Rio - A crise provocada pela Operação Lava Jato e a queda no preço do barril de petróleo atinge em cheio Macaé, cidade do Norte Fluminense que já foi considerada a “capital nacional do petróleo”. Depois das prostitutas e dos moradores de rua, até cães de raça sentem na pele os efeitos da retração econômica do município. Há cerca de 10 anos a socióloga Maria de Fátima Cardoso, de 59, largou a profissão para cuidar dos animais que vivem nas ruas da cidade. Segundo ela, que faz parte da ONG Pró Animal, o número de cães abandonados cresceu este ano em relação aos anteriores..
“Calculamos este aumento em 80%. São cerca de 100 animais encontrados pelas ruas toda semana. Notamos que muitos foram comprados por pessoas que vieram trabalhar na indústria do petróleo. Muitos que são demitidos deixam seus animaizinhos pelas ruas”, disse. O único abrigo da cidade, o Casa dos Anjos, está lotado, com 40 cães e 80 gatos. Moradores se reuniram para promover uma feira de adoção de animais hoje. “A gente recolhe os que estiverem pelas ruas, castra, cuida, mas os devolve para as ruas porque não há espaço para eles ficarem. É perigoso principalmente para os de raça, porque não estão acostumados a viver nas vias. Queremos uma ajuda dos órgãos públicos”, pediu. A prefeitura estuda abrir um abrigo público para animais abandonados.
As demissões de empresas prestadoras de serviços da Petrobras vêm acontecendo aos poucos, numa ação silenciosa que já ganhou o apelido de Operação Bendine’ (em referência ao novo presidente da Petrobras, Ademir Bendine). Os 30 ônibus fretados de Campos dos Goytacazes para Macaé pela Petrobras junto à empresa 1001 dão o tom da crise. Antes, abarrotados de trabalhadores, hoje muitos podem ser vistos vazios. “Caiu de 30% a 40% a quantidade de pessoas nos coletivos”, disse um motorista, que preferiu não se identificar. “Notamos essa queda diariamente. As demissões são a conta-gotas, para não causarem alarde na imprensa”, ressaltou um funcionário da Petrobras.
No entanto, há duas semanas, 786 funcionários da Bozzano Simonsen Montreal (BSM) foram mandados embora em um único dia. O caso colocou à mostra os efeitos na cidade da crise pela qual atravessa a Petrobras. A BSM Engenharia teria demitido seus trabalhadores para entrar com pedido de falência. A empresa alegou que as demissões se devem a “dificuldades intransponíveis no âmbito de seu relacionamento comercial com a Petrobras”. No próximo dia 16 será dada baixa na carteira de trabalho e feita a rescisão de contrato.
Emprego cai, violência cresce e empresa aérea deixa cidade
As oportunidades de emprego também diminuíram drasticamente. Enquanto no auge da exploração do petróleo a Agência de Trabalho, Educação Profissional e Renda (Agetrab) — órgão da prefeitura — oferecia mais de mil empregos semanais, nos últimos sete dias, 463 vagas de emprego foram disponibilizadas.
O freio nos investimentos e a queda nas atividades desde que o preço mundial do barril do petróleo despencou e as investigações da Operação Lava Jato avançaram fizeram com que Macaé se tornasse um local de incertezas e falta de perspectiva. Quem passeia pela cidade pode observar dezenas de mendigos pelas ruas.
Como consequência, alguns índices de violência aumentaram. Dono de um estacionamento no Centro, Bruno Vieira, 38 anos, relatou que quase todos da sua família tiveram o celular roubado esse ano. “O pior caso foi com a mãe da minha sobrinha. Ela falava ao telefone enquanto o criminoso anunciou o assalto e levou o aparelho. A pessoa que estava do outro lado da linha ficou desesperada”, afirmou ele, acrescentando que sua casa foi roubada pela primeira vez em 19 anos que vive em Macaé. “Arrombaram a porta e levaram minhas duas televisões”, contou.
Números do Instituto de Segurança Pública (ISP) apontam esse aumento da violência, pricipalmente quanto ao roubo de celular. Enquanto de janeiro e junho de 2014 houve 14 crimes desse tipo, no mesmo período desse ano atingiu 72 casos.
A companhia aérea Azul, única em Macaé, vai parar de operar a partir do dia 2. Segundo a empresa, o motivo seria a falta de estrutura do aeroporto para receber aviões ATR 72, com capacidade para 70 passageiros, que vão substituir os do modelo ATR 42, com capacidade para transportar até 48 passageiros, que atendem hoje à cidade. Passagens com destino ou saída de Macaé deixaram de ser vendidas no dia 14. A Azul opera em Macaé desde 2008, e segundo dados da empresa, a taxa de ocupação é de 85% por voo.
Negociação para manter voo comercial
Para garantir a manutenção dos voos comerciais no aeroporto até o início das obras de recuperação da pista de pouso e decolagem, previstas para janeiro de 2016, a prefeitura está se mobilizando para fechar contrato com outras duas empresas aéreas que atuam em rotas de aeroportos regionais no país. “As empresas se interessaram muito pelo projeto”, afirma Vandré Guimarães, secretário municipal de Desenvolvimento Econômico e Tecnológico. Um documento assinado pelo prefeito Aluizio dos Santos Júnior, o Dr. Aluízio, destaca o registro de viabilidade técnica para a atuação das novas companhias aéreas na região.
Aposta no turismo para criar emprego
Apesar de 80% da economia de Macaé ser baseada na cadeia de óleo e gás, a prefeitura busca diversificar as fontes de renda diante da decadência do setor. Para o secretário Vandré Guimarães, investir no turismo é garantia de gerar emprego. “O valor agregado é menor, o salário é menor, mas a pessoa consegue dar dignidade à família. Precisamos realocar no mercado de trabalho muitos desses terceirizados que trabalhavam na Petrobras”.
Segundo ele, durante 40 anos, Macaé foi colônia de exploração da atividade petroleira e viveu dessa indústria. “O município, por exemplo, não tem receptivo turístico. Estamos capacitando mão de obra e melhorando a infraestrutura para o turismo”, destaca. A principal aposta é na atraente serra de Macaé. “O Sana está entre os dez destinos de inverno mais procurados no Rio. Além de sinalização turística, o distrito ganhará uma turma de instrutores de ecotrilha”, anuncia.