Luís Pimentel, colunista do DIA - Divulgação
Luís Pimentel, colunista do DIADivulgação
Por Luís Pimentel Jornalista e escritor

Rio - "Do mal será queimada a semente..." (Juízo final, Nelson Cavaquinho e Élcio Soares).

O mal é filho do mal. E neto do mal também. Há muitas gerações o mal, que não é do bem, só faz maldades. Até porque precisa justificar a sua fama de "mau" que odeia tudo o que é "bom".

O mal tem sangue nos olhos, traz a faca nos dentes. Não remove, apenas soterra montanhas, enche rios de lama, transforma peixes que são vida e alimento em borra, veneno, cimento. Espinhas secas e mortas, margens e imagens tortas. Não bate na porta. Chuta, explode, arromba. Um corpo amarrado às sondas, um sonho que vira fumaça.

O mal veste corpos de sabres (última moda no desfile macabro do insano e do descalabro) e escombros. A carne do mal se autodevora, levando com ela, males afora, o que um dia foi humano. É suor que não transpira. Quando o coração se esconde é o mal que bate no peito sem parar.

O mal foi gerado nas entranhas da besta. Herdeiro do obscurantismo, da iniquidade, do desespero. Não sente remorso pela mãe que chora com raiva, pelo pai que chora de vergonha, pelo filho que chora de medo.

O mal é homem (bomba?); não chora.

O mal é a fome, mas não tem coragem de dizer este nome. O chão em que ele pisa arde, pois o mal é, antes de tudo, covarde.

O mal é a doença sem remédio, sem hospital, sem assistência. É a ignorância sem escola, sem futuro, sem esperança. O gemido da criança. O amor morrendo de tédio. O mal é o medo que acordou mais cedo para mais cedo o medo espalhar. Não tem hora nem lugar, te encontra nos becos ou nas esquinas.

O mal é carnificina.

No princípio era o bem. Era a terra em que se plantava e dava, a luz germinava, o sol aquecia sem queimar. O mal invade o lugar, faz o belo de refém, leva no embornal a coragem do homem, a vontade do homem, as certezas do homem, o sorriso da menina.

O mal diz 'não me reprima'. Não conhece fronteiras, não pede licença. O mal não nos deixa mais passear no parque, mergulhar na arte, esquecer da vida. O mal nos lembra, a todo instante, que é preciso estar alerta, que o beijo pode ser uma despedida.

O mal é raso, mas fere fundo. É estertor. Prega que "tudo agora mesmo pode estar por um segundo", como o poeta cantou. Desde 'O coração das trevas', é o horror, o horror, horror.

O mal não dá um aconchego, não diz "durma que isto passa". Grita, esbraveja, ameaça, serve cálices de terror. O mal não cultiva a graça, o afeto, uma flor.

E o bem o tempo levou.

É importante dizer: Não temos medo! Mas temos, sim, pois o mal age em segredo.

Luís Pimentel é jornalista e escritor

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