Por bianca.lobianco
Rio - O destino é a Zona Oeste do Rio, Complexo Penitenciário de Gericinó, o maior presídio do estado. A rotina de quem visita familiares acautelados lá começa cedo. Alguns chegam com dois dias de antecedência para não perder a viagem. Apesar de a visita começar somente às 9h, desde as 3h a fila já está formada. As mulheres são maioria — mães e esposas. E, para atender as cerca de 2.200 que passam pela visita, por dia, um comércio muito curioso se formou em frente à entrada do presídio. Pode acreditar, tem de tudo!
As visitas são diárias%2C das 9h às 16h%2C exceto sexta-feira. Cada pessoa entra%2C no máximo%2C com três sacolasSeverino Silva / Agência O Dia

Lá, o ‘horário comercial’ vai das 3h às 17h. Ou seja, fechou o portão, acabou o expediente. Às sextas-feiras não tem visita e também não tem comércio. Mas quando está de portas abertas, o ‘mercadão’ não deixa ninguém na mão. Tem de sacola plástica do Supermercado Guanabara — “É a mais resistente”, as clientes garantem, pagando R$ 0,40 por unidade — a aluguel de tomada para carregar celular e ligar a chapinha de alisar o cabelo e até lingerie para as visitas íntimas.

Para chegar cedo na fila%2C muitos preferem pernoitar perto do presídioSeverino Silva / Agência O Dia

Tudo o que é vendido no lugar obedece às regras para visitação. A ‘sucata’, como é grosseiramente chamada a comida que o visitante leva para o familiar detido, só entra em embalagens plásticas transparentes, vendidas a preços variados conforme o tamanho. Itens de higiene pessoal como condicionador e creme dental são despejados em sacos plásticos também. Desodorante roll-on só entra sem tampa e sem adesivos para evitar que se escondam chips de celular. Maços de cigarro não entram; fumo, só solto, em sacolas plásticas de tamanho adequado.

LARANJAS POR DIA
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Não só o que levam, mas o que vestem também passa por inspeção. As cores vermelha, preta e azul não são permitidas. Blusas de alça ou com decotes não entram e saias, só abaixo do joelho. Para essas regras a Pensão da Loira há cinco anos tem solução. “Comecei alugando roupas, mas tive prejuízo. Algumas não retornavam, agora vendo. Tem peças de R$ 10 a R$ 50”. Ela também oferece espaço para o preparo das ‘sucatas’ e vende descartáveis, aluga o banheiro com e sem banho, oferece guarda-volume e ressalta: “Aqui o espelho é de graça”.
Mulheres se reúnem em locais reservados para preparar a ‘sucata’ Severino Silva / Agência O Dia

Pois é, o espelho é item concorrido. Em alguns lugares custa R$ 1 para ‘usar’. Apesar de passarem em locais onde o mau cheiro e a sujeira imperam, as mulheres não deixam de retocar a maquiagem e ajeitar os cabelos. “Não é mais todo dia que vejo meu filho, quero que ele me veja bonita”, conta uma mãe que não se identificou.

Na loja da Aparecida, o carro-forte são as frutas. Uva e limão, ela não vende. “Não pode, nem cascas de outras frutas. Os presos fermentam e fazem cachaça. Laranja é o que mais sai. R$ 2,50 a sacola com quatro, descascadas”, explica. Quem cumpre a missão de preparar as embalagens é o Seu Geraldo Barbosa, 72 anos. Ele descasca 720 laranjas por dia. “Antes desses muros aí eu vendia biscoito e frutas lá dentro. Depois abri uma loja aqui fora, mas fui roubado, acredita?”.

Quem vem de longe não dorme mais na rua como antes. Há pensões, desde as mais simples, com banho quente às mais completas, com wi-fi, ar-condicionado e café da manhã.