Por gabriela.mattos

Rio - A medida provisória (MP) que reformula o Ensino Médio brasileiro foi publicada na edição extra do Diário Oficial da União na tarde de ontem e mantém os trechos polêmicos que retiram a obrigatoriedade das disciplinas de Artes e Educação Física, apesar dos protestos de educadores. O Ministério da Educação (MEC) garantiu, no entanto, que as matérias seguirão na grade curricular pelo menos até a definição da Base Nacional Curricular Comum (BNCC), prevista para ser concluída em meados do ano que vem. No Estado do Rio, no entanto, o secretário de Educação, Wagner Victer, afirma que as disciplinas continuarão obrigatórias independentemente da BNCC.

“A prerrogativa do estado é muito clara. Com a ampliação da carga horária, não há razão para eliminar as matérias clássicas como Educação Física, Sociologia e Filosofia. Elas ajudam a diminuir a evasão escolar”, afirmou Victer.

Alunos do Colégio Estadual Pedro Álvares Cabral%2C em Copacabana%2C praticam vôlei sentado%2C uma das modalidades paralímpicas%2C em aula de Educação FísicaDivulgação

Os profissionais das disciplinas “excluídas” criticaram bastante as medidas. O Conselho Federal de Educação Física (Confef) publicou uma nota de repúdio à proposta de reforma, afirmando ser um “contrassenso” em relação ao aumento da obesidade e do sedentarismo infanto-juvenil. Professor do Colégio Pedro II e da UERJ, Marco Santoro, de 53 anos, 30 deles ensinando Educação Física, disse que a insatisfação com o anúncio é consenso entre os profissionais. Ele critica a MP “cartesiana”, que daria menos oportunidades aos alunos. “Eu e muitos colegas estamos decepcionados. Essa é uma proposta política conservadora”, opinou.

O secretário Victer declarou que o verdadeiro desafio para aplicação da MP será a obtenção de recursos para implementar o ensino integral, com carga horária de sete horas por dia. A proposta de reforma institui que a meta é ter, até 2018, 500 mil novos alunos em jornada de 7 horas dentro da escola. O presidente Michel Temer anunciou que vai investir R$ 1,7 bilhão na pasta para aumento da carga horária. “É muito pouco”, disse o secretário. “Para se ter uma ideia, só em salários de professores gastamos cerca de R$ 3,6 bilhões aqui no Estado do Rio”.

O especialista em educação Elionaldo Julião, professor da UFF e integrante do Núcleo de Estudos e Documentação em Educação de Jovens e Adultos, questiona a aplicação prática da proposta de aumento da carga horária. “Minha questão é: o que estamos oferecendo nesse segundo turno? São ações muito pontuais de oficinas, que sequer são bem avaliadas pelos alunos. Acaba não enfrentando problemas estruturais e de valorização dos profissionais de educação”, explicou.

O diretor pedagógico do Colégio Qi, Paulo Emílio, alerta que a medida afetaria também as escolas particulares e os bolsos dos pais. “Vai aumentar o custo para as escolas particulares. Evidentemente, as escolas não têm como arcar com o aumento de custos, que é expressivo. Esses custos terão que ser repassados para os alunos e seus pais”, disse. A MP de reforma do Ensino Médio terá de ser apreciada em 120 dias pelo Congresso Nacional.

Especialistas criticam a falta de clareza na medida

A dificuldade de aplicação da reforma no Ensino Médio e a falta de clareza nas alterações a serem feitas na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) são consenso entre os especialistas em educação.

O pró-reitor de Ensino, Pesquisa e Pós-Graduação da Fundação Getúlio Vargas, Antônio Freitas, questionou o custo e a aplicação prática do ensino integral. Porém, ele elogiou a flexibilização do currículo e ênfase em áreas de interesse do aluno, prática já aplicada em países como os Estados Unidos, França, Finlândia e Suécia.

“As propostas são positivas pois dão mais liberdade aos alunos, mas nada vai ser resolvido rapidamente, pois a BNCC não foi definida”, explicou o pró-reitor.

O professor da Universidade Federal Fluminense e integrante do Núcleo de Estudos e Documentação em Educação de Jovens e Adultos Elionaldo Julião discorda e classifica a flexibilização de “utilitarista”. Ele destaca que forçar uma escolha de área de interesse a jovens de 15 anos, elimina possibilidades futuras. “Há um elevado número de pessoas que não se identificam com o curso que escolheram. Em um currículo flexível, temos que oferecer várias áreas, para que o jovem faça opções.”

Ambos criticaram a forma de proposta da reforma, em MP, sem discussão prévia com a sociedade. O Ministério Público Federal considerou a ação “pouco democrática”. “Se desconsidera a forma que foi pensado o currículo atual. Precisamos pensar no Ensino Médio. O que não podemos é fazer isso em MP”, disse Elionaldo.

Pontos polêmicos

?Obrigatórias

O governo torna obrigatório para os três anos do Ensino Médio apenas português e matemática. Os demais conteúdos serão definidos pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Assim, se exclui a obrigatoriedade do ensino de Arte, Filosofia, Sociologia e Educação Física.

Notório saber

As aulas do Ensino Técnico e Profissional poderão ser ministradas por profissionais com notório saber - ou seja, sem formação acadêmica específica na área que leciona -, reconhecido pelos respectivos sistemas de ensino para ministrar conteúdos afins à sua formação. Disciplinas como matemática e português, no entanto, continuarão sendo ministradas por professores formados nessas áreas.

Flexibilização

Cerca de 1,2 mil horas, metade do tempo total do Ensino Médio, serão destinadas ao conteúdo obrigatório definido pela BNCC. No restante da formação, os alunos poderão escolher seguir cinco trajetórias: linguagens, matemática, ciências da natureza, ciências humanas – modelo usado também na divisão das provas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) – e formação técnica e profissional.

Tempo integral

O Ministério da Educação investirá R$ 1,5 bilhão para ofertar o ensino integral a 500 mil jovens até 2018. A partir do ano que vem, será fomentado que os estudantes passem 7h por dia na escola como forma de combater a evasão. “O tempo integral retira os jovens da vulnerabilidade nas grandes e médias cidades do Brasil e garante uma educação de qualidade”, diz o ministro da Educação Mendonça Filho.

Língua estrangeira

A única língua estrangeira de ensino obrigatório será o inglês. No entanto, a disciplina não necessariamente estará presente nos três anos do Ensino Médio. O ensino de um segundo idioma passa a ser optativo, com o espanhol como preferência no currículo.

Reportagem da estagiária Alessandra Monnerat, com informações do Estadão Conteúdo

Você pode gostar