Rio - A decapitação do rei Luiz XVI em 1792 deveria ser o marco da Revolução Francesa. O regicídio foi o evento mais marcante daquele período. Mas o marco é a Tomada da Bastilha, em 14 de julho de 1789, masmorra onde o rei e seus juízes amontoavam os inimigos do regime.
Na Inglaterra, em 13 de fevereiro de 1689, o rei Guilherme de Orange assinara a Declaração dos Direitos, um dos mais importantes documentos políticos modernos. Voltou da Holanda para ser coroado num barco com o filósofo John Locke, que o aconselhava a não se colocar acima das circunstâncias e aceitar que era rei por vontade dos seus súditos, que lhe poderiam destronar ou cortar sua cabeça, como fizeram em 1649 com seu avô, o rei Carlos I.
Antes da Revolução Francesa de 1789, a Revolução Gloriosa inglesa de 1688 retirara a soberania do trono e instituíra a soberania popular. Não foi com reverência ao poder e aos poderosos que ocorreram as mudanças na história. Foram os conflitos, as desobediências e as tensões que forçaram as classes dominantes a reconhecer os direitos do povo.
Depois da Declaração dos Direitos de 1689, os soberanos tiveram que dividir o poder com o Parlamento, reconhecer o direito dos nobres perante o trono e assegurar os direitos dos homens comuns.
No Brasil, desde as ‘Jornadas de Junho’ de 2013, o povo tem estado na rua. Às vezes, por manipulações midiáticas, equivocadamente defendendo interesses contrários aos seus. Até juízes têm se manifestado politicamente e em homenagem ao juiz Sérgio Moro, às vezes inadequadamente vestindo toga.
Em data recente, o jornalista Elio Gaspari escreveu que “os hierarcas de Brasília costuravam as fantasias de palhaço para quem fosse às ruas festejar o juiz Moro”. Por todo o país magistrados vestiram togas e se manifestaram em homenagem ao juiz Sérgio Moro. Algumas manifestações ocorreram em logradouros públicos e outras dentro de prédios do Poder Judiciário.
Não sei se o jornalista comparou os magistrados que vestiram toga para homenagear o juiz Sérgio Moro com profissionais circenses ou se houve comparação das vestes talares com as vestimentas dos palhaços. Mas magistrados não são palhaços. Magistratura é contrapoder na garantia dos direitos dos cidadãos perante os poderosos e arbítrio do Estado, mesmo que sob riscos.
João Batista Damasceno é doutor em Ciência Política e juiz de Direito