Por felipe.martins

Rio - O decreto de calamidade pública, assinado na sexta-feira pelo governador em exercício Francisco Dornelles, está longe de resolver o problema das contas do estado. A medida possibilita a liberação de R$ 3 bilhões da União para o Rio, mas o montante não cobre o rombo estimado em R$ 19 bilhões nas contas para este ano. Na Saúde, a injeção de R$400 milhões vai garantir o funcionamento dos hospitais e UPAs por apenas dois meses.

Segundo o secretário da pasta, Luiz Antônio Teixeira Junior, o montante é o valor mínimo necessário para esse período. “Nossa crise é tão grave que, sem esse recurso, há risco das unidades de saúde fecharem”, alerta.

A injeção de R%24 400 milhões%2C oriundos da União%2C vai garantir o funcionamento dos hospitais estaduais e UPAs por apenas dois mesesBanco de imagens

Para justificar o decreto, Dornelles citou a crise do Rio, agravada pela “queda da arrecadação do ICMS e dos royalties do petróleo” e a possibilidade de colapso na Segurança Pública, na Saúde, na Educação, na mobilidade e na gestão ambiental.

Dos R$ 3 bilhões, R$ 500 milhões serão destinados à conclusão das obras da Linha 4 do Metrô, obra necessária para a locomoção durante a Olimpíada, em agosto. A medida se alinha à tentativa de melhorar a mobilidade urbana. Outra parte seria destinada ao pagamento de servidores.

No entanto, para a área de gestão ambiental, não há tempo hábil para solucionar os problemas. É o que adverte o biólogo Mario Moscatelli, coordenador do projeto Olho Vivo, que monitora a situação da Baía de Guanabara — que vai sediar as provas de vela dos Jogos.

“O meio ambiente está em estado de calamidade há dez anos. Não haverá tempo para melhoria. O sistema lagunar de Jacarepaguá, onde ficam a Vila Olímpica e o Parque Olímpico, é um ‘penico’. O que faremos para as Olimpíadas é retirar resíduos, medida emergencial”, afirma.

Para o especialista em contas públicas e economista Raul Veloso, o decreto veio tarde, mas ainda a tempo de evitar tragédia na Olimpíada, lembrando que o Rio será a vitrine do país para o mundo.

Veloso acredita que a medida abre caminho para o estado cobrir o rombo deste ano de R$ 19 bilhões. “Serão destinados R$ 3 bilhões agora. Se o estado conseguir suspender o pagamento da dívida com a União (este ano em R$ 7 bilhões), e a abertura de crédito do BNDES, em cerca de R$ 9 bilhões, ajuda a cobrir o déficit”, diz. “A União deve autorizar esses recursos por Media Provisória”. 

5 MINUTOS COM: LUIZ ANTÔNIO TEIXEIRA JUNIOR, Secretário de Saúde

Secretário de Saúde, Luiz Antônio Teixeira Junior pede repasse de R%24 400 milhões para a pastaDivulgação / Governo do Estado

Desde que assumiu a Saúde, em janeiro deste ano, Luiz Antônio Teixeira Junior renegociou contratos das Organizações Sociais e reduziu custos. No entanto, as ações ainda são paliativas, tendo em vista a dificuldade do estado em honrar contratos, pagar salários de servidores, além de comprar medicamentos.

1. O decreto veio em boa hora para a Secretaria de Saúde? Havia risco de as unidades pararem?

— O decreto dá condições para que o estado receba recursos e, com isso, para que a Saúde não feche nenhuma unidade. A crise do Rio é tão grave que há risco de as unidades pararem. A medida garante que funcionem e até melhorem seus serviços.

2. Qual é o recurso mínimo que deve ser injetado na Saúde para garantir o funcionamento dos hospitais?
— Precisamos de pelo menos R$ 400 milhões. Esse valor seria para manter o funcionamento das unidades de Saúde com emergência e as UPAs por dois meses, pagar funcionários e comprar medicamentos.

3. A reavaliação de contratos com OSs não foi capaz de aliviar as contas ?

— Nossas UPAs são administradas por OSs e eu estou, desde a minha entrada na pasta, renegociando e reduzindo os valores dos contratos. Mesmo assim, não conseguimos a regularidade no pagamento, especificamente de unidades de emergências. Estamos, hoje, sem credibilidade para comprar materiais e medicamentos para entregar na Riofarmes ( farmácia estadual).

4. Essa verba de R$ 400 milhões não será destinada para pagar dívidas da secretaria?

— Não e não há expectativa disso ocorrer agora.


Governo deve implementar medidas com urgência para o sucesso dos Jogos

Apesar do decreto de calamidade pública garantir um “socorro financeiro” sem verificação do Legislativo e permitir que haja contratação sem licitação, em nada vai adiantar a verba da União se não houver reformulação no modo de gestão do estado. É o que afirma o presidente do Tribunal de Contas do Estado (TCE), Jonas Lopes.


Para Lopes, é necessário um choque de gestão no Rio e que as chamadas “medidas duras”, prometidas pelo governador em exercício sejam cumpridas. “A situação do Rio é de calamidade mesmo. O estado precisa rever a gestão. Espero que o governador tome as chamadas medidas duras que prometeu. É necessária uma redução drástica de despesas de investimento, revisão de contratos e de programas sociais. Só com o Bilhete Único são R$13 milhões por semana. É uma política de grande alcance social, mas, nesse momento, deve ser revista”, afirmou Lopes.


Já o ex-governador Moreira Franco, que hoje é secretário-executivo do Programa de Parcerias de Investimentos da Presidência, aponta a crise do governo Dilma como a “raiz da situação financeira do governo do estado” e a queda no preço do petróleo baixou as receitas com royalties. “Diante da ameaça que a crise financeira provoca à realização dos Jogos, o presidente Temer vai cumprir a sua parte, mas é necessário que o governador Dornelles também cumpra a sua, o que ele disse que fará”.

Sérgio Cabral joga culpa da crise na lei do pré-sal

O ex- governador Sérgio Cabral (PMDB) também se pronunciou ontem sobre a medida tomada por Dornelles. Em nota, Cabral disse que a crise financeira do estado acontece por causa da lei do pré-sal aprovada em 2010 pelo governo federal. Segundo ele, a atual situação do estado foi provocada pela redistribuição dos royalties do petróleo que passou para a União, deixando de privilegiar os estados produtores.

Cabral tentou impedir edição da lei, que, segundo ele, causou a criseSeverino Silva / Agência O Dia


“O ex-governador considera que a grave crise que se abateu sobre o Brasil tem origem na equivocada lei do pré-sal. A mesma lei que, quando governador, combateu, em protestos que liderou nas ruas do Rio com a participação de milhares de pessoas”, diz a nota. 

O presidente da Alerj, deputado Jorge Picciani (PMDB), afirmou ontem que a decretação de calamidade pública nas finanças do estado facilitará a ajuda federal ao Rio.

Picciani disse, conforme a agência Estadão Conteúdo, que o governo destinará recursos para pagar servidores e para as áreas de Segurança, Saúde e Educação. Ele negou, no entanto, que a “racionalização de todos os serviços públicos essenciais”, mencionada no decreto, signifique redução dos gastos com saúde e educação para priorizar a Olimpíada.


O deputado afirmou que as “medidas duras” citadas anteontem por Dornelles se referem ao corte de 30% dos gastos do estado e extinção de cinco secretarias, anunciados pelo governo há 10 dias. Entre as medidas, estão a demissão de servidores contratados sem concurso, a revisão de contatos e a reavaliação dos programas sociais, com suspensão temporária do Renda Melhor, de superação da pobreza.

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