Por lucas.cardoso
Secretário Jose Mariano Beltrame falou em audiência na Alerj sobre CPI do ato de Resistência.Daniel Castelo Branco / Agência O Dia

Rio  - O secretário de Segurança Pública do Rio, José Mariano Beltrame, defendeu nesta terça-feira, diante dos deputados que integram a CPI dos Autos de Resistência na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), uma mudança efetiva na política de combate às drogas no país. Beltrame mais uma vez se mostrou favorável a regulamentação do uso das substâncias hoje proibidas como tentativa de solução para a violência crescente, sobretudo nas grandes cidades como o Rio de Janeiro.

"O combate às drogas, hoje, é uma coisa irracional. O estado tem que se preparar para tratar o jovem (usuário). Descriminalizada (a droga) já é. É preciso regulamentar. Estive em Portugal para ver como funciona isso lá, e funciona maravilhosamente. É preciso tentar aqui", disse Beltrame aos deputados.

A simples regulamentação, no entanto, não seria a solução, segundo Beltrame. O secretário disse que o país precisa discutir segurança pública além dos limites da polícia. E voltou a criticar o estado brasileiro pela sua ineficiência no combate aos demais fatores que estimulam a violência. "Se guerra fosse solução, no Rio de Janeiro não haveria violência por tudo o que se fez aqui, principalmente na década de 70", relembrou.

Beltrame comparou a regulamentação das drogas ao Estatuto da Criança e do Adolescente, considerado não apenas por ele, mas por especialistas em segurança pública e educadores como uma conquista da sociedade brasileira que, no entanto, não é cumprida como deveria.

"O Estatuto é maravilhoso. O problema é que ele vira sempre questão de polícia. Eu não tenho problemas em vir aqui à Alerj abrir as vísceras da segurança pública. Mas a Assistência Social faz o mesmo? A Educação? Quanto é investido? A gente precisa discutir isso também", pontuou.

O secretário reclamou mais uma vez da morosidade do poder público em oferecer cidadania às classes menos favorecidas da população. "Sempre convivemos com discursos cínicos de prefeitos e governadores de que não podiam chegar nas comunidades para realizar os programas necessários. Agora podem. Na Providência, por exemplo, já podia. E nada foi feito. A situação (de violência) voltou. Entramos lá de novo. E agora o poder público já pode entrar novamente... tem comunidade onde começamos um trabalho em 2008 e ainda hoje tem esgoto correndo a céu aberto. Fica difícil", lamentou.

O relator da CPI, Marcelo Freixo (Psol), considerou positivas as declarações de Beltrame em relação à atual política de drogas adotada do Brasil. "A política de guerra às drogas é uma tragédia no mundo inteiro, não só no Brasil. É ineficaz e danosa para a sociedade. É importante ver que houve avanço pelo menos na leitura deste problema por parte dos agentes de segurança pública. O próprio comando da PM já fez declarações super positivas em relação às drogas. Mas esta é uma questão que precisa ser decidida em Brasília, apesar de ser discutidas nos estados e municípios", afirmou o deputado.

Na foto o Deputado Estadual%2C Paulo Ramos fazendo perguntas ao secretario de Segurança Pública do RioDaniel Castelo Branco / Agência O Dia

O deputado, no entanto, criticou o desconhecimento de Beltrame em áreas importantes da segurança pública que poderiam evitar o excesso de mortes provocadas pela Polícia Militar. O secretário reconheceu que houve aumento do número de autos de resistência nos últimos meses, mas lembrou que, se comparados com os de quando assumiu a secretaria, em 2007, a redução foi significativa, em torno de 50%. O número de vítimas de violência policial chegava a 1300. Atualmente, são cerca de 650.

"Existe uma distância muito grande entre o mundo em que o secretário vive, na secretaria, e o que acontece no dia a dia. Não dá para dizer que os números de hoje são aceitáveis porque um dia já foi pior. Duas pessoas são mortas por dia pela Polícia Militar. É preciso fazer um diagnóstico honesto para saber que políticas públicas adotar para resolver este problema", disse Freixo.

Práticas como o controle de munição utilizada pelos policiais, bem como o aumento do tempo do curso de formação, de sete para dez meses, foram elogiados por Freixo. Mas com importantes ressalvas. "Aumentar o tempo de formação é importante, mas é preciso estar atento à qualidade da formação. Os relatos feitos pelos próprios praças mostram que eles são treinados para a violência, para a letalidade. E quando uma autoridade fala que a polícia não vai entregar flores, nem água benta, isso é uma indicação para a tropa que já é violenta ser ainda mais violenta. Aí se confunde Justiça com vingança, e o resultado disso é uma tragédia", criticou.

A falta de controle do armamento utilizado pelos policiais nas operações com vítimas fatais também foi condenada por Freixo. "Ele diz que as armas utilizadas nas operações são entregues à perícia pelos comandantes de batalhões, mas na verdade estas armas nem sempre são entregues. Quando entregues, nem sempre são as utilizadas nas operações. Este é o relato dos próprios profissionais de perícia feito aqui à CPI", disse o deputado.

No fim da audiência, uma sugestão feita pelo deputado ­- e que será incluída no relatório final da CPI - foi muito bem aceita por Beltrame. Freixo cobrou que as imagens das câmeras instaladas nas viaturas sejam, obrigatoriamente, incluídas nos inquéritos.

"É inacreditável como isso ainda não ocorre, como as autoridades não têm acesso a estas imagens, que só vazam quando há alguma briga entre policiais envolvidos, e um deles acaba vazando para prejudicar o colega. O secretário concordou e acho importante regulamentar este procedimento, o que é algo relativamente simples e de fundamental importância", disse Freixo.

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