo encarecido, mas, no futuro, pode se tornar mais viável”, admitiu. Em encontro para discutir a situação do Paraíba do Sul ontem, na sede da Sociedade dos Engenheiros e Arquitetos do Estado (Seaerj), Portinho disse que entre os projetos no plano de ação do governo estadual está a dragagem para melhorar o fluxo de água de São João da Barra, afim de minimizar o problema da língua salina.
De acordo com o Comitê de integração da Bacia do Rio Paraiba do Sul (Ceivap), outras cidades que estão sofrendo com a estiagem são Barra do Piraí, Três Rios, Paraíba do Sul, Cardoso Moreira e São Francisco do Itabapoana. “Se não chover, nós teremos água apenas para os próximos nove meses”, disse Vera Lúcia Teixeira, vice-presidente do Ceivap.
Colaborou Vinicius Amparo