Por tabata.uchoa
Alberto Loures da Costa tem 80 anos, é advogado e trabalha todos os dias no escritórioMaíra Coelho / Agência O Dia

Rio - Quem assistiu às primeiras aparições televisivas do governador interino do Rio, Francisco Dornelles (PP), percebeu que havia ali um senhor cuja idade é facilmente denunciada pela cabeça calva, a fala lenta e os movimentos escassos. O político de 81 anos, com longa carreira pública, é apenas um dos muitos idosos brasileiros que, depois de oito décadas de vida, mantêm uma rotina de trabalho ativa. 

Para se manter saudável e conseguir enfrentar a intensa agenda do cargo, Dornelles faz exercícios duas vezes por semana, como contou em entrevista exclusiva ao DIA. Entre as atividades estão natação e caminhada, no Jockey Club da Gávea, e pilates, no Country Club, em Ipanema. Contudo, ele lamenta que, mesmo com os exercícios, o tempo vem minando a resistência. “Caminho 20 minutos e já fico com a língua de fora.” A falta de disciplina com a dieta é outra queixa: “como demais, como o que não devo.”

Assim como o governador, outros octogenários que estão com a corda toda mantêm rotina de exercícios. Pelas ruas de Bom Jesus do Itabapoana, no Norte Fluminense, a cerca de 330 quilômetros da capital do estado, um senhor com a cabeça bem preenchida pelos cabelos brancos transita diariamente de bicicleta. Para Wilson José Carrerette, 80 anos, o exercício não representa uma mera atividade física, mas um meio de transporte que o leva até a rede de lojas pela qual é responsável. “Não gosto muito de carro”, explica o homem que chegou à cidade interiorana em 1962, mesmo ano em que começou a trabalhar no estabelecimento que administra até hoje.

Todos os dias, às 7h30, Carrerette chega ao local de trabalho. Só sai de lá 12 horas depois, às 19h30, com intervalo apenas para o almoço. O horário impressiona ainda mais quando o idoso conta que, antes de tudo, ainda arruma tempo para passar na igreja e receber a bênção diária. Cansaço? “É bom, faz dormir bem. Chego em casa, leio o jornal, rezo meu terço e vou dormir cedo”, comenta.

A loja de Carrerette, em Bom Jesus, recebeu a visita de Dornelles, há cerca de 30 anos, recorda o dono. Entretanto, a memória borrada pela passagem do tempo não ajuda a elucidar detalhes do encontro. Se lembra apenas de que o político pareceu ser “um bom sujeito, até que provem o contrário”. Mesmo assim, a impressão não significa confiança plena. “Não garanto nada, tenho me decepcionado muito ultimamente”. Quem também passou pela loja, em 2014, foi Luiz Fernando Pezão, em ano de campanha. O idoso do interior recorda que um de seus gerentes, curioso, fez ao governador um pedido inusitado, mas ao qual ele já deve estar habituado: mostrar os pés. “E eram grandes mesmo”, afirma Carrerette.

Nascido e criado próximo a Bom Jesus, na roça, Carrerette cultiva um forte laço com o trabalho e com os moradores do pequeno município de pouco mais de 35 mil habitantes. “Tem funcionários que beijam a minha mão, de tanto afeto criado ao longo dos anos.” A vida provinciana de Carrerette, com o trabalho, a família, os fregueses e um ‘aperitivo’ semanal — a cachaça — faz o idoso afirmar que é o homem mais feliz do mundo. “Pode ter alguém igualmente feliz, mas mais feliz é impossível”, diverte-se.

A inquietude profissional também norteia a vida de Alberto Loures da Costa, 85 anos, sócio de um escritório de advocacia no Centro do Rio. Morador de Copacabana, Loures acredita que o trabalho, principalmente o que envolve esforço intelectual, ajuda a manter a mente ativa. “É muito importante não parar de trabalhar, fazer exercício e ter uma alimentação saudável. Tenho colegas que pararam, e, em dois, três anos, ficaram inválidos. Vestir o pijama e ficar sem fazer nada é um suicídio”, diz o advogado, que pratica atividades físicas diariamente. Alongamento, musculação e caminhada na orla estão no dia a dia de Loures, que dedica a manhã ou a noite à saúde.

Wilson José Carrerette%2C 80 anos%2C vive com a esposa%2C Maria Cristina%2C em Bom Jesus do Itabapoana. Ele é dono de uma rede de lojasMaíra Coelho / Agência O Dia



Especialistas apontam benefícios

Segundo o geriatra Roberto Alves Lourenço, continuar trabalhando é importante para os idosos por estimular a atividade intelectual. As chances de doenças como demência e depressão aparecerem são menores para quem mantém a carreira profissional, explica Lourenço. Como principal elemento de prevenção à demência, está o funcionamento do cérebro, que, se ficar muito relaxado e ocioso, acaba apresentando mais chances de adquirir a doença. Para evitar a depressão, o que contribui é o grau de participação social de determinada atividade, seja ela profissional ou de saúde. O médico ressalta, porém, que o nível de esforço do trabalho deve estar de acordo com a capacidade da pessoa, sem que haja excessos e acabe tendo efeito contrário, como algo prejudicial.

A opinião da psicóloga Flávia Freitas segue a mesma linha. Ela explica que o idoso que pratica atividades mentais diariamente tem benefícios tais como a melhora da memória e o desenvolvimento do raciocínio. Além disso, Flavia destaca a relevância das atividades físicas e culturais. “Se for em grupo, melhor ainda, porque ajuda na socialização. Muitas vezes, eles ficam em isolamento, encostados, com um sentimento de impotência. Se acham um estorvo para a família”, conclui. A psicóloga observa que essa socialização evita um sentimento de exclusão. Com a idade, os idosos veem constantemente a morte de amigos, o que contribui para o isolamento mencionado pela psicóloga.

Governador em exercício no Rio%2C Dornelles dorme sete horas por noiteMaíra Coelho / Agência O Dia

Dornelles dorme sete horas por noite

Aos 81 anos, o governador interino do Rio costuma acordar entre 6h30 e 7h, e tem uma média de sete horas de sono por noite — não é, portanto, de dormir muito tarde. Dornelles diz que a cabeça está “mais ou menos”, mas o corpo começa a sentir o peso da idade.

“Em uma pessoa com 80 anos, a dor começa em um dedo, do dedo passa para o pé, do pé passa para a perna e por aí vai”, diz o político. O governador perdeu oito quilos nos últimos 18 meses. Perguntado sobre a possibilidade de emagrecer por causa da quantidade de trabalho e, possivelmente, de estresse que terá à frente do estado, ele diz que não se importa: o que o deixa preocupado de verdade é engordar.

Dornelles não é, contudo, o governador mais velho do Brasil. Ele fica atrás de Siqueira Campos, do Tocantins, que comanda o estado da região Norte aos 87 anos. Entretanto, o governador fluminense é o mais velho a assumir o estado desde a redemocratização do país.

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